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Composições do Diagrama enquanto Dispositivo de Catequização

1. A CONSTRUÇÃO DE UMA TESE

2.2 Composições do Diagrama enquanto Dispositivo de Catequização

Neste instante, o objeto catequização começa a tomar forma e sofre uma bifurcação, pois não estamos tratando de tomar a catequização como sinônimos de catequese, no sentido de dogmatizar os sujeitos. Estamos nos referindo às práticas que estão dentro de um projeto de sociedade, de práticas que governam vidas, então, estamos fazendo referência às práticas e saberes que operam como regimes de verdade, que constituem tecnologias que forjam sujeitos, que produzem modalidades de vida, ou seja, uma forma de gestão da vida.

Cabe ressaltar que a estratégia que se configura como direito social adscrito como Política Pública julga que há uma aposta nas Políticas Sociais como tática para a diminuição das iniquidades sociais, ponderando-se as fragilidades que apresentam, por meio de um conjunto estratégico de governamentalidade. A diminuição dos investimentos, por meio da Emenda Constitucional nº 95/2016, significa não apenas um efeito em termos dos modos como aspolíticas passarão a operar, mas um recrudescimento daquilo mesmo que torna essas políticas necessárias: as desigualdades sociais como estratégia de acesso aos direitos sociais.

Nesse sentido, a aprovação da Emenda Constitucional com argumentação de um pensamento de salvaguardar os direitos do futuro, recusa a proteção dos direitos do presente. E não estamos falando de qualquer direito: é efetivamente o direito de quem é demarcado na política como “os invisíveis”, daqueles que certamente são ressonância dessa lógica de suspensão de certos direitos, para proteção de outros, mas que novamente entram em um

círculo vicioso de práticas fascistas do discurso do racismo de Estado, em prol de uma vida em detrimento de outra.

Nessa mesma esteira, temos uma relação entre o direito e Estado que, na verdade, em princípio o direito aparece como aquilo que qualifica a vida, mas não de forma homogênea, de modo que ao qualificar uma determinada vida, acaba por desqualificar algumas outras vidas. É neste sentido que vemos que o sujeito é um corpo gerido como objeto de poder. Nessa relação de Estado e direito, o direito emerge sob a forma da lei, por meio de normativas, diretrizes, Políticas Públicas, que vão permitir uma seletividade no que concerne capturar certas vidas e deixar a margens outras. Contudo, podemos considerar que certamente não estava em jogo na PEC do fim do mundo o direito de todos, mas de alguns, estes não são os sujeitos centrais de políticas de direitos sociais.

As articulações entre as urgências cotidianas nos mostram que novas estratégias de governo da população estão em jogo, e essas táticas nos permitem ver a emersão de um dispositivo de catequização que tem como principal função demarcar um novo regime de verdade como forma de condução da conduta da população, no que concerne aos modos de vida de populações vulneráveis.

Não se parte, assim, de que o dispositivo de catequização opera dentro de uma lógica assistencialista, filantrópica e religiosa, e tampouco podemos dizer que opera dentro da garantia de direitos que prezam as políticas. O que se quer entender, em termos de uma analítica do poder que inicia o percurso seguindo rastros de um diagrama, são os deslizamentos de certas formas como o assistencialismo, filantropia e religião, estabelecem um outro jogo, na medida em que novos elementos passam a se avizinhar. Essa interrogação se apoia na análise de Foucault no livro História da Sexualidade I tanto da confissão quanto da hipótese repressiva, mostrando que apesar de ambas se fazerem presentes no dispositivo da sexualidade, há uma outra composição, outras figuras, ou seja, um outro diagrama que permitirá a conformação de certas tecnologias e estratégias de poder-verdade.

O diagrama é uma distribuição de forças, está estrategizado e é virtual e sobre este aparecem os estratos que são jogos de verdade. Então, quando se considera que o cotidiano é um diagrama, uma massa de práticas possíveis, constitui-se um direcionamento para poder percorrer aquilo que historicamente se constitui como dispositivos que aproveitam e atuam sobre esse diagrama, para criar determinados eixos de ações e pensamentos, neste caso específico, a catequização. E isso distingue o dispositivo de catequização do elemento

catequese que nos é muito familiar na história do Brasil, que se sustenta pelas ideias de conversão, de crer em Deus buscando uma mudança de alma.

As dimensões do dispositivo operam sobre esse magma que denominamos de cotidiano, dando forma ao diagrama. Ou seja, aproximam formas e forças. Sobre esse cotidiano, sobre esse diagrama, o que buscamos analisar é como se criam dispositivos, neste caso específico, o dispositivo de catequização, e para isso buscamos situar nosso diagnóstico e análise.

Estamos no Brasil, onde temos uma série de Políticas Públicas que tem como proposta desenvolver diversas ações e programas, e diante do modo como certas práticas cotidianas vem aquiescendo um plano de consistência, provoca-nos a pensar: como se torna possível que entidades religiosas exerçam atividades vinculadas às Políticas Públicas? Quais os efeitos dessa inserção no que concerne ao governo da vida? Gestões governamentais provavelmente nos responderiam que é uma forma de utilizar os recursos públicos. Mas ao que parece é um pouco mais profundo que isso! É mais profundo, porque é um elemento de um dispositivo de catequização que o mantém. Entendemos, então, que as políticas públicas são dispositivos que organizam de um determinado modo o cotidiano.

De fato, percorremos aqui um caminho que nos possibilitou ver como o cotidiano enquanto um conjunto de forças, isto é, como um diagrama ganha espessura, estratifica-se produzindo um certo plano de consistência, regimes de verdade e dispositivos. E quando trazemos e discutimos as materialidades que permitem amalgamar elementos que nos evidencie que há emergência de um dispositivo, necessitamos nos questionar: Como se constitui o dispositivo de catequização? A que urgência ele busca responder? Sabemos que ele atua sobre o diagrama, sobre essas forças, seleciona algumas, as organiza, as atualiza e nos leva a criar um eixo de condução de conduta.

É nesse sentido que somos interpelados por uma questão de pesquisa: A partir de um cotidiano virtual capaz de fazer emergir dispositivos, como se torna possível forjar o dispositivo da catequização proveniente de práticas da Política de Assistência Social e políticas de gestão?

3. INDÍCIOS DE URGÊNCIA – CATEQUESE E CATEQUIZAÇÃO