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CAPÍTULO II – UMA ABORDAGEM COMUNICATIVA AO ENSINO DA LÍNGUA

2.1. Conceitos e competências num modelo comunicativo de ensino/ aprendizagem

2.1.1. A Comunicação

Enquanto ser social, o ser humano vê no ato de comunicar (do latim

communicatione, que significa “ação comum”) a possibilidade de se afirmar, de

expressar os seus pensamentos e de celebrar intencionalmente uma relação com o Outro e com o Mundo.

Assim, a comunicação pode ser definida como situações de contacto, “em que é possível estabelecer-se uma relação entre pessoas, de tal modo que as iniciativas intencionais de uma pessoa possam chegar ao conhecimento das outras” (Trindade,

Se é dizendo a palavra com que, “pronunciando” o mundo, os homens o transformam, o diálogo se impõe como caminho pelo qual os homens ganham significação enquanto homens. Por isto, o diálogo é uma exigência existencial. (Freire, P., 1987, pp. 78 -79)

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1990, p. 33). Mais do que isto, Sim-Sim (1998, p. 21) entende a comunicação como um “processo activo de troca de informação que envolve a codificação (…), a transmissão e a descodificação (…) de uma mensagem entre dois, ou mais, intervenientes”. Em ambas as definições é incontornável entendermos, então, que a Comunicação é, sem dúvida, uma necessidade básica do ser humano para a estruturação da vida em sociedade.

Por conseguinte, dada a sua natureza social, podemos afirmar que o ser humano é um comunicador nato, que domina variadas formas de comunicação verbal (oral e escrita) e não-verbal, através de suportes tanto linguísticos, como “extralinguísticos” (como os gestos e as expressões corporais) e “paralinguísticos” (entoação de voz, hesitações, velocidade da comunicação, entre outros).

Importa referir que ao processo comunicativo se encontra implícito um “sistema linguístico” que compreende um código específico de símbolos, a que chamamos linguagem, que irá sofrer nuances e adquirir características próprias de cada língua e “comunidade linguística” (Sim-Sim, 1998, pp. 22-23).

Deste modo, a linguagem, enquanto herança genética e código cultural, apresenta-se como representação simbólica da própria Língua, sendo fator determinante a qualquer processo comunicativo e de estruturação social, tal como declara Sim-Sim (1998, p. 23) quando afirma que a linguagem é tão preponderante ao “contexto humano que é impossível conceber a vida sem ela. É de tal modo poderosa que a partilha de um sistema linguístico nos agrega no mesmo clube de falantes (…) e facilita-nos as aprendizagens individuais e socias”.

O mesmo é dizer que, pela linguagem (verbal e não verbal), o ser humano se afirma e expressa os seus ideais e pensamentos, à medida que se posiciona e integra um corpo social, no qual a Língua é propriedade da Comunidade. Assim resulta a simbiose de “a língua de uma pessoa [ser] a sua identidade, e a identidade de uma pessoa [ser] a sua língua” (Mey, 1998, p. 82).

Ao processo de comunicação verbal, entendido por Sim-Sim (1998, p. 22) como o mais “elaborado” e com “o sistema linguístico (…) mais complexo dos códigos”, estão subentendidos elementos fundamentais, como o emissor/ locutor (aquele que emite e codifica uma mensagem), o contexto/ referente (conjetura relacionada com o emissor e recetor), o canal de comunicação (o meio pelo qual circula a mensagem), a mensagem (o conteúdo transmitido), o código (o conjunto de signos usado na transmissão e receção da mensagem) e o recetor/ interlocutor (aquele que recebe e

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descodifica a mensagem), que se encontram em estreita articulação, como se pretende elucidar com o esquema seguinte (Fig. 1).

Atendendo, pois, ao esquema da Fig. 1, compreendemos que a comunicação é um processo dialógico e de interação sociocultural entre, pelo menos, dois sujeitos, no qual coexistem diferentes variáveis num dado contexto espácio-temporal, não tendo princípio ou fim delineados, na medida em que as relações estabelecidas no ato comunicativo são indetermináveis e influenciadas pela evolução da interação entre o emissor e o recetor.

Desta forma, emergem do processo de comunicação duas componentes essenciais: a compreensão e a produção. A primeira diz respeito à capacidade que o locutor e o interlocutor têm de codificar/ decifrar a mensagem, algo que “não ocorre se falante e ouvinte não dominarem o mesmo sistema linguístico” (Sim-Sim, 1998, p. 24). A segunda envolve a capacidade de se estruturar correta e eficazmente uma mensagem, considerando a “articulação de cadeias fónicas, na linguagem oral”, a “sequência de gestos na língua gestual” e a “sequencialização de sinais gráficos, no caso da escrita” (idem).

Todavia, a este sistema estão, por vezes, subjacentes “ruídos” que impedem que a comunicação verbal se desenvolva de forma coesa e coerente. Segundo Sousa (2006, p. 37), estes impedimentos podem ser físicos (a presença de obstáculos entre os interlocutores); culturais (as possíveis dificuldades na compreensão da língua); pessoais (as peculiaridades subjacentes à maneira de ser, estar e pensar do indivíduo); e

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psicossociais (os papéis sociais desempenhados pelos sujeitos condicionam o ato comunicacional).

A isto Sousa (2006) acresce a existência de diversas formas de comunicação humana, a saber: a intrapessoal (relacionada com momentos de introspeção), a interpessoal (associada a relações pessoais e à interação entre duas pessoas, sob a informalidade de um pequeno grupo de indivíduos), a grupal (estabelecida em “grupos formais de média ou grande dimensão”), a organizacional (criada em organizações ou empresas), a social (relacionada com a comunicação em grandes grupos de cariz heterogéneo, também designada por “comunicação em massa”) e a extrapessoal (ligada à comunicação com animais, máquinas ou com entidades sem prova tangível de existência).

Sousa (2006, p. 35) afirma, ainda, que a comunicação pode ser concretizada de forma “mediada”, quando depende de meios e “dispositivos técnicos” (como por exemplo, os media) ou de forma “direta”, quando ocorre uma conversação imediata, na qual os indivíduos se encontram frente a frente.

Atendendo ao que já foi mencionado, será lícito afirmarmos que a linguagem verbal assume um papel preponderante na comunicação humana e nas relações interpessoais, o que, em nosso entender, encontra eco na afirmação de Lopes: “O que somos, nossas identidades sociais, portanto, são construídas através de nossas práticas discursivas com o outro” (1998, p. 306).

Assim, nesta linha de pensamento, podemos afirmar que a comunicação permite a reciprocação entre os sujeitos falantes e a sua afirmação pessoal e coletiva perante o mundo, numa lógica democrática e dialógica, tendo a língua (e o sistema linguístico/ linguagem, por inerência) como recurso fundamental à convivência social.

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