• Nenhum resultado encontrado

3. CONTEXTUALIZAÇÃO DO CENÁRIO DA GRAVAÇÃO: ESCOLHA DA

3.1 Comunidade de prática

De acordo com Wenger (1998:73), comunidade de prática constitui grupo de pessoas comprometidas mutuamente com objetivo comum em empreendimento que apresenta diferentes práticas sociodiscursivas, partilhando-se experiências de forma harmoniosa ou conflituosa. Pode-se exemplificar tal conceito com um grupo de alunos. Eles estão inseridos em uma mesma instituição de ensino com o propósito comum de aprender algo. Não obstante os objetivos em comum, cada aluno integra realidade sociocultural própria, expressa nas práticas discursivas em sala de aula. Além da comunidade de prática desse grupo, cada aluno se insere em outras comunidades de prática: um aluno pode participar do grupo de jovens de determinada igreja, do grupo de amigos que se encontra nos fins de semana, entre outros.

Característica relevante das comunidades de prática é que constituem “um empreendimento muito específico, compartilhado e negociado” (MEYERHOFF, 1994, p.530). No exemplo do grupo de alunos, cada aluno se compromete a aprender por uma razão específica (necessidade ou lazer) e interage socialmente na sala de aula conforme as normas da instituição de ensino.

Segundo Rampton (2006:115-6), na comunidade de prática há uma análise em close da interação face a face em vários contextos e relações sociais muito bem estabelecidos, tais como as que ocorrem em oficinas de trabalho, em salas de aula e em grupos profissionais distintos. Na sala de aula, existe uma configuração específica, em que há determinada quantidade de alunos e a presença de um professor. O tempo é estabelecido pela instituição de ensino e o espaço é utilizado conforme determinadas normas. A negociação para mudanças depende do consentimento da instituição.

As relações sociais em sala de aula também são estabelecidas, como a função do professor e as atitudes do corpo docente e discente conforme o padrão social de ensino de

uma instituição. Há, entretanto, negociação entre professor e aluno quanto à incompreensão do conteúdo, como também pode ocorrer negociação quanto às normas da instituição.

No que diz respeito ao papel do professor dentro da comunidade de prática, dependendo do consentimento da instituição e da percepção e ação do professor, pode haver mudança na configuração da sala de aula e nas relações sociais que ocorrem nesse contexto. Compete ao professor tornar-se mediador de conhecimentos, resolvendo problemas a partir da discussão com os alunos e da percepção da comunicação não verbal que eles podem sinalizar. Isso é observado na vinheta em que a professora pergunta o que quer dizer o enunciado

Joãozinho, agora você vai ficar sentadinho aí e negocia o sentido com a participante Viviane:

1. L: É: NÚmero (.) dez JoãoZINho (.) agora você vai ficar SENtadinho aí

2. ...

3. V: ma:s acá::

4. ...

5. V: pode ser também (.) ênfase( ) é=Joãozinho

6. L: [JoãoZInho

7. V: você va a ficar senTADI:nho ((levantando o braço, movimentando rapidamente, para cima e para

baixo com a mão espalmada))

8. ...

9. L: [Ok (.) Ok=ah:pode enfatizar=ok

3.1.1 Comunidade de prática pesquisada

A seleção da comunidade de prática, a ser pesquisada, foi feita em razão da pesquisadora dela fazer parte. Assim, escolheu-se curso de extensão da Universidade de Brasília, em que se exerce a função de professora, já que a pesquisa realizada é uma pesquisa- ação, que depende da atuação da pesquisadora no contexto da pesquisa.

A instituição selecionada foi criada na década de sessenta. O curso de extensão focalizado existe há menos tempo – duas décadas – e funciona com número reduzido de alunos por tratar-se de curso de português para estrangeiros. Seu nome é PEPPFOL, conforme mencionado à página 42. Os cursos são separados em níveis: iniciante, intermediário e avançado, existindo, também, cursos específicos para alunos falantes do espanhol: iniciante hispano, intermediário hispano e avançado I e II, para línguas estrangeiras diversas. Os níveis são divididos em dois: iniciante I e iniciante II, intermediário I e intermediário II, e avançado I e avançado II, com exceção do iniciante hispano e do intermediário hispano. Esses últimos

níveis equivalem a dois níveis cada um, visto que os alunos falantes de espanhol estudam o conteúdo de dois níveis em um pela facilidade de aquisição da língua-alvo, devido à proximidade da língua de origem com o português.

O curso de extensão referido localiza-se em prédio situado dentro da Universidade de Brasília, na parte térrea. As aulas se realizam em dois períodos, matutino e vespertino, de segunda à sexta-feira, com duração de uma hora e quarenta minutos. As aulas ocorrem três vezes por semana para cada nível, e o período é bimestral. Ressalte-se, entretanto, que existe flexibilidade dos professores quanto a faltas dos alunos e eventuais atrasos, já que a maioria deles integra o corpo diplomático de Brasília.

Outras características relacionadas ao curso de extensão sob análise é a imersão de estudantes africanos que recebem concessão de recursos para estudos no Brasil, e a ocorrência de cursos de verão e de inverno, que se realizam durante duas semanas intensivas, ou seja, o nível é cumprido em duas semanas, em aulas duplas, ministradas em mesmo turno, pela manhã ou à tarde.

O nível escolhido para a pesquisa foi o avançado I, visto que, dos três alunos pesquisados, dois deles já estudaram nos níveis anteriores. A outra aluna entrou no PEPPFOL diretamente no nível avançado I.

O grupo é constituído de três alunos estrangeiros, falantes de espanhol, de países diferentes. Os alunos possuem um mesmo objetivo em comum, mas, individualmente, apresentam comportamentos que os identificam de forma distinta. Além disso, possuem, dentro do objetivo do aprendizado, circunstâncias diferenciadas: aprendizado para a missão militar, para o aprimoramento de estudos acadêmicos no país de imersão, como também para a adaptação ao processo de imersão no país da língua-alvo.