• Nenhum resultado encontrado

VI. JUSTIFICATIVA

1.4. COMUNIDADES VIRTUAIS

Uma comunidade virtual é construída sobre afinidades de interesses, de conhecimentos, sobre projetos mútuos, em um processo de cooperação ou de troca, tudo isso independentemente das proximidades geográficas e das filiações institucionais. (LÉVY, 1999, p. 127)

De acordo com Masetto (apud SERRÃO, 2002, p. 25), em uma discussão virtual o objetivo é fazer avançar “os conhecimentos, as informações ou as experiências, para além da somatória de opiniões, de tal forma que o produto deste trabalho seja qualitativamente superior às idéias originais”.

A rigor, esse é também o objetivo do trabalho em equipe, com interações face-a-face. Entretanto, os grupos de discussão demandam um tempo maior para serem produtivos e significativos pois constituem uma reflexão continuada, um debate fundamentado de idéias (SERRÃO, 2002, p. 25).

Por outro lado, a inexistência de limitação quanto ao número, localização geográfica, nacionalidade etc. dos participantes possibilita que, no “somatório das opiniões”, o resultado possa ser melhor.

Para Hiltz (apud GEROSA et al., 2001), “a contribuição de pessoas com diferentes entendimentos, pontos de vista alternativos e habilidades complementares pode gerar resultados que dificilmente seriam encontrados individualmente”. Os membros do grupo podem ajudar a identificar inconsistências no raciocínio dos indivíduos e buscar em conjunto idéias, informações e referências para auxiliar na resolução dos problemas. Geralmente, o grupo tem mais capacidade de gerar criativamente alternativas, levantar as vantagens e desvantagens de cada uma, selecionar as viáveis e tomar decisões melhores do que os indivíduos separadamente (GEROSA et al., 2001)

De acordo com Russel (apud WICKERT, 2003), “tão logo nossa espécie ganhou a capacidade de combinar as aprendizagens individuais, nosso desenvolvimento deslocou-se para a frente a uma taxa sem precedentes. Nunca, em toda história da evolução na terra, a mudança foi tão rápida”.

A percepção dentro de um ambiente envolve vários aspectos cognitivos relativos à habilidade humana. Enquanto a interação entre pessoas e ambiente dentro de uma situação face-a-face parece natural, uma vez que os sentidos da visão e da audição estão disponíveis, a situação fica menos clara quando há a tentativa de fornecer suporte à percepção em ambientes virtuais. “Estes ambientes tendem a esconder diversas informações que estariam disponíveis num encontro face-a-face”. (GEROSA et al., 2001)

As novas TIC estão transformando a forma como interagimos como indivíduos na sociedade. O uso da comunicação mediada por computador muda os princípios do processo de comunicação. As características físicas dos indivíduos envolvidos em uma interação não são mais um fator significante na interação e essa mudança proporciona oportunidades para que os indivíduos mudem sua forma de interagir. (WITHLEY, 1997)

De acordo com Lévy (1999, p. 128), longe de serem frias, as relações on-line não excluem as emoções fortes. A vida de uma comunidade virtual raramente transcorre sem conflitos. “Por outro lado, afinidades, alianças intelectuais, até mesmo amizades podem desenvolver-se nos grupos de discussão, exatamente como entre pessoas que se encontram regularmente para conversar”.

Macduff (apud PALLOF & PRATT, 2002, p. 51) afirma que “há um potencial maior para que o conflito ocorra na discussão virtual do que na discussão face-a-face, devido à ausência de sinais verbais, faciais e corporais, bem como à dificuldade de expressar a emoção em um meio textual”. Contudo, o autor vê nos meios eletrônicos um grande potencial para a

resolução de conflitos, especialmente quando normas e procedimentos forem estabelecidos e utilizados. (PALLOFF & PRATT, 2002, p. 51)

Temos nossas identidades porque não somos somente corpos. Nossas identidades são também construídas em nossos relacionamentos com os demais, pelo que os outros dizem a nosso respeito. Apesar de estarem falando sobre nossos atos do passado, elas estão abrindo ou fechando possibilidades para o nosso futuro. Para Flores (1997b), o ciberespaço será o lugar onde as relações se darão e as pessoas construirão sua identidade. Será nesse espaço que a confiança deverá ser criada e a sua manutenção dependerá da capacidade de cumprimento dos compromissos.

Uma questão interessante, que tem sido objeto de discussão, é sobre a identidade do ser humano, quando se está no ambiente virtual. Alguns argumentam que, sem o corpo, que identifica uma pessoa no “mundo real”, você pode representar qualquer papel, bastando, para tal, alterar as palavras e a forma como escreve (WHITLEY, 1997). Whitley, no entanto, defende que isso não se dá dessa forma, que existem outros aspectos que devem ser considerados.

Whitley (1997) defende que a escolha das palavras não é uma coisa que pode ser aprendida de uma maneira formal; ao contrário, a escolha das palavras é o resultado de um processo de socialização associado a uma identidade particular. Conseqüentemente, é muito difícil aprender uma nova identidade sem ser socializado naquele papel.

O papel do corpo é claramente importante na comunicação face-a-face e removê-lo da interação pode ajudar na mudança das bases de interação (WHITLEY, 1997). Mas o telefone e a correspondência não fizeram e fazem coisas semelhantes?

O telefone, como uma forma de comunicação semi-anônima, é considerado vantajoso em muitas instâncias. Por exemplo, julgamentos relativos à pessoa que ligou são completamente baseados no conteúdo da interação e não são influenciados pela aparência

física, formalismos ou vestimenta de quem ligou. De certa forma, o telefone pode ser visto como um nivelador ou, em algumas circunstâncias, como um disfarce. (WHITLEY, 1997)

Hubert Dreyfus (apud WHITLEY, 1997) argumentou, com base na filosofia de Heidegger, Polanyi e Wittgenstein, que o corpo representa um papel vital na cognição humana e que os humanos só eram capazes de ações inteligentes por causa de seus corpos.

A imagem que um indivíduo possui é, em muitos casos, influenciada por suas características físicas. Mas seria razoável assumir que a pessoa é mais do que apenas aparência física e outros sinais exteriores como som da voz e caligrafia. A percepção de quem seja uma pessoa não reside somente no que ela aparenta, mas também em termos do que ela fala, pensa e age. (WHITLEY, 1997)

Echeverría (2003) defende que os seres humanos são constituídos de corporalidade, emocionalidade e linguagem. Apesar de três componentes, eles estão tão inter-relacionados que sua separação só pode ser feita em nível didático.

Para Whitley (1997), não é possível criar e manter novas identidades simplesmente removendo da interação as “pistas” físicas. Sem uma socialização, o melhor que pode ser alcançado é imitação e imitação irá, ao longo do percurso, ser descoberta, particularmente por aqueles que foram socializados no papel que está sendo personificado.

No curto prazo, entretanto, tais limitações podem ser escondidas, particularmente se as interações forem limitadas ou ocorram durante um curto período de tempo.

Apesar da dificuldade, não é impossível, comunicar sentimentos on-line, especialmente a ira ou a irritabilidade. “Pelo fato de o participante pensar que é conhecido em outro contexto, acredita que todos entenderão a intenção que está por trás de suas palavras exatamente da mesma forma que ele próprio entende”. Isso explica porque os participantes são menos cautelosos sobre o que dizem, porque pensam que são conhecidos por todos. (PALLOFF & PRATT, 2002, p. 60)

Na comunicação eletrônica, a noção de contato virtual como algo contrário ao contato humano determina um dualismo artificial. Pelo fato de as pessoas comunicarem-se, a comunicação virtual, mesmo que sob a forma textual, não deixa de ser humana. (PALLOFF & PRATT, 2002, p. 61)