• Nenhum resultado encontrado

4. Apresentação e análise dos resultados

4.3. Conceções da professora especialista

Tendo em conta que a professora C. tirou Mestrado em Sociologia da Educação e está a fazer o Doutoramento em Educação Infantil e Género, a questão de género sempre esteve muito presente na sua prática pedagógica.

Em relação ao Bloco II sobre as conceções de estereótipos de género e de etnia a professora definiu estereótipo de género como “representações em torno do que é considerado feminino ou masculino, ligadas ao sexo, e que o Mundo está organizado a partir desses estereótipos, dessas representações”, dando como exemplo:

“A menina é delicada, é amorosa, as representações do cuidado que está ligado ao que é ser feminino. À força, à virilidade, à robustez ao que é ligado ao que é considerado masculino. E aí no nosso quotidiano é achar que as meninas têm de brincar de bonecas, os meninos com os carrinhos, é incentivar as meninas a tarefas manuais, a trabalhar com delicadeza e os meninos a movimentos amplos, a subir árvores.”

E definiu estereótipo de etnia como “representações que vão surgindo a partir dessa “suposta” inferioridade racial” e deu exemplos como:

“representações ligadas a, por exemplo, aos meninos que eles estão ligados mais à marginalidade, ao crime. Os meninos negros, neste caso. As meninas ligadas mais à sexualidade, mais para a frente, a tarefas, por exemplo, empregos de limpeza eles vão ser lixeiros, as meninas vão ver empregadas domésticas.”

Neste momento a professora é professora universitária, mas começou a sua carreira como educadora de infância por isso o seu testemunho, durante maior parte da entrevista, é sobre a época em que foi educadora de infância.

Em relação à pergunta sobre o que é que influenciava a planificação da professora, relativamente ao Bloco III sobre a planificação, a professora afirma que a

52 sua maior preocupação era as aprendizagens dos alunos, valorizando a brincadeira,

mas sempre tendo em conta a parte lúdica das atividades:

“E aí eu fazia assim, valorizava a brincadeira então tinha espaço no planejamento para as brincadeiras, mas eu fazia atividades também com brincadeiras que envolviam as letras, fazia bingo de letras, sempre a propósito de uma alfabetização mais lúdica. Sempre brincando, mas eu estava preocupada com isso e achava que naquele momento aquilo era importante”. Quando perguntei à professora se o género e a etnia influenciavam as suas planificações, a professora afirmou que o género influenciava pois já tinha terminado o Mestrado e por isso “já tinha um olhar atento para as questões de género” e deu-me como exemplo de estratégias:

“No Brasil é uma marca forte dessa dicotomia de género. É a fila. Todo o canto, todo o lugar e toda a escola você vai ver uma fila de meninos e uma fila de meninas, então isso já era uma coisa que eu na época já desconstruía. Primeiro porque nem sempre precisavam de fila, vamos para a sala podem ir de dois em dois, pode ir todo o mundo juntinho ali, pulando igual ao sapo, vamos dando passinhos de formiga, passinhos de elefante, todo o mundo junto. Não precisa sempre andar em fila, era uma coisa que eu desconstruía.”

e também “Nas brincadeiras também, quando as crianças estavam brincando eu tentava incentivar, levava bonecas para os meninos brincarem, então eu tentava fazer umas coisas assim. Nas brincadeiras mais agitadas incentivava as meninas, tinha esse olhar mais atento”, entre outros.

Sobre a organização do ambiente educativo, Bloco IV, quando perguntei à professora o que influenciava a organização do seu ambiente educativo semelhantemente aos outros docentes, respondeu:

“Na época como eu tinha uma outra conceção eu organizava assim: tinha um momento de brincadeira livre na sala e aí eu deixava umas coisas montadas já para as crianças, tinha mesinhas que eram usadas para atividades de escrita. Hoje já não teria essas mesinhas e hoje teria, por exemplo, um ambiente montado para que as crianças, sempre que tivessem na sala, tivessem brincando lá. Organizava também uns joguinhos, no cantinho, na sala, com panelinhas e essas coisas. Porque também não tinha muita coisa, tinha uma precaridade de brinquedos”.

Em suma, centrava-se no que, na altura, achava que era necessário para a aprendizagem das crianças acrescentando, “mas sempre com as questões de género por trás, na organização do dia”.

Em relação à questão da existência de elementos facilitadores de inclusão, considera que o contexto educativo é o maior facilitador. E considera, também, que os facilitadores podem também ser os limitadores “Dependendo da nossa intenção, porque as relações sociais, as relações estão ali. E se a gente não tem formação para intervir elas vão ser um limitador”.

53 Em relação à finalidade da sala de Jardim de Infância a resposta da professora

diz que “o quotidiano é um espaço brincante. Não tem de ter um canto só para brincar, todo o momento é um momento de brincar”.

Em relação à existência de áreas mais exploradas por um dos sexos a professora diz que tem muito a ver que afirma que em idades tão precoces não se observa muita diferença, mas a professora acrescenta que às vezes as próprias já trazem certos estereótipos de casa e acabam por procurar a reação do adulto que se encontra na sala para a aprovação de certas brincadeiras, dizendo que:

“tinha um menino que adorava pegar as bonecas de trapo e eu lembro-me que ele olhava para mim. Para ver a minha reação em relação à brincadeira dele e aí eu dava continuidade à brincadeira dele, mas se o adulto tiver um olhar só de reprovação já é o suficiente para ele saber, pelo menos, que não está a fazer uma coisa certa.”

O Bloco V é relacionado com as relações, então perguntei à professora se o género e a etnia influenciavam as relações entre crianças a professora confessou que como já não estava em contacto diário com crianças tinha um pouco de dificuldades a responder à questão, mas que afirmou que já tinha lido “de outros relatos uma criança pequena pode dizer também “O seu cabelo é ruim”, xingar uma pessoa pelo facto de ela ser negra”, mas que as crianças têm este tipo de atitudes porque “está reproduzindo o que o adulto fala”. A professora ainda acrescentou que “Muitas vezes a relação professora-crianças releva muito mais discriminação racial do que entre as próprias crianças”, facto que nenhum dos outros docentes referiu.

54

Documentos relacionados