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4.1.1 Embriões excedentários

O surgimento de métodos contraceptivos trouxe maior liberdade sexual às pessoas. Por outro lado, pessoas que, por variados motivos, não podiam ter filhos, viram-se diante da possibilidade de procriação com o surgimento das técnicas de reprodução artificial.

Em um primeiro momento, qualquer auxílio para a concretização da gravidez pode ser denominada procriação assistida. Como exemplo, tem-se desde o aconselhamento sobre o momento mais propício do ciclo menstrual para o casal manter relações sexuais, até o uso das diferentes técnicas de R.A.

Para Machado (2005, p.32), a R.A.:

[...] consiste no procedimento técnico-científico de levar o óvulo ao encontro do espermatozóide, sem a ocorrência do coito. Constitui-se, portanto, na prática, do conjunto de técnicas, que objetivam provocar a geração de um ser humano, através de outros meios que não a do relacionamento sexual.

A Res. nº 1358/92, do Conselho Federal de Medicina, esclarece que:

I – PRINCÍPIOS GERAIS:

1 – As técnicas de Reprodução Assistida (R.A.) têm o papel de auxiliar na resolução dos problemas de infertilidade humana, facilitando o processo de procriação quando outras terapêuticas tenham sido ineficazes ou ineficientes para a solução da situação de infertilidade.

Os embriões excedentários, segundo Casabona e Queiroz (2005, p. 248), surgiram em grande escala a partir do aperfeiçoamento das técnicas de R.A.

A partir do final da década de setenta, com o nascimento de Louise Joy Brown, em 5 de julho de 1978, na Inglaterra, considerada o primeiro “bebê de proveta” do mundo, tornou-se certo um fato que, até então, pertencia ao campo experimental: a possibilidade de concepção de um ser humano in

vitro. A fertilização extracorpórea passou, desde então, a fazer parte efetiva

das técnicas de reprodução humana assistida. De um lado, a referida técnica trouxe a solução para inúmeros casais inférteis, mas, de outro, gerou profundos questionamentos jurídicos, muitos dos quais até o presente permanecem sem resposta adequada.

Visando a redução do número de embriões excedentes, a classe médica tem buscado o aperfeiçoamento das técnicas de R.A., objetivando limitar o número de embriões ao mínimo necessário ao êxito da procriação.

Indiscutivelmente, esta é a melhor saída e a mais coerente, pois a produção excessiva de possíveis vidas humanas, como se fossem objetos de consumo ou meros instrumentos a justificar o desejo dos casais de terem filhos, dá-nos a sensação de que a espécie humana não é nada mais do que um meio e não um fim em si mesmo (LEITE, 1995, p. 386).

Todavia, enquanto os cientistas não conseguem atingir o método mais eficaz, evitando a produção de embriões excedentários, algumas sugestões quanto ao destino dos mesmos são consideradas na órbita mundial, dentre elas a de congelá-los por certo tempo, a de doá-los a outros indivíduos, a de experimentá-los em pesquisas científicas e, por último, simplesmente destruí-los.

Nesse contexto, a proposta em maior evidência hoje é a de se valer dos embriões excedentários considerados inviáveis ou congelados por certo tempo para a realização de pesquisas científicas em prol da sociedade, buscando a cura de doenças, a clonagem de órgãos para salvar vidas humanas, dentre outros benefícios, o que se dá através de experimentos com células-tronco retiradas desses embriões.

4.1.2 Células-tronco

As células-tronco são encontradas desde as primeiras etapas do desenvolvimento humano, sendo essenciais na estruturação do novo organismo.

Assim, pode-se dizer que as células-tronco caracterizam-se por duas propriedades básicas: a capacidade de auto-multiplicação, dividindo-se a partir delas mesmas dando origem a outras células com características idênticas às de origem; e a habilidade de, em certas circunstâncias, se tranformarem em tipos celulares especializados, responsáveis pelo desenvolvimento dos mais variados órgãos do corpo humano, funcionando com verdadeiras “células curinga” (MARQUES, 2006, p. 9-13).

A respeito de sua capacidade de diferenciação, as células-tronco podem ser: totipotentes, pluripotentes, multipotentes e unipotentes.

As células-tronco totipotentes são aquelas que apresentam a capacidade de se desenvolver em um embrião e em tecidos e membranas extra- embrionárias. Contribuem para a formação de todos os tecidos celulares de um organismo adulto. A totipotência é a capacidade funcional de uma célula de gerar um indivíduo completo após um processo de desenvolvimento normal.

As células-tronco pluripotentes, presentes nos estágios iniciais do desenvolvimento embrionário, podem gerar todos os tipos de célula no feto e no adulto e são capazes de auto-renovação, no entanto, não são capazes de se desenvolver em um organismo completo, isto é, não dão origem a um embrião, nem tampouco aos anexos embrionários.

Já a multipotência é a característica presente nos tecidos e órgãos adultos, apropriadamente também são chamadas de células somáticas – do grego, que significa soma, corpo -, porque não são, necessariamente, coletadas em um corpo adulto, podem ser extratídas de uma criança, do sangue do cordão umbilical etc.

Por último, os pesquisadores destacam as células-tronco unipotentes, que apresentam a capacidade de se converter em apenas um tipo de célula, mas que possuem a habilidade de se auto-renovar, o que as distingue das células que não são células-tronco (ROCHA, 2008, p. 41).

O interesse científico nessas células vem de sua capacidade de renovação, o que faz das mesmas uma alternativa em potencial no tratamento de doenças que causam a degeneração de tecidos, pois são capazes de repor as células saudáveis.

Célula-tronco embrionária (pluripotente) são células primitivas (indiferenciadas) de embrião que têm potencial para se tornarem uma variedade de tipos celulares especializados de qualquer órgão ou tecido do organismo. Já a célula-tronco adulta (multipotente) é uma célula indiferenciada encontrada em um tecido diferenciado, que pode renovar-se e (com certa limitação) diferenciar-se para produzir o tipo de célula especializada do tecido do qual se origina (MAYOR, 1992, p. 17).

A maioria dos pesquisadores diz que, por serem pluripotentes, é das células-tronco embrionárias que provêm quaisquer tipos de células e tecidos humanos, diferentemente das células-tronco adultas que, por serem multipotentes, têm um potencial mais limitado, visto que só são capazes de gerar um único tipo de célula.

As células-tronco embrionárias são estudadas desde o século 19, mas só há 20 anos dois grupos independentes de pesquisadores conseguiram imortalizá-las, ou seja, cultivá-las indefinidamente em laboratório. Para isso, utilizaram células retiradas da massa celular interna de blastocistos (um dos estágios iniciais dos embriões de mamíferos) de camundongos. Essas células são conhecidas pela sigla ES, do inglês embryonic stem cells (células-tronco embrionárias), e são denominadas pluripotentes, pois podem proliferar indefinidamente in vitro sem se diferenciar, mas também podem se diferenciar se forem modificadas as condições de cultivo. De fato, é preciso

cultivar as células ES sob condições muito especiais para que proliferem e continuem indiferenciadas, e encontrar essas condições foi o grande desafio vencido pelos cientistas (RAMOS, 2006, p. 93).

As células-tronco embrionárias podem ser obtidas dos embriões excedentários congelados em clínicas de reprodução artificial; da doação de gametas (óvulos e espermatozóides) para fertilização visando unicamente a obtenção de células-tronco; da partenogênse1; e através da transferência nuclear do material genético do DNA2 (MARQUES, 2006, p.13-17).

Já as células-tronco adultas são as células ainda sem diferenciação encontradas em tecidos especializados, logo, quando o organismo precisa delas, elas se diferenciam, passando a ocupar o lugar da célula morta ou doente.

Em 1998, a equipe italiana liderada pela bióloga Giuliana Ferrari, do Instituto San Rafaelle-Tellethon, apresentou o primeiro relatório sobre as propriedades das células-tronco adultas. Os pesquisadores estabeleceram que células-tronco de medula óssea podem dar origem a células musculares esqueléticas e podem migrar da medula para regiões lesadas no músculo. Estudos recentes constataram que além da pele, do intestino e da medula óssea, outros tecidos e órgãos humanos - fígado, pâncreas, músculos esqueléticos (associados ao sistema locomotor), tecido adiposo e sistema nervoso - têm um estoque de células-tronco e uma capacidade limitada de regeneração após lesões (CARVALHO, 2001, p.18).

As células-tronco adultas, segundo estudiosos do assunto, são encontradas no sangue, na medula óssea, no cérebro, vasos sanguíneos, músculos, intestinos, fígado, pâncreas, sistema nervoso e pele (MARQUES, 2006, p. 13-17).

1

“A partenogênse é um tipo de reprodução unissexual, na qual as fêmeas da espécie originam sua descendência sem fecundação pelos machos, carecendo, portanto, da dotação genética paterna. Teratomas e cistos dermóides ovarinos em humanos têm fornecido evidências de que ocorre partenogênese humana espontânea, dando origem a algumas poucas células-tronco. Dessa constatação derivou a hipótese de a partogênese humana artificial vir a ser como fonte de células- tronco para uso em pesquisa. Esta última se daria pela estimulação in vitro de um único óvulo, dando início ao processo de divisão celular semelhante ao que ocorre de modo espontâneo no ovário, na ausência do gameta masculino e sem fertilização do óvulo” (MARQUES, 2006, p. 28)

2

“Trata- se da transferência nuclear de uma célula somátia adulta, extraída de um indivíduo portador de uma dada condição médica, para dentro de um óvulo esvaziado do próprio material genético e cedido por uma doadora. Após essa transferência nuclear, a célula resultante é ativada e inicia- se a divisão celular. Da mesma forma, quando atinge o estágio de blastócito, as células-tronco são isoladas e cultivadas, gerando- se assim novas linhagens celulares. A transferência nuclear, desse modo, pode ser considerada um procedimento de clonagem que possibilita a criação de embriões geneticamente idênticos ao doador da célula original” (ZATZ, 2004, p. 250).