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Concepção da Política de Assistência ao Educando do IFMA

A formulação de políticas públicas é um movimento complexo e envolve diversos sujeitos nesse processo. Agentes públicos, movimentos sociais, governo e demandatários trazem suas reivindicações para serem discutidas e, a partir disso, formulam propostas de implementação a partir de um consenso possível. Conforme afirma Silva (2013),

[ . . . ] o processo das políticas públicas é assumido, nos seus diferentes momen- tos, por uma diversidade de sujeitos que entram, saem ou permanecem nele, orientados por diferentes racionalidades e movidos por diferentes interesses, fazendo do desenvolvimento das políticas públicas um processo contraditório e não linear (SILVA, 2013, p. 27-28).

A assertiva da autora destaca que a formulação das políticas públicas não é um ato isolado e tampouco neutro, pelo contrário, encerra a agregação de um conjunto de forças sociais com concepções e ideologias diversas. Desse modo, tais políticas expressam a ação de sujeitos que possuem e representam interesses às vezes contraditórios, assim, no decorrer desse processo é que tais interesses são compatibilizados levando em conta os aspectos presentes no movimento da realidade social concreta.

É com base nesse entendimento que consideramos a Política de Assistência ao Edu- cando do IFMA como um instigante objeto de estudo, visto que como já exposto neste trabalho, o seu processo de formulação foi perpassado por diversos interesses e teve o envolvimento de diversos sujeitos sociais. Ademais, expressa:

[ . . . ] um conjunto de princípios e diretrizes que norteia a implantação de programas para garantir o acesso, a permanência e a conclusão do curso com qualidade pelos estudantes, na perspectiva de inclusão social, formação ampliada, produção do conhecimento e melhoria do desempenho acadêmico (IFMA, 2014b, p. 2).

Ao expor essa concepção podemos notar que a PAE-IFMA é elaborada com o propósito de atender às demandas postas pelos estudantes, tendo como base as ações de intervenção apontadas pelo PNAES 2010, fundamentadas na Constituição Federal de 1988 e na Lei de

Diretrizes e Bases de 1996, as quais em linhas gerais, reconhecem a necessidade de garantir “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”.

Com isso, a PAE-IFMA deixa evidente que o acesso à educação por si só não basta, sendo necessário o suporte de outras ações como essas de assistência estudantil, cujo apoio significa melhoria na qualidade de vida desses estudantes, podendo também, vir a proporcionar melhores oportunidades de ingresso no mercado de trabalho.

Nesse sentido, a referida política deixa claro que o acesso a uma formação possibilita ao estudante um conjunto variado de conhecimentos que lhes darão melhores condições de integração na sociedade, tanto laboral, quanto social. Além disso, ao propiciar tais condições de permanência, pretende garantir ao estudante uma educação ampla, de qualidade, inovadora e criativa, que está nas entrelinhas, sendo ofertada na instituição.

A PAE-IFMA foi pensada pelos formuladores para que implementadores, gestores, docentes e discentes tivessem um referencial para adoção e construção de ações no campo da assistência estudantil do IFMA, ou seja, todas as atividades nessa área devem buscar na política, orientações e respaldo, a fim de dar unidade aos trabalhos, proporcionando o alcance dos objetivos previstos, quebrando com iniciativas isoladas que possam afrontar os princípios nela estabelecidos.

Pretende, ainda, desenvolver programas e projetos capazes de assegurar o direito à educação dos estudantes do IFMA, subsidiando as práticas escolares ou as condições míni- mas de permanência. Desse modo, tem um amplo espectro de intervenção que, segundo os seus elementos constituintes, está para além da redução dos agravos advindos de situações socioeconômicas desfavoráveis.

O desenvolvimento dessas ações deverá estar orientado com vistas a proporcionar a inclusão social dos estudantes, a partir de uma formação ampla, produção do conhecimento e melhor desempenho acadêmico.

A partir disso, podemos perceber que a concepção da PAE-IFMA para os seus formu- ladores tem como objetivo contribuir, principalmente, com os estudantes pobres, na melhoria do desempenho acadêmico e agir, preventivamente, nas situações de retenção e evasão decor- rentes da insuficiência de condições financeiras (BRASIL, 2010), minimizando os efeitos das desigualdades sociais e promovendo a inclusão social.

Fica dessa forma evidente que a PAE-IFMA aspira ser uma política democrática e emancipadora, permitindo que os estudantes, inclusive os pobres, tenham melhores condições de estudarem e desenvolverem suas atividades acadêmicas enquanto estiverem na instituição.

Isso, certamente, configura-se um passo à frente, porque, de fato, frente ao processo de empo- brecimento da classe trabalhadora, muitas famílias possuem sérias dificuldades de manter seus filhos na escola.

Por outro lado, vemos também que os formuladores da PAE-IFMA associavam inclu- são social, formação ampliada, produção do conhecimento e melhor desempenho acadêmico, estabelecendo, assim, relação entre inclusão e mérito.

Desse modo, reafirmam a concepção meritocrática de que só os melhores, os mais bem preparados terão oportunidades de emprego, dada a escassez de vaga e alta seletividade e exigência do mercado. Sendo assim, ao evitar que os estudantes abandonem ou tenham baixo rendimento, a PAE-IFMA possibilita melhores condições de competitividade entre àqueles que não possuem e àqueles que possuem condições socioeconômica favoráveis, permitindo aos primeiros que, pelo menos, se igualem nas condições de acesso ao conhecimento, possibilitando assim, uma disputa e competição mais equilibrada.

Todavia esse conteúdo presente na política não é algo independente e fruto da vontade de seus propositores, na verdade, obedece a lógica capitalista, presente no conteúdo ideológico neoliberal, que tem se entranhado no campo educacional e que acaba colocando no mérito individual o sucesso e o fracasso das pessoas.

O neoliberalismo privatiza tudo, inclusive também o êxito e o fracasso social. Ambos passam a ser considerados variáveis dependentes de um conjunto de opções individuais através das quais as pessoas jogam dia a dia seu destino, como num jogo de baccarat. Se a maioria dos indivíduos é responsável por um destino não muito gratificante é porque não souberam reconhecer as vantagens que oferecem o mérito e o esforço individuais através dos quais se triunfa na vida. É preciso competir, e uma sociedade moderna é aquela na qual só os melhores triunfam. Dito de maneira simples: a escola funciona mal porque as pessoas não reconhecem o valor do conhecimento; os professores trabalham pouco e não se atualizam, são preguiçosos; os alunos fingem que estudam quando, na realidade, perdem tempo etc. (GENTILI, 1996, p. 6).

No Brasil, principalmente a partir da década de 1990, a ideologia neoliberal invade o campo das políticas públicas, modificando a perspectiva da intervenção estatal tanto na forma quanto no conteúdo dessas políticas. Essa mudança de orientação estatal visa dentre outros objetivos, a redução dos gastos públicos sob a alegação de que, assim, estaria enfrentando a crise. Sabe-se, no entanto, que tais medidas são parte das estratégias de reestruturação do capital. Segundo Lima (2004, p. 180), o mundo do trabalho vem experimentando um conjunto de transformações que afetam o nível e a qualidade do emprego, os requisitos de qualificação, bem como o padrão de gestão estatal da força de trabalho.

Nesse contexto de ajuste, o investimento em educação então seria uma forma de incrementar o sistema produtivo e a exigência por níveis cada vez mais elevados de escolari- dade, uma forma de ocultar as debilidades do sistema, transferindo para o âmbito individual a responsabilidade de estar empregado.

Esse pensamento com base na ideologia neoliberal, vem subsidiando a política de educação brasileira que se conforma em reduzir seu campo de atuação à tarefa de formar pessoas para o mercado de trabalho, sendo assim, a inclusão social por meio do trabalho é uma inclusão para dentro do sistema capitalista, de forma que uma rede bem interligada e coesa é tecida pelo capital junto com o Estado para a sociedade, impossibilitando, muitas vezes, a visão de que é possível construir novas formas de organização.

Dessa forma, a PAE-IFMA traz na sua concepção uma proposta que embora sinalize para uma educação mais ampla, no que se refere ao entendimento de que essa é um direito, não consegue romper com a educação nos moldes do capital, pois apenas oferece as mínimas condições para que os estudantes não interrompam seus estudos, diminuindo, assim, as chances deles se juntarem à grande massa que não tem sequer a oportunidade de competir pelas escassas vagas disponíveis.

Ao analisar a proposta formulada pelos propositores da PAE-IFMA, percebemos que há um entendimento de que é possível “promover a inclusão social por meio da educação” (IFMA, 2014b). Entretanto, no nosso entendimento, essas mudanças se dão em nível aparente, ou seja, são mudanças que atingem os estudantes nas suas condições e necessidades mais imediatas, mas, em tese, não modificam a ordem imposta pelo capital, pelo contrário, as reforçam.

Obviamente, não queremos dizer que a PAE-IFMA fracassa em sua missão, até mesmo porque reconhecemos que a resolução de todos os problemas sociais não se constitui pretensão de uma única política, mas devemos pontuar que esse conjunto de ações que propõe desenvolver, atinge de forma efêmera as situações enfrentadas pelos estudantes, proporcionando apenas um alento momentâneo às suas demandas. Além disso, acreditamos que a política não tem como assegurar inclusão social, mesmo que os estudantes passem por todo o processo formativo, pois isso depende de outras variáveis que estão fora do alcance da política de assistência estudantil e de educação.

Cabe destacar que a formulação da PAE-IFMA se constitui um primeiro esforço em sistematizar em um só documento as ações no campo da assistência estudantil que, até então, eram realizadas de maneira isolada e sem diretrizes bem definidas. Nesse sentido, pode-se perceber que a construção dessa política, em si, já é um avanço, entretanto, é necessário que ela

seja amadurecida e discutida a fim de ser uma proposta realmente inovadora.

As limitações apresentadas pela PAE-IFMA, no entanto, não anulam o esforço e a luta da sociedade civil, estudantes e trabalhadores da educação em evitar o processo de desresponsabilização do Estado por meio das suas instituições frente às demandas dos estudantes. Em meio ao esfacelamento dos serviços sociais públicos, a construção de uma política que objetiva garantir o direito à educação de estudantes de escola pública, afirma a responsabilidade do IFMA em preservar esse direito.

Com críticas ao conteúdo, à aplicação dos conhecimentos e a quem eles beneficiam, não podemos deixar de analisar que as políticas públicas são permeadas de contradições. Por um lado, dissemos que ela é insuficiente e que por fatores de ordem estrutural e, até mesmo, de concepções poderá ter dificuldades no alcance de seus objetivos.

Por outro lado, em meio às perdas de direitos sociais, da corrosão do sentido da responsabilidade pública (TELLES, 1994), ter uma política que aspire possibilitar melhores condições de permanência aos estudantes, chama e dá ao Estado um dever que é seu, indo de encontro à onda que joga para o universo particular a incumbência de zelar por um interesse que também é público.

Dado o nível de inter-relações presentes na constituição de uma política pública, a análise da concepção da PAE-IFMA traz a necessidade de compreendermos seus princípios, tendo em vista que eles buscam sustentar e dirigir o caminho que a política percorrerá para alcançar seus objetivos. Nesse sentido, no próximo item, nos debruçaremos sobre os princípios balizadores da PAE-IFMA.

3.4 Princípios, fundamentos e estrutura da Política de Assistência ao Educando do IFMA