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Concepção objetiva

No documento Uma abordagem acerca da causa contratual (páginas 61-64)

5. INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DA TEORIA DA CAUSA CONTRATUAL

5.1. A causa como finalidade subjetiva e a causa como finalidade objetiva

5.1.2. Concepção objetiva

A direção objetiva é a que está generalizada entre os civilistas italianos127 e encontrou em Betti a sua mais moderna e adequada expressão. Betti128 afirma que deve ser superada a visão unilateral e atomista que identifica a causa com elementos singulares do negócio e lhe concede uma dogmática inadequada. Para Betti, a idéia jurídica de causa deve ser iluminada pela idéia hegeliana da razão (Grund), contemplando o negócio inteiro. A razão do negócio, por sua vez, é sua função econômico-social. O negócio, como ato de exercício da autonomia privada, é um fenômeno social. O que se deve buscar é, portanto, a função típica deste fenômeno, que é o que o Direito valora e tutela até o ponto de elevá-lo à categoria de fenômeno jurídico percebido por seus autores.

Para o autor italiano, a causa, razão ou justificação objetiva do negócio, está na sua função. Quem promete, dispõe, renuncia ou aceita visa sempre a alcançar uma das finalidades práticas típicas que regem a circulação de bens e a prestação dos serviços na vida de relação: obter um equivalente, trocar, dar crédito, encerrar um litígio.

126

Como pretendeu explicar Planiol, segundo DIEZ-PICAZO, 1996, p. 229. 127

Já em 1908, BONFANTE, Pietro (Il Contratto e la Causa del Contratto. Rivista di Diritto Commerciale, 6: 115, 1908, p. 123) afirmava: “La causa adunque, che è un antecedente storico rispetto alla volontà, non dipende punto dalla volontà (...) Non è il motivo per cui la parte agisce, ma il motivo, se si vuole, per cui la legge riconesce la sanzione giuridica, cioè l’essenza obbiettiva della relazione tra le parti, il negozio”.

128

Betti129 defende que é unilateral e restrito o

ponto de vista da lei, do objecto ou dos sujeitos, que levou à elaboração de uma noção de causa ‘objectiva’, ou ‘subjectiva’, respectivamente. Na verdade, ao passo que o interesse individual na conclusão do negócio, visa, naturalmente, um escopo de carácter variável e contingente, que não é, por si, suficiente para justificar a tutela jurídica do negócio, inversamente, o interesse social por essa tutela, tal como se deduz da função económico- social da autonomia privada, reflectida no tipo de negócio abstractamente considerado, não basta para explicar a efectiva celebração do negócio no caso singular, sem um interesse concreto que a determine em cada caso. Isto cria a necessidade de considerar a causa do negócio sob os vários aspectos (...).

Para Betti130, perspectiva unilateral é a de quem identifica a causa com o elemento subjetivo do negócio, quer com o próprio consenso, nos contratos, quer com a vontade e seus motivos, nos negócios unilaterais. Igualmente errônea é, para ele, a perspectiva de quem identifica a causa com outros elementos singulares do negócio, tais como o objeto. Constata, pois, que é fácil chegar à conclusão de que “a causa ou razão do negócio se identifica com a função económico-social de todo o negócio, considerado despojado de tutela jurídica, na síntese de seus elementos essenciais, como totalidade e unidade funcional, em que se manifesta a autonomia privada. A causa é, em resumo, a função de interesse social da autonomia privada”131.

Assim, a escola objetivista, com Betti e Cariota-Ferrara, e, entre nós, Torquato Castro, embora não tenha uma unidade interpretativa do que seja a causa (ou não encontre unidade quanto às diferentes concepções de causa final), sustenta que a investigação da causa nada tem a ver com a motivação subjetiva do ato, mas se identifica basicamente com o fim econômico e social do negócio jurídico.

129 BETTI, 1969, p. 340. 130 BETTI, 1969, p. 349. 131 BETTI, 1969, p. 350.

Massimo Bianca132 sustenta que a doutrina italiana, ao definir a causa como a função sócio-econômica do negócio, não se adapta nem à concepção subjetiva, nem à objetiva. A causa seria, como acima mencionado, a razão prática do contrato decorrente da mencionada função sócio-econômica, ou seja, o interesse que a operação contratual é dirigida a satisfazer. A sua falta comportará, de regra, a nulidade do ato, visto que a causa típica, ainda abstrata, é fator essencial de validade do contrato, isto é, fundamento da relevância jurídica do negócio jurídico bilateral.

Outros autores, mais generalistas, criticam Betti por valer-se exclusivamente, em sua definição, de elementos extrajurídicos, tornando irrelevantes elementos como a vontade e a forma. Por isso, Pugliatti133 preferiu definir a causa como função jurídica (e não econômico- social) do negócio, caracterizada pela síntese de seus efeitos (jurídicos) essenciais.

Diez-Picazo134 leciona que a teoria objetiva é hoje criticada, sobretudo porque não explica de que modo um negócio típico, dotado de uma função econômico-social também típica, pode, por vezes, ser afetado pelo propósito ou pela intenção específica perseguida pelas partes135. Por outro lado, afirma que não se deveria confundir a função econômico-social com a causa, chegando a afirmar o quanto segue:

La función econômico-social no actúa como causa. Lo único que puede ser, se piensa, causa del negocio es el intento o la voluntad de las partes de obtener esta función económico-social. Esto explica también que el intento práctico de las partes tenga en muchas ocasiones relevancia jurídica del intento práctico, del resultado empírico perseguido, no pueda encauzarse a través de la idea de causa, entendida con arreglo a una concepción objetivista. Se hace, pues, necesario valorar las motivaciones, sobre todo las motivaciones comunes a ambas as partes; y esta valoración solo encontra su adecuado cauce a través de la figura de la causa. Es la causa la que permite tildar de nulo a un negocio inmoral o ilícito.

132

BIANCA, 1987, p. 444. 133

PUGLIATTI, Salvatore. Precisazioni in tema di causa del negozio giuridico. Diritto Civile: Metodo – Teoria – Pratica. Milano: Giuffrè, 1951, p. 109 apud KONDER, 2006, p. 36.

134

DIEZ-PICAZO, 1996, p. 228. 135

Inegavelmente, Diez-Picazo apenas está apenas procurando objetivar a concepção subjetiva de causa.

O que os autores, incluídos Betti e Diez-Picazo, parecem não admitir é que ambas as concepções de causa são existentes e merecem tutela, devendo reconhecer-se tanto a causa final típica ou abstrata como a causa final concreta.

No documento Uma abordagem acerca da causa contratual (páginas 61-64)

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