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A partir do exposto, afirma-se que a estratégia metodológica adotada conseguiu-se identificar nas questões de estatística do Enade as habilidades de LE presentes no modelo de Gal (2002). Além disso, os conteúdos abordados cobriram os principais temas presentes na Estatística Moderna, notadamente a Análise de Regressão, a qual representou 50% das questões analisadas.

Nesse sentido, chamou atenção o fato de que as questões exigiram, em sua totalidade, a análise e interpretação de conceitos estatísticos. Dessa forma, nenhuma das questões analisadas priorizou comandos do tipo: “calcule” ou “qual o valor”. Os cálculos matemáticos, quando necessários, estiveram contextualizados com alguma afirmação interpretativa e limitaram-se às operações matemáticas básicas, notadamente, com números decimais e/ou em formato percentual.

A forma de apresentação dos dados nas questões articulou-se, fortemente, com tabelas, as quais estiveram presentes em 75% do total (questões 12,17, 25, 26, 30 e 33). Já o uso de gráficos foi observado apenas na questão 1, a qual exibiu um infográfico sobre a distribuição de cultivo transgênico no mundo. Esse infográfico exigiu do estudante uma boa capacidade de análise, na medida em que misturou gráficos de setores, de barras e elementos cartográficos.

O contexto das questões, na maior parte das vezes, resultou de situações de pesquisas socioeconômicas verídicas. As questões ligadas aos conteúdos da Análise Descritiva (Questões 1, 26 e 30) foram elaboradas, exclusivamente, a partir de pesquisas verídicas e as questões 26 e 30 utilizaram dados do IBGE, o órgão oficial do Brasil, em termos de produção e divulgação de informações estatísticas.

Já as questões relacionadas com Inferência Estatística foram no caminho oposto, pois 75% dessas questões relacionaram-se com pesquisas fictícias, ainda que estivessem relacionadas com contextos econômicos (Questões 17, 25 e 33). Esse aspecto vai ao encontro de outros estudos (KASSSEN, 2019; BATANERO et al., 2017;

KENNEDY, 2009) que relatam o intenso uso de dados fictícios no ensino da Análise de Regressão. Por fim, a única questão referente à Probabilidade (Q.12) foi composta também por dados fictícios, no contexto do mercado financeiro.

Observa-se que o posicionamento crítico esteve relacionado, na maior parte das vezes, à ausência de informações sobre a fonte dos dados ou recorte temporal.

Problemas com a representatividade da amostra também foram encontrados. No tocante aos elementos disposicionais, foram identificados os mais variados cenários, desde a ideia de que a média sempre será o valor do “meio”, até a postura de encarar os resultados dos modelos de regressão como determinísticos, exatos. Aspectos sociais e de gênero também estiveram inclusos nesses elementos.

Discutidos os principais pontos do LE de Gal (2002) identificados nas questões, apresentam-se os níveis de desempenhos apresentados pelos estudantes, agregados por tipo de conteúdo (Tabela 5.11). Nota-se que esses níveis variaram em função do

tipo de conteúdo abordado na questão. Desse modo, a Análise Descritiva reportou o melhor desempenho médio (49,63%), além de exibir a questão com maior nível médio de acerto dentre as oito analisadas relacionada com a utilização de infográfico. Apesar disso, vale ressaltar que a referida questão esteve inserida no componente de Formação Geral do Enade, indicando que as habilidades exigidas nesta estão mais associadas a contextos formativos gerais, ao background dos estudantes.

Já a Inferência Estatística foi o conteúdo de menor desempenho médio, com 33,03%. Nesse conteúdo, encontrou-se ainda a questão com o menor percentual de acerto de toda a pesquisa, a Q.33 com 17,65%. Vale notar que essa questão foi a que demandou o menor nível de habilidades matemáticas. Em verdade, foi necessário apenas a leitura e comparação de alguns valores. Por fim, o conteúdo da Probabilidade obteve desempenho de 39,94%, referente à questão 12.

Ainda de acordo com a Tabela 5.11, a variabilidade do desempenho dos estudantes, em cada conteúdo, foi medida pelo cálculo do Coeficiente de Variação (CV). Em geral, consideram-se que bons níveis de homogeneidade são encontrados em dados com CV menor ou igual a 25%. Assim, o CV na Análise Descritiva e Inferência Estatística foram de 45,75% e 44,38%, em respectivo; quase o dobro do recomendado. Isso indica que, mesmo separando as questões por tipo de conteúdo, o desempenho possui caráter bastante heterogêneo. Com relação ao conteúdo da Probabilidade, não foi possível analisar a variabilidade do desempenho, por possuir apenas uma questão.

Tabela 5.11 – Distribuição do desempenho médio dos estudantes de Economia nas questões de Estatística e resumo descritivo, por tipo de conteúdo – Enade, 2018

Conteúdo Questão Acertos (em %)

Análise Descritiva Q.01 75,90

Q.26 39,05 Q.30 33,94 Resumo Descritivo

Média = 49,63 DP = 22,52 CV = 45,75

Conteúdo Questão Acertos (em %) Probabilidade Q.12 39,94

Resumo Descritivo

Média = 39,94 DP = NA CV = NA

Conteúdo Questão Acertos (em %)

Inferência Estatística Q.17 47,24

Q.25 43,75 Q.31 23,50 Q.33 17,65 Resumo Descritivo

Média = 33,03 DP = 14,65 CV = 44,38

Fonte: Elaboração Própria. DP = Desvio Padrão; CV = Coeficiente de Variaçao; NA = Não se Aplica

Transcorridas essas discussões, o próximo passo foi desvendar possíveis explicações para os diferentes níveis de letramento estatístico apresentado pelos estudantes. Para tanto, foi construída uma Tipologia das Condições de LE dos estudantes, a ser detalhada no próximo capítulo.

6 TIPOLOGIA DAS CONDIÇÕES DE LETRAMENTO ESTATÍSTICO:

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O principal objetivo deste Capítulo é apresentar e discutir os resultados obtidos, via uso do método GoM, para a construção de uma Tipologia sobre as Condições de LE dos estudantes de Economia. Essas Condições podem ser vistas como uma tentativa de evidenciar possíveis associações entre o nível de LE dos estudantes e um amplo conjunto de variáveis relacionadas com diversos aspectos estudantis.

A quantidade de Perfis Extremos que compõem a Tipologia foi definida a partir de critérios estatísticos, especificamente, a partir dos valores da função de verossimilhança. Foram testados dois modelos, um com dois Perfis Extremos (k = 2) e outro com três (k = 3). Para cada modelo, foram executadas 500 simulações de Monte Carlo. O objetivo dessas simulações foi escolher, dentre todas as simulações, aquela com maior valor da função de log-verossimilhança. De acordo com Guedes et al. (2016), isso aumenta a possibilidade de se trabalhar com máximos globais, fato crucial em modelos estatísticos como os do GoM. 32.

Após a obtenção dos maiores valores da log-verossimilhança de cada modelo, aplicou-se o Critério de Informação de Akaike33 (AICk) para escolher aquele com melhor ajuste aos dados. Conforme discussão realizada no Capítulo 4, a situação escolhida será aquela com o menor valor AIC. Obteve-se, então, os seguintes valores:

AICk=2 = 489.805,26; AICk=3 = 477.112,59. Logo, o modelo final de Tipologia adotado foi o com três Perfis Extremos (k =3).

Nessa esteira, o presente Capítulo está dividido em três sessões. Na primeira são descritos os resultados referentes aos Perfis Extremos das Condições de LE dos estudantes. Na segunda, apresenta-se a Tipologia, propriamente dita, acompanhada da validação dos Perfis Mistos. Na terceira, são discutidas as associações entre o desempenho nas questões de Estatística com as demais variáveis presentes na Tipologia, com o intuito de compreender melhor as diferenças de LE entre os Perfis das Condições de LE.

32 Por ser uma função de verossimilhança, as estimativas encontradas para o GoM precisam ser, de fato, os valores que maximizam as probabilidades envolvidas no processo. Matematicamente, isso equivale a encontrar o máximo global da função GoM.

33 O AIC é uma métrica que mensura a qualidade de um modelo estatístico visando também a sua simplicidade. Fornece, portanto, uma métrica para comparação e seleção de modelos, em que menores valores representam uma maior qualidade e simplicidade do modelo, segundo este critério.