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Através de uma linha psicanalítica, este estudo debruçou-se sobre a forma como os pais adotivos, ao nível da adoção internacional, contam a sua história relativa a este aspeto das suas vidas, e assim aceder aos mecanismos do funcionamento psíquico, recorrendo à Entrevista Narrativa em Associação Livre, que permite, neste sentido, aceder ao inconsciente do sujeito através da possibilidade deste falar abertamente sobre si mesmo e as suas vivências (neste caso, enquanto mães). Ainda, como já referido anteriormente, o objetivo de estudo foi delineado após a recolha de dados, com ambas as participantes, e de literatura adequada ao tema, pois foi a partir do que os sujeitos expressaram que se procedeu aos levantamento do conteúdos de maior relevância. É de salientar que este estudo tem uma enorme relevância para na área de estudo da psicologia clínica, devido ao acesso ao inconsciente do sujeito, em toda a sua dinâmica e complexidade do eu, de acordo com a sua subjetividade e intersubjetividade.

Como resultado deste estudo, foram encontradas diversas particularidades à partida, tanto numa como noutra participante. Apesar do objeto de estudo ser as mães que adotaram ao nível internacional, seria expectável inicialmente que falassem sobre as suas filhas, bem como a sua adaptação e a relação com elas, pois faz parte do processo em questão, bem como dos seus companheiros (pais adotivos), todavia, foram aspetos comuns que não se verificaram em nenhuma delas. Ainda, em comum poderá dizer-se que existe a dificuldade de ambas em lidarem com o facto de terem filhas com diferente cor de pele das suas, algo que, apesar de muitas vezes inconsciente, as perturba e leva a um conflito interno constante. Segundo Harf et al. (2013b), este processo envolve muito sofrimento por parte dos pais, e é necessário que este seja estudado, pois na maioria dos estudos é dada maior relevância às crianças, sendo estas o foco das atenções por parte da maioria dos autores. Mas, para que as crianças se possam adaptar criando relações de filiação e a afiliação saudáveis, é necessário ir de encontro aos ideais dos pais adotivos, bem como aos traumas com que poderão ter ficado de todos os procedimentos aos quais foram sujeitos até que pudessem realmente ter os seus filhos consigo, e este ponto, irá afetar as relações da criança para o resto da sua vida (Harf et al., 2013b).

No entanto, destacam-se algumas particularidades individuais de cada uma das participantes, como seres únicos que são, cada uma, de acordo com o seu modo de funcionamento, utilizam mecanismos de defesa particulares e característicos para lidar com o conflito em que se encontram, pois apesar de ambas estarem a reportar algo que já ocorreu há mais de uma década, existem problemáticas que permanecem atuais, denotando-se que ainda não as ultrapassaram. Porém, no final das suas narrativas começa a ser percetível que o que poderia

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estar recalcado reemerge, dando sinais das suas dificuldades. Em Leonor, essas dificuldades são percebidas e admitidas por ela, ao contrário de Bárbara, que ao revelar o que não são as suas dificuldades se percebe que realmente são as únicas que a “assombram”. Assim, podemos afirmar que este processo de “tornar-se mãe” de crianças adotadas num país distinto, para estas mães, abarca diversas vicissitudes e sofrimentos.

Assim, este estudo, como já referido, tem uma grande pertinência para a área da psicologia clínica, pois é estudado o sujeito em toda a sua plenitude, sem que sejam formuladas questões estruturadas e que possam enviesar o estudo, através do método da Entrevista Narrativa em Associação Livre, é lançado um olhar sobre o sujeito, sobre o seu funcionamento, sobre as suas vivências e sobre o seu inconsciente em contextos da vida real, permitindo-nos perceber o que há de subjetivo no sujeito. Importante assim referir que devemos respeitar o modelo de compreensão do sujeito, tendo sempre em atenção que estão sempre dois sujeitos envolvidos no processo (observador e observado), que interagem entre si e essa interação determina a expressão (Marques, 2001).

Por fim, o presente estudo poderá abrir portas para novos estudos. O ponto principal coloca-se sobre o facto de existirem poucos estudos referentes aos pais adotivos, que adotaram fora do seu país, pois o foco das atenções continua muito direcionado para as crianças e não para os pais. Com isto, as propostas para novos estudos poderiam ser direcionadas para a adaptação das crianças no país de acolhimento na relação com os seus pais, isto é, sempre através do método FANI, ao invés da questão inicial que é colocada ser a história da adoção, talvez direcionar mais para relação mantida entre os pais e as crianças desde o momento em que foram adotadas até ao presente. Outra questão que poderia ser interessante estudar seria, através de um estudo longitudinal, entrevistar os pais adotivos em diversos momentos do processo de adoção: uma entrevista inicial antes de adotarem; outra no momento posterior à adoção; e ainda uma última passados uns anos da mesma, sendo que no presente estudo apenas nos direcionámos para o após a adoção, com uma distância considerável do momento em que essa aconteceu. Ambas as hipóteses pretenderiam perceber, de forma mais aprofundada, as dificuldades sentidas pelos pais, e não apenas pela mãe, que passam pela adoção internacional, bem como os mecanismos do seu funcionamento psíquico. É ressaltado, neste momento, a importância de estudar algo que ainda está muito pouco aprofundado ao nível da psicologia clínica, existindo ainda muito por explorar.

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7. Referências

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