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O novo regime jurídico florestal introduzido pela Lei 12.651/12 traz um complexo conjunto de regras que visaram à harmonização e à pacificação de um antigo código que sofrera com a falta de efetividade. A harmonia intentada pela nova legislação era uma de- manda para a difícil tarefa de conciliar interesses muito divergentes

em matéria florestal no Brasil. A pacificação, um corolário neces- sário para dar solidez aos pontos de consenso entre interesses tão distintos. O debate em torno da proteção da vegetação nativa, de um lado, com a compatibilização de justos e legítimos interesses de pro- dução agropecuária, de outro, ficou suscetível a paixões dos diversos grupos de pressão. A razão ficou de lado. O resultado desse ambiente hostil e de poucas concessões recíprocas materializou-se com a apro- vação, pelo Congresso Nacional, de um complexo e nem sempre har- mônico texto normativo.

Os ataques foram imediatos. Diversas ações foram propos- tas para atacar a constitucionalidade de diversos dispositivos da LFlo/12. Teorias foram criadas, ressuscitadas ou adaptadas para tentar no Poder Judiciário retroagir ao regime anterior ou para va- lidar as novas regras. O rigor técnico-científico e hermenêutico foi substituído por referências a reportagens de jornais, a movimento de artistas, a supostos estudos e opiniões de autoridades. Parale- lamente, ataques jurídicos concentrados foram intentados perante o STF. O resultado desse ambiente hostil, passados cinco anos da publicação da lei, um cenário ainda de extrema insegurança jurídica. Talvez apenas o tempo para pacificar esse complexo diploma. Talvez seja ainda necessário o enfrentamento das inúmeras bata- lhas judiciais em curso. Às vezes, a insegurança opera resultados positivos para um lado e para o outro, individualmente considera- dos. O seu problema é o seu custo para a sociedade.

Neste trabalho, a seleção de três setores específicos, o elétri- co, o sucroalcooleiro e o financeiro, para ilustrar os obstáculos de implantação da LFlo/12, mostram que a insegurança jurídica ainda é muito grande. A rejeição de institutos de estabilização de qualquer Estado Democrático de Direito, como é o caso do direito adquiri- do, do ato jurídico perfeito e da irretroatividade da norma, no caso do setor elétrico, é o primeiro exemplo analisado na presente obra. Todo e qualquer novo regime jurídico, por mais nobre que seja o interesse tutelado, não pode abalar os pilares da segurança jurídica. E isso não quer dizer, necessariamente, menor proteção do meio ambiente. O respeito a esses pilares pode ser compensado com re- gras alternativas, de transição, capazes de acomodar os distintos interesses futuros com situações consolidadas no passado.

O segundo caso examinado toca questão bastante peculiar ao setor sucroalcooleiro. Mesmo tendo abolido quase que por

completo a queima da palha de cana-de-açúcar como prática de colheita, incêndios criminosos ou fortuitos expõem os produto- res rurais a regime de responsabilidades que dispensa culpa e até nexo de causalidade. Com o nobre intuito de se buscar a repara- ção a qualquer preço, não atentam alguns operadores do direi- to que podem causar sérias distorções em políticas públicas de preservação e conservação do meio ambiente e da saúde da po- pulação. Nem sempre o que aparenta mais é melhor. O incentivo criado pode ser pior do que a solução engendrada pela poderosa retórica da reparação integral.

Nessa linha de se tentar buscar maior efetividade para polí- ticas públicas de preservação e conservação ambiental, a terceira parte deste trabalho buscou examinar a racionalidade empregada pela PGR no ataque de inconstitucionalidade a um poderoso instru- mento de fomento ao principal mecanismo de efetividade da nova lei florestal, o CAR. A conclusão dessa análise demonstrou irresig- nação contra uma regra tida por incompleta pelo MPF e não ne- cessariamente ruim. Na prática, o pedido de inconstitucionalidade expõe uma frustração contra o que o Parquet entendera que deve- ria ser a regra. Não tendo a redação final da regra atendido à ex- pectativa do MPF, operou-se o ataque. Se bem-sucedido, contudo, perderemos um poderoso instrumento de garantia de sucesso do CAR, o qual, repita-se, não constitui objeto da irresignação da PGR. Entre ficar com uma regra boa, mas não a pretendida inicialmente, e sem a regra, porque não a pretendida inicialmente, opta-se por este último cenário. E isso assumindo que, de fato, a redação original era melhor. O presente trabalho pretendeu demonstrar justamen- te o contrário. A regra inicialmente concebida e pretendida pelo MPF expunha-a ao risco da declaração de inconstitucionalidade pela transferência do exercício do poder de polícia. Além disso, em sua redação original, a regra do artigo 78-A da LFlo/12 apresentava probabilidade significativa de aumento ineficiente do custo social. Em outras palavras, corria-se o risco de se ter uma norma que es- trangularia o crédito e não produziria os esperados efeitos positivos para o meio ambiente.

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Este livro foi produzido pela FGV Direito Rio, composto com a família tipográfica Gotham

e impresso em papel offset, no ano de 2016.