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Conclusão: um olhar sobre o caso português

A “agrocultura glocal”: os produtos “glocais” amigos do mundo rural

2. Conclusão: um olhar sobre o caso português

Falámos, até agora, de um movimento gerado no contexto americano, com as suas especificidades, nomeadamente o longo percurso de domínio do complexo agro-industrial, da grande distribuição e das cadeias de ―fast food‖, promotor de crescentes problemas nas agriculturas, nos espaços rurais e na sociedade em geral. No que se refere à sociedade, registe- se o intenso debate sobre os estilos de vida, os hábitos alimentares, o consumo de alimentos super-processados e os seus efeitos na saúde, nomeadamente na crescente e bem visível obesidade entre a população dos EUA (Loureiro e Nayga, 2004). Por outro lado, convém ter presente que se trata de uma sociedade fortemente urbanizada, com fácil acesso aos mais diversos meios de comunicação, na qual existe uma forte tradição de organização voluntária dos cidadãos e em que uma larga fatia populacional tem significativo poder de compra.

Por cá, a história é outra. Se é verdade que a grande distribuição tem vindo a assumir uma importância crescente, que as cadeias de ―fast food‖ estão em quase todo o país (com mais peso nas áreas urbanas) e que os alimentos processados estão cada vez mais presentes na nossa dieta, também é verdade que muitos portugueses mantêm laços de relativa proximidade com as suas raízes rurais, que a culinária tradicional continua a ser influente e que a nossa dieta incorpora ainda muitos elementos das heranças atlântica e mediterrânica, como o consumo de pescado, de frutos e legumes frescos, de pão e de azeite. Porém, as iniciativas de resistência ao sistema alimentar global também existem, visando, nomeadamente, defender a pequena agricultura, manter ou reconstruir sistemas alimentares de proximidade e promover as ligações entre produtores e consumidores.

Um exemplo é o projecto ―Relações de Cidadania entre Produtores e Consumidores‖ (ReCíProCo), dinamizado pela Organização Cooperativa para o Desenvolvimento Integrado do Concelho de Odemira (TAIPA), cujos objectivos são claros: integrar a agricultura nas estratégias de desenvolvimento local; gerar novas ligações entre rural e urbano; valorizar uma agricultura de proximidade e a manutenção de pequenas quintas agrícolas; criar parcerias entre produtores e consumidores, permitindo o acesso dos consumidores a produtos locais frescos; sensibilizar para o consumo dos produtos frescos locais de qualidade; e criar nos grupos LEADER competências para desenvolver acções inovadoras nestas áreas (Thirion, 2006: 8; www.taipa-desenvolvimento.pt).

Entre as acções do ReCíProCo estão a criação de grupos de consumidores e a distribuição de cabazes, numa lógica em tudo semelhante à ―Community Supported Agriculture‖ (CSA). Projectos do mesmo tipo foram também lançados pela ADDLAP, em S. Pedro do Sul, e a ADREPES, na área de Palmela-Sesimbra. Em S. Pedro do Sul, a COOPRAÍZES disponibiliza cabazes de produtos hortícolas e frutas provenientes de pequenos agricultores do concelho, resultantes do modo de produção biológico, de protecção integrada

1. O RURAL: ESTRATÉGIA E PROGRAMAS DE DESENVOLVIMENTO ―Wisconsin Homegrown Lunch‖; ―Food for Thought Festival‖; ―Southern Wisconsin Farm

Fresh Atlas‖; e ―Buy Fresh, Buy Local Southern Wisconsin‖.

Ainda em Madison, pode ser referida a organização ―Friends of the Dane County Farmers‘ Market‖, que congrega amigos do maior mercado local, organiza trabalho voluntário no próprio mercado e promove actividades educativas, provas de produtos e encontros com produtores (www.dcfm.org). No âmbito do modelo CSA, merece destaque a chamada ―Madison Area CSA Coalition‖ (www.macsac.org), criada há cerca de dez anos, que reúne outras organizações (REAP, ―Madison Environmental Group‖, etc.) e indivíduos que trabalham para apoiar as explorações agrícolas CSA, coordenar acções de educação e formação para agricultores e a comunidade, e gerir actividades de recolha de fundos que permitem subsidiar aderentes CSA com rendimentos limitados. Publica o boletim ―Just Eating‖.

2. Conclusão: um olhar sobre o caso português

Falámos, até agora, de um movimento gerado no contexto americano, com as suas especificidades, nomeadamente o longo percurso de domínio do complexo agro-industrial, da grande distribuição e das cadeias de ―fast food‖, promotor de crescentes problemas nas agriculturas, nos espaços rurais e na sociedade em geral. No que se refere à sociedade, registe- se o intenso debate sobre os estilos de vida, os hábitos alimentares, o consumo de alimentos super-processados e os seus efeitos na saúde, nomeadamente na crescente e bem visível obesidade entre a população dos EUA (Loureiro e Nayga, 2004). Por outro lado, convém ter presente que se trata de uma sociedade fortemente urbanizada, com fácil acesso aos mais diversos meios de comunicação, na qual existe uma forte tradição de organização voluntária dos cidadãos e em que uma larga fatia populacional tem significativo poder de compra.

Por cá, a história é outra. Se é verdade que a grande distribuição tem vindo a assumir uma importância crescente, que as cadeias de ―fast food‖ estão em quase todo o país (com mais peso nas áreas urbanas) e que os alimentos processados estão cada vez mais presentes na nossa dieta, também é verdade que muitos portugueses mantêm laços de relativa proximidade com as suas raízes rurais, que a culinária tradicional continua a ser influente e que a nossa dieta incorpora ainda muitos elementos das heranças atlântica e mediterrânica, como o consumo de pescado, de frutos e legumes frescos, de pão e de azeite. Porém, as iniciativas de resistência ao sistema alimentar global também existem, visando, nomeadamente, defender a pequena agricultura, manter ou reconstruir sistemas alimentares de proximidade e promover as ligações entre produtores e consumidores.

Um exemplo é o projecto ―Relações de Cidadania entre Produtores e Consumidores‖ (ReCíProCo), dinamizado pela Organização Cooperativa para o Desenvolvimento Integrado do Concelho de Odemira (TAIPA), cujos objectivos são claros: integrar a agricultura nas estratégias de desenvolvimento local; gerar novas ligações entre rural e urbano; valorizar uma agricultura de proximidade e a manutenção de pequenas quintas agrícolas; criar parcerias entre produtores e consumidores, permitindo o acesso dos consumidores a produtos locais frescos; sensibilizar para o consumo dos produtos frescos locais de qualidade; e criar nos grupos LEADER competências para desenvolver acções inovadoras nestas áreas (Thirion, 2006: 8; www.taipa-desenvolvimento.pt).

Entre as acções do ReCíProCo estão a criação de grupos de consumidores e a distribuição de cabazes, numa lógica em tudo semelhante à ―Community Supported Agriculture‖ (CSA). Projectos do mesmo tipo foram também lançados pela ADDLAP, em S. Pedro do Sul, e a ADREPES, na área de Palmela-Sesimbra. Em S. Pedro do Sul, a COOPRAÍZES disponibiliza cabazes de produtos hortícolas e frutas provenientes de pequenos agricultores do concelho, resultantes do modo de produção biológico, de protecção integrada

ou de sistemas de produção tradicionais (www.coop-terrasdespedrodosul.com). Nas áreas da Península de Setúbal, Alentejo Central e Vale do Sousa, uma pareceria EQUAL promove o projecto PROVE (www.prove.com.pt), que é responsável pela venda de mais de uma centena de cabazes por semana.

Os produtores de agricultura biológica tendem a estar ligados a estas iniciativas e projectos, que se articulam com os seus objectivos de produção sustentável e de contribuição para a saúde do ambiente e dos consumidores e para o desenvolvimento local. Os esquemas de CSA, por exemplo, aproximam-se muito da venda de ―cabazes bio‖, implementada por produtores um pouco por todo o país. A articulação entre produtores e mercearias, lojas da especialidade e restaurantes tem também vindo a aumentar, havendo um crescente interesse de Chefes de renome pelo uso de matéria primas de alta qualidade, com origem em contextos de proximidade (G. Soares, Comunicação pessoal, 22 de Abril de 2009).

O que parece faltar no nosso contexto é a trama de organizações, do nível nacional ao local, envolvendo cidadãos activos, técnicos, investigadores, educadores, produtores e consumidores, que constitui o motor do movimento que se observa na sociedade americana, aqui exemplificado com o caso do ―Midwest‖ ou, mais precisamente, do estado de Wisconsin. Quem se tem mobilizado para esta causa em Portugal? E quem mais poderá ser mobilizado? Que papel têm assumido as ―velhas‖ Cooperativas Agrícolas? E os Grupos LEADER e demais Associações de Desenvolvimento Local? O que dizem as Associações de Produtores Biológicos e as organizações de defesa do consumidor? E as organizações de nível nacional, como a Federação ―Minha Terra‖ ou a Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Local? Que esforços tem feito neste campo a Confederação Nacional de Agricultura, organização que se afirma defensora da pequena agricultura? E as autarquias locais?

É sabido que existem projectos dispersos, com promotores de diferentes tipos, envolvendo acções muito distintas. Será que constituem um movimento? Será que apresentam motivações similares? Será que assentam num quadro conceptual reflectido e coerente? Falta, seguramente, fazer um mapeamento tão completo quanto possível destes projectos, muitos dos quais realizados no quadro de Iniciativas Comunitárias como o LEADER ou o EQUAL, ou integrados nos Programas Operacionais das diferentes regiões do país, na maior parte dos casos envolvendo parcerias locais ou regionais. É importante conhecer as suas abordagens e os seus resultados, ou seja, estudá-los. Falta, igualmente, pô-los em contacto, fomentando a troca de experiências e o conhecimento dos factores de sucesso e fracasso. Falta, muito claramente, dar-lhes mais visibilidade na sociedade e trabalhar no sentido de criar uma trama institucional que dê forma, coesão e sustentabilidade ao conjunto das experiências.

Voltando ao caso americano, mas não esquecendo o português, será o movimento ―Buy Fresh, Buy Local‖, com toda a sua diversidade, capaz de ameaçar as agro-indústrias, a grande distribuição e as cadeias de ―fast food‖? Ou irão estes, com todo o seu poder e influência na política e cultura americanas, fazer deste movimento um conjunto de ―ilhas‖ dispersas num vasto território, uma moda passageira e um capricho de franjas mais educadas e ricas da sociedade, amantes de uma alimentação mais cuidada?

Trata-se, seguramente, de matéria que continuará a mobilizar a atenção e o esforço dos académicos ligados às várias disciplinas que integram os chamados Estudos Rurais, nos EUA, na Europa e na Península Ibérica. Prova disso é a criação recente do Grupo de Investigação Europeu de Sistemas Alimentares Localizados (ERG SYAL), envolvendo 21 Universidades Europeias (http://gis-syal.agropolis.fr/).

Referências Bibliográficas

Abler, E. (2008). REAP: Harvesting Wisconsin‘s Agricultural Promise. Madison Originals

Magazine 13: 10-13.

Adam, K. L. (2006). Community Supported Agriculture. ATTRA, National Agriculture Information Service.

Enshayan, K. (2004). Local food, local security. Renewable Agriculture and Food Systems 19 (1): 2-3.

Feenstra, G. (2002). Creating Space for Sustainable Food Systems: Lessons from the Field.

Agriculture and Human Values 19: 99-106.

Hultine, S. A., L. Cooperband, M. Curry e S. Gasteyer (2007). Linking Small Farms to Rural Communities with Local Food: A Case Study of the Local Food Project in Fairbury, Illinois. Community Development 38 (3): 61-76.

Kloppenburg, J, J. Hendrickson e W. Stenvenson (1996). Coming in to the Foodshed.

Agriculture and Human Values 13 (3): 33-42.

Kolodinsky, J. M. e L. L. Pelch (1997). Factors Influencing the Decision to Join a CSA.

Journal of Sustainable Agriculture 10 (2-3): 129-141.

Loureiro, M. e R. Nayga Jr. (2004). Economics, Policy and Obesity. Choices Fall 2004: 33- Lyson, T. (2004). Civic Agriculture: Reconnecting Farm, Food, and Community. Medford, MA:

Tufts University Press.

Lyson, T. (nd). Local Solutions to Economic Globalization: Remaking the Agricultural and Food

System in the Northeast. Belchertown, MA: NESAWG.

Lyson, T. (2000). Moving Toward Civic Agriculture. Choices 15 (3): 42-45.

Ostrom, M. (2006). Everyday Meanings of ―Local Food‖: Views from Home and Field.

Community Development 37 (1): 65-78.

Ross, N. J. (2006). How Civic is it? Success stories in locally focused agriculture in Maine.

Renewable Agriculture and Food Systems 21 (2): 114-123.

Stephenson, G e L. Lev (2004). Commom Support for Local Agriculture in Two Contrasting Oregon Communities. Renewable Agriculture and Food Systems 19 (4): 210-217. Thirion, S. (2006). RECIPROCO, Relações de Cidadania entre Produtores e Consumidores.

Pessoas e Lugares 40: 8.

Zepeda, L. e J. Li (2006). Who Buys Local Food? Journal of Food Distribution Research 37 (3): 1- 11.

Van der Ploeg, J. D., H. Renting, G. Brunori, K, Knickel, J. Mannion, T. Marsden, K. de Roest, E. Sevilla Guzmán, e F. Ventura (2000). Rural Development: From Practices and Policies Towards Theory. Sociologia Ruralis 40 (4): 391-408.

Zepeda, L. e C. Leviten-Reid (2004). Consumers‘ Views on Local Food. Journal of Food

Distribution Research 35 (3): 1-6.

Páginas da Internet Consultadas entre 5 de Maio e 9 de Setembro de 2008 (por ordem de referência no texto)

www.foodroutes.org www.usda.gov www.dcfm.org www.westsidecommunitymarket.org www.consumer1stgroup.com www.macsac.org/rebates www.localharvest.org www.reapfoodgroup.org www.foodroutes.org/bfbl-chapters.jsp www.foodroutes.org/faq11.jsp www.macsac.org www.taipa-desenvolvimento.pt www.coop-terrasdespedrodosul.com www.prove.com.pt http://gis-syal.agropolis.fr/

Referências Bibliográficas

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Pessoas e Lugares 40: 8.

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Distribution Research 35 (3): 1-6.

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www.foodroutes.org www.usda.gov www.dcfm.org www.westsidecommunitymarket.org www.consumer1stgroup.com www.macsac.org/rebates www.localharvest.org www.reapfoodgroup.org www.foodroutes.org/bfbl-chapters.jsp www.foodroutes.org/faq11.jsp www.macsac.org www.taipa-desenvolvimento.pt www.coop-terrasdespedrodosul.com www.prove.com.pt http://gis-syal.agropolis.fr/

Territorio y Universidad: simbiosis necesaria