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Na introdução desse estudo, dissertou-se sobre a importância do conhecimento científico para que se pudesse atravessar esse difícil momento da história do País. Após o vencimento da acachapante barreira dos 300.000 (trezentos mil) mortos por Covid-19 no Brasil, nunca a ciência representou uma saída tão clara e evidente para a tenebrosa situação em que nos encontramos.

O presente trabalho buscou representar importante esforço para garantir segurança jurídica em relação aos possíveis EAPVs decorrentes da imunização da população brasileira contra a Covid-19, dado o receio e a desconfiança crescentes em torno da aplicação de vacinas que foram produzidas tão velozmente. Para fazê-lo, a pesquisa foi realizada de maneira ordenada, apresentando parte por parte os argumentos legislativos, doutrinários e jurisprudenciais que levaram às conclusões apresentadas no derradeiro capítulo.

Em relação às ilações a serem apresentadas, será realizada a divisão, da mesmíssima forma com que tratamos todos os assuntos abordados durante a extensão do trabalho, em duas partes: primeiro, em relação à responsabilidade civil do Estado, e, depois, em relação à responsabilidade civil dos fornecedores, baseada no Código de Defesa do Consumidor.

Ao estudarmos a responsabilidade civil da Administração Pública, verificamos que possui base legal na Constituição Federal, mais precisamente no artigo 37, § 6º, da Carta Magna, e que possui caráter objetivo baseado na teoria do risco administrativo. Ainda, aferimos que para que se tenha seu afastamento, deverá ser rompido o nexo de causalidade entre a ação ou omissão do Estado e o dano provocado.

Mais importante: que para o surgimento do dever de indenizar da Administração, é irrelevante a licitude do ato, sendo perfeitamente possível a chamada responsabilidade civil do Estado por atos lícitos. O tema do trabalho se insere justamente nessa matéria, tendo em vista que a campanha de vacinação baseada no PNI é política pública não só lícita, mas desejada, com o objetivo de proteger a população de determinada doença.

Seguimos com a análise pormenorizada da jurisprudência em relação ao assunto, verificando que os tribunais consultados possuem decisões responsabilizando o Estado pelos danos causados pelos efeitos colaterais de vacinas aplicadas em campanhas públicas e pelo SUS, utilizando a mesma argumentação trazida por esse trabalho. Foi possível perceber que a ratio decidendi dos julgadores se baseia fortemente nos laudos médicos colacionados para estabelecer e comprovar o nexo de causalidade entre a vacinação e o dano percebido, ferramenta crucial para a condenação do Estado.

Apuramos que, tendo a Administração Pública determinado a obrigatoriedade da vacinação e realizada campanha ativa para que os administrados se vacinem, não pode se eximir do dever de indenizar aqueles que padecerem de efeitos colaterais graves em decorrência do imunizante, muito porque não pode ser admitido que um indivíduo suporte encargos maiores do que o restante da sociedade em nome do bem público, sendo necessário que o Estado o indenize.

Averiguamos, portanto, que salvo o rompimento do nexo de causalidade, o Estado sempre terá o dever de indenizar pelos danos causados pela atividade administrativa, sejam seus atos lícitos ou ilícitos, pois é responsável pela campanha de vacinação e pelos imunizantes que compra de fabricantes privados e disponibiliza à população.

Por fim, levantamos a questão acerca da judicialização ser ou não a melhor forma para reestabelecimento do status quo ante do administrado em caso de EAPV. Ora, se o Estado já possui plano para monitoramento prévio de eventuais efeitos adversos em casos de campanha de vacinação pública, poderia também preparar mecanismo administrativo, mais célere que um processo judicial que levará o prejudicado à longa fila dos precatórios, para reparar o indivíduo. Passando agora à segunda parte dessas conclusões, em relação aos fornecedores, dividimos a análise entre os casos em que os efeitos colaterais ou contraindicações já são ou deveriam ser conhecidos à época da disponibilização da vacina e os casos em que os efeitos adversos não podem ser previstos em virtude do estado da arte técnico-científico do momento. No que diz respeito aos EAPVs ou contraindicações conhecidas ou que deveriam ser conhecidas, adentramos na disciplina do dever de informação atribuído ao fornecedor, que deve sempre prestar informações claras e adequadas acerca de seus produtos. No caso em exame, quando tratamos de medicamentos (categoria na qual está inserida a vacina), o dever de informar é qualificado, conforme artigo 9º do CDC, devendo o produtor informar os consumidores, de maneira ostensiva e adequada, a respeito da nocividade ou periculosidade do produto.

Tendo cumprido o dever a ele atribuído, não haverá que se falar em responsabilização, pelo que se entende que não há defeito no produto, tendo em vista que correspondia às legítimas expectativas do consumidor, que foi instruído em relação aos possíveis riscos e contraindicações do medicamento ou vacina em questão.

Todavia, o dever de informar deve ser pormenorizado, pois adequado, de forma que seria incabível a simples afirmação de que determinada vacina contra a Covid-19 é nova e, portanto, não se saberia quais os riscos que ela poderia acarretar à saúde do consumidor. Para

que se cumpra o ônus atribuído ao fornecedor, ele deve repassar a informação clara, de maneira que o cidadão possa tomar decisão com base em seu consentimento informado.

Concluímos que a produção da vacina, seja ela acelerada ou demorada, é de responsabilidade dos fabricantes, possuindo o dever de realizar todos os testes necessários e certificar que o produto não causará danos aos consumidores no momento em que o colocar em circulação. Não há que se cogitar a possibilidade de permitir que os laboratórios reputem pronta para consumo uma vacina que não sabem se pode ou não produzir danos graves à saúde – tal hipótese não é admitida pelo direito do consumidor brasileiro.

Finalmente, apreciamos a hipótese dos riscos do desenvolvimento como eventual excludente de responsabilidade civil em relação aos fabricantes, tendo em vista que, se não tivessem condições de saber acerca de determinada contraindicação ou efeito colateral, não poderiam informar os consumidores. Essa tese foi afastada por esse estudo, sendo apurado com base na jurisprudência recente do STJ e na doutrina majoritária que o produto não deixa de apresentar defeito porque a falha não podia ser averiguada à época da colocação do imunizante no mercado. Em verdade, o defeito sempre esteve presente, posto que há desde o princípio desconformidade em relação à legítima expectativa dos consumidores, sendo inafastável a responsabilização nesses casos.

O presente estudo teve por objetivo principal a análise detalhada das hipóteses de responsabilização do Estado e dos fornecedores por danos causados pelos potenciais efeitos adversos da vacina contra a Covid-19, buscando contribuir com o esclarecimento do cenário jurídico relacionado ao tema e, principalmente, com a segurança jurídica dos indivíduos frente à imunização que está em curso no Brasil.

Felizmente, foi possível traçar importantes conclusões que poderão ser utilizadas pelos juristas em atuação no futuro próximo em caso de surgimento de EAPVs originados pelas vacinas contra a Covid-19, sejam elas produzidas pelo Sinovac, pela Oxford, pela Pfeizer ou por qualquer outro fabricante. No cenário atual, não há espaço para temor em relação aos imunizantes pela incerteza sobre eventual direito à reparação, servindo esse estudo justamente para arrefecer tais ânimos.

Ressalta-se: não existe caminho mais seguro e célere para o término da crise de saúde pública e a retomada da atividade econômica do que a vacinação. Foi a imunização que erradicou alguns dos piores males que já assombraram a população brasileira, como a varíola e a poliomielite, e é através dela que devemos buscar o fim da pandemia de Covid-19.