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O estudo das trajetórias, das práticas das famílias produtoras de cacau orgânico, possibilitou analisar como os mercados orgânicos e de alta qualidade ressaltaram a isenção de insumos químicos pelas famílias, ou possibilitaram a percepção da necessidade de mudanças para formas alternativas de fazer agricultura.

As lógicas externas tiveram um papel nas trajetórias destas famílias desde a implantação do cultivo. As lavouras financiadas e com assistência técnica incentivaram o uso de insumos externos e o beneficiamento da amêndoa com fermentação em coxo. Nas lavouras autofinanciadas as influências foram da assistência técnica aliada às informações trocadas entre as famílias, possibilitando diversas formas de implantação, com ou sem insumos químicos, e beneficiamentos, com fermentações em coxo, lona ou folha de bananeira.

O decréscimo do preço da amêndoa e a baixa exigência do mercado local quanto à qualidade da amêndoa, fez com que as famílias optassem por reduzir ou isentar insumos externos, e minimizar os tratos culturais da lavoura e etapas de beneficiamento da amêndoa.

Esta conjuntura propicia a entrada das famílias nas cooperativas orgânicas para atender ao mercado orgânico e de alta qualidade, comprovando a primeira hipótese proposta no trabalho de que as exigências de mercado têm provocado mudanças nas práticas das famílias. Evidencia-se isto, por causa da adição de novas práticas com a certificação orgânica, além da isenção de insumos químicos, a construção de coxos, barcaças e estufas, novas etapas de beneficiamento da amêndoa de cacau, como seleção do fruto e amêndoa, e fermentação com controle de qualidade, além de aspetos administrativos, como registro das atividades, cuidados com os dejetos sólidos, e respeitos a Legislação Brasileira de Agricultura Orgânica (Lei 10.831/03), Legislação da Comunidade Europeia (834/07 e 889/08), Legislação dos Estados Unidos (NOP), e Mercado Justo “Fair for life”(FLO), entre outros.

Contudo, a maneira como estas lógicas externas afetam as práticas das famílias são diferentes, porque 80% (36 famílias) adequaram-se à produção orgânica por não utilizar insumos químicos, e 68,88% (31 famílias) adequaram o beneficiamento para ACOAQ.

As decisões referentes às adições dessas práticas não são baseadas apenas na etapa de fermentação, como dito na segunda hipótese do trabalho de que dentre as etapas de produção da amêndoa de cacau orgânico de alta qualidade a prática da fermentação é a que determinará o seu processamento ou não. A fermentação não é o fator determinante para a produção da ACOAQ, e está hipótese não responde a todos os elementos para adoção ou não de uma prática.

As famílias percebem na adição ou não de novas práticas todos os elementos do seu sistema, como mão de obra para as atividades, necessidade financeira, estrutura (coxo e estufa/barcaça) e conhecimento prático do processo de beneficiamento da amêndoa, por isso as famílias não modificaram suas práticas da mesma forma.

O estudo das trajetórias das famílias possibilitou a compreensão das razões para as atuais práticas das famílias inseridas nestes mercados, ao agrupá-las em 4 (quatro) grupos a partir da caracterização das práticas da lavoura de cacau orgânico.

O primeiro grupo, “produção estabilizada da ACOAQ”, destaca-se pela produção da ACOAQ e manutenção da fertilidade com adubos orgânicos por conta da disponibilidade de mão de obra e através da programação da colheita. A similaridade com as adequações propostas pelas cooperativas foi propiciada pelo conhecimento do beneficiamento e a busca por formar alternativas de cultivo.

No segundo grupo, “instáveis na produção da ACOAQ”, as famílias se caracterizam pela produção preferencialmente de ACC, sendo a maioria sem práticas de manutenção da fertilidade do meio. A instabilidade desde grupo é provocada devido à dificuldade de

contratação de mão de obra para as atividades e às necessidades financeiras para custeio das atividades propostas pelas cooperativas orgânicas.

Para o terceiro grupo, “passando por dificuldades na produção ACOAQ”, as famílias inicialmente produziram ACOAQ simultaneamente com a ACC, mas minimizaram as práticas do beneficiamento da amêndoa, passando a produzir apenas a ACC. As razões estão associadas às necessidades financeiras imediatas por conta de outros compromissos acordados.

O quarto grupo, “necessário de adequações para produzir ACOAQ”, destaca-se pela dificuldade de obter mão de obra e pela necessidade do dinheiro imediato da venda da ACC, sendo dividido em três subgrupos.

No primeiro subgrupo não houve adequações após a entrada nas cooperativas orgânicas, são famílias que nunca utilizaram insumos químicos, mas não modificaram as práticas de beneficiamento para ACOAQ e não realizaram adubações orgânicas, realizando apenas a manutenção da isenção de insumos.

O segundo subgrupo, “em dificuldades nas práticas orgânicas e produção da ACOAQ”, são famílias que se adequaram às práticas das cooperativas orgânicas quanto ao beneficiamento da ACOAQ, porém o cacau perdeu importância devido a fatores como a baixa produtividade, o preço da ACOAQ e atraso no seu pagamento. Assim, as famílias adequaram suas práticas de fertilidade com uso de adubos químicos, possibilitado por projetos de assistência técnica, ou utilizaram herbicidas, devido à dificuldade de obtenção de mão de obra para as práticas orgânicas.

No terceiro subgrupo estão as famílias recentes na cooperativa que se encontram no período de conversão. Logo, ainda estão em fase de adaptação de práticas, impossibilitando o entendimento em termos de tendência de como seus sistemas serão influenciados pelas cooperativas orgânicas.

A compreensão das práticas atuais e trajetórias evidenciam para as cooperativas as limitações das práticas propostas e sugere a possibilidade de adoção de adequações de acordo com as necessidades das famílias cooperadas, como o fortalecimento do mercado de ACC e melhoria do fluxo financeiro para pagamento imediato das famílias. A pesquisa demonstra as práticas em sua totalidade, ao observar como cada família e cooperativas contribuem para as atividades realizadas e demonstra as práticas realizadas por grupos atualmente estáveis para os instáveis, gerando elementos para troca de informação entre as famílias e planejamento e gestão das cooperativas.