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Vivemos numa sociedade urbana, que mudou muito e continua a mudar (ASCHER: 2008).

As estruturas demográficas e económicas assistiram a profundas transformações e continuam em processo de alteração, gerando maior complexidade na sociedade e tornando mais difícil a democracia. Por isso de impõe, outras formas de governabilidade, capazes de construir consensos face a multi-interesses, multi-objetivos, multi-atores, e modos de vida diferenciados, exigindo ao planeamento territorial soluções adaptadas a contextos variados e incertos.

Os processos de planeamento nem sempre se têm revelado capazes de responder aos desafios que se colocam no território. Até agora a maior atenção tem sido colocada na elaboração do plano, mas as dificuldades multiplicam-se no longo período em que ocorre a sua implementação. Com frequência o plano torna-se obsoleto precocemente e deixa de ser o referencial para as solicitações de mudança que vão ocorrendo no território.

Atualmente o país dispõe de um quadro legislativo completo: Programa Nacional de Política de Ordenamento do Território, Lei de Bases da Politica de Ordenamento do Território e Urbanismo, Planos e Programas Setoriais, Estratégias Nacionais, Planos Especiais de Ordenamento do território, Planos Regionais de Ordenamento do Território e Planos Municipais de Ordenamento do Território (BACHAREL, 2007/2008). Tal como a autora refere, não há futuro sem um território adequadamente ordenado, consequentemente planeado e responsavelmente gerido. Decorrida meia década, desde aquela afirmação, os progressos alcançados para a máquina burocrática do planeamento revelam-se ainda incipientes.

É portanto necessário, uma consciencialização global dos desafios atuais, que promova o envolvimento de todos os intervenientes, com novas formas de atuação que reforcem positivamente o planeamento e a gestão do território: estes pressupostos só serão alcançáveis com alterações profundas no paradigma até agora presente, nomeadamente:

 Da sobreposição da visão setorial à visão territorial do ordenamento, por forma a integrar e articular a pulverização setorial em consonância com o ordenamento do território;

 Do desconcerto da governação para novos modelos de governança mais colaborativos, transparentes e participados, envolvendo todos os actores do território, e assegurando maior coordenação e articulação horizontal e vertical dentro do aparelho administrativo

 Da falta de articulação dos múltiplos planos existentes, concorrendo para o desordenamento do território, para o ordenamento do território e articulação bem definida entre planos;

 De uma abordagem meramente normativa para uma dimensão mais estratégica e programática do PDM, mais flexível, recorrendo a novas formas de organizar e gerir os interesses e as oportunidades;

 De uma gestão reativa às iniciativas privadas para uma gestão proativa, inteligente, ágil e organizada nas suas relações institucionais, serviços e circuitos, regida pela equidade, transparência e defensora do interesse coletivo na organização do território.

A presente dissertação, aborda a atual situação do concelho de Vila Real de Santo António, da qual apuramos a existência de um modelo urbano extensivo ativo, confrontado com tecidos consolidados antigos que revelam sinais graves de abandono e degradação, que tendem a acentuar-se. As intervenções efetuadas neste contexto pela autarquia apuramos a sua exígua dimensão e os escassos efeitos polarizadores, incapazes de garantir a multiplicação desses atos com efeitos positivos na requalificação dos tecidos urbanos consolidados. A tendência de ocupação urbana das últimas décadas acentuou desequilíbrios entre a 1ª e a 2ª residência, a favor da última, provocando efeitos de segregação sobre a população local, e estimulando a especulação imobiliária. A par, a construção a custos controlados promovida pela autarquia recentemente, não é atribuída em tempo útil, permanece encerrada, ficando famílias sem acesso digno à habitação. O direito à habitação aparece comprometido e atinge vários segmentos da população. ~

No plano ambiental, as áreas naturais com estatuto de proteção legal têm sido subvalorizadas, encaradas como limite à expansão urbana. A própria estrutura verde, relevante para o equilíbrio do modelo estrutural do território concelhio, tem sido

encontra em funcionamento. A localização geográfica do concelho, privilegiada no estuário do Guadiana, também envolve riscos, não podendo ser descurada a delimitação de zonas de risco e desenvolvidas medidas de mitigação em caso de ocorrência de fenómenos naturais, resultantes das alterações climáticas.

No campo socioeconómico, o concelho está demasiado dependente do setor do turismo de sol e praia, por vezes pouco qualificado, sendo necessário diversificar a base económica para garantir maior resiliência perante conjunturas internas e externas que penalizem o fluxo turístico e, por arrastamento, a economia local.

Perante a situação atual é preciso reunir sinergias para uma Mudança de Paradigma nos vários campos de atuação:

No campo urbanístico, a revisão do PDM parece insistir em tendências expansionistas, ainda que através de uma expansão programada, pelo que importa:

 Apostar na regeneração urbana das zonas obsoletas, requalificação dos tecidos urbanos e reabilitação quer do edificado quer do espaço público, desenvolvendo mecanismos que produzam efeitos polarizadores e que fomentem esta prática desde a administração às iniciativas privadas;

 Promover um equilíbrio entre a 1ª e 2ª residência através de políticas públicas urbanas que esbatam essas assimetrias;

 Criar espaços físicos atrativos que ofereçam qualidade atendendo às necessidades atuais do concelho;

 Marcar a transição entre o limite urbano e espaço natural com áreas de qualidade dando uma nova imagem às frentes urbanas.

No campo ambiental:

 Promover a regeneração do meio ambiente, através do saneamento do rio, alcançável com um sistema de gestão de resíduos domésticos e industriais eficaz;

 Criar parques verdes de recreio e lazer, preservando o espaço natural;

 Preservar e valorizar os espaços naturais com e sem estatuto de proteção legal;  Atender a zonas de risco.

No campo socioeconómico:

 Diversificar a base económica do concelho, muito dependente do turismo, potenciando os recursos endógenos e infraestruturas existentes no concelho. No setor do turismo, é fundamental potenciar a náutica de recreio e virar a cidade para o rio. O complexo desportivo, como equipamento de reconhecimento nacional e internacional, também carece de uma gestão proativa que o dinamize e valorize os seus potenciais;

 Promover uma maior cultura de planeamento que inclua técnicos, decisores e actores locais, através dos vários modos de participação pública organizada mas sensibilizando a população para os desafios do território, esta é uma necessidade para adaptar a democracia às exigências da sociedade contemporânea;

 Encontrar um modelo territorial que potencie a continuação do desenvolvimento local num contexto socioeconómico cada vez mais diversificado e num mundo globalizado mas sem perder a identidade local.

O PDM, como instrumento de gestão territorial, deverá dar resposta aos problemas de ordenamento do território concelhio e definir as áreas prioritárias de intervenção, das quais se destacam a frente ribeirinha (antiga zona portuária e zona industrial), e estabelecer a respetiva programação. O processo de planeamento municipal e a sua gestão carecem de um sistema ativo e permanente que recorra a observações sistemáticas sobre os resultados que vão sendo obtidos como desenvolvimento de medida de controlo do próprio processo (avaliação e monitorização), capaz de incorporar as dinâmicas inesperadas não ponderadas no início do plano, permitindo a correção de trajetórias e a mitigação de efeitos nefastos por desajustamento das ações, disponibilizando a informação transparente e com qualidade, promovendo uma cultura de planeamento que inclua técnicos, decisores e população, dando lugar a uma nova governabilidade urbana. Dentro do aparelho administrativo, privilegiar a organização e coordenação horizontal e vertical, recorrendo a formas mais colaborativas, com uma liderança inteligente e integradora, promotora de coesão técnica das equipas, onde os valores da transparência e da equidade estejam presentes. A formação contínua e especializada das equipas técnicas tem de ser assumida como desígnio dentro do aparelho administrativo e uma das formas de o fazer será o envolvimento ativo na revisão do PDM, acompanhando o processo de elaboração até à sua implementação, evitando a perda de fio condutor.