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O objectivo deste trabalho foi averiguar de que modo a imagem corporal e o padrão alimentar dos adolescentes variam em função do sexo, da idade e do índice de massa corporal. Por haver uma lacuna no estudo destes assuntos em Portugal, decidimos procurar perceber como uma população de adolescentes, normais e obesos, vivenciava a sua aparência corporal e a sua alimentação.

Como mais-valias deste trabalho, destacamos a medição do peso e da estatura de cada jovem, em vez de medidas auto-reportadas, e o estudo da relação entre a alimentação e a imagem corporal em adolescentes, através desta metodologia.

Apontaríamos essencialmente três limitações ao trabalho: a não abordagem da actividade física, a não existência de uma questão sobre comportamento alimentar e o inquérito ter sido demasiado extenso. Embora possam parecer contraditórias, estas limitações podem e devem ser ultrapassadas em estudos posteriores.

Numa década, o padrão português alimentar mudou consideravelmente, passando de um tradicional, do sul da Europa, para uma dieta mais ocidentalizada, rica em proteínas (Marques-Vidal et al., 2006b). Sabemos que as escolhas alimentares podem exercer uma influência significativa na génese, manutenção e agravamento da pré-obesidade e da obesidade.

Os jovens de 17 a 19 anos com pré-obesidade e obesidade apresentam, por um lado, um padrão de alimentação errado, com consumo de alimentos doces e fast-food e de álcool. De facto, o consumo mais elevado destes produtos pode constituir uma característica do seu comportamento alimentar, que deixa antever um potencial cenário de instalação e/ou agravamento da sobrecarga ponderal, caso não sofra correcção atempada. Importa destacar que os indivíduos com sobrecarga ponderal parecem estar despertos para a necessidade de ajustar alguns dos seus consumos alimentares à sua condição. Neste contexto, enquadra-se o maior consumo de “Bebidas saudáveis” e de “Diet”.

Desta forma, os dados apresentados podem mostrar-se importantes, pois indiciam que os adolescentes com pré-obesidade e da obesidade podem já ter consciência do papel que algumas opções dietéticas podem desempenhar no seu estado de saúde e deixam entender a existência de áreas onde intervir.

Não deixa de merecer destaque a presença de frequências de consumo mais elevadas de bolos e bolachas, refrigerantes (Dimensão “Fast-food”), na classe mais jovem, por se tratar de alimentos que sabemos estarem associados ao ganho ponderal, se o seu consumo for excessivo (Swinburn et al., 2004). Os adolescentes que não

apresentam sobrecarga ponderal podem ter um comportamento alimentar desadequado, ao contrário do que faria prever o seu peso, podendo estar em risco de manter e/ou evoluir para estados de malnutrição, quer por excesso, quer por carência nutricional.

Também os adolescentes com pré-obesidade e obesidade mostraram mais frequentemente insatisfação com a sua imagem corporal e sexualidade, e revelaram maior vulnerabilidade em relação à sua aparência. Os nossos resultados permitem concluir que, uma vez que a maioria dos adolescentes obesos vai continuar a ter obesidade na idade adulta (Serdula et al., 1993; Whitaker et al., 1997), a intervenção junto dos estudantes deve ser feita na pré-adolescência, por volta dos 13-14 anos. Parece ser crucial em termos de população alvo a atingir, através de programas de prevenção que incluam questões relacionadas com a promoção da saúde, incluindo a satisfação com o corpo, a socialização, o estilo de vida e alimentação.

Vale a pena recordar os dados de McCarthy e colaboradores, que verificaram não ser um grupo alimentar individual, mas sim uma combinação de grupos que se associavam com o excesso de adiposidade, tendo concluído que o IMC e o perímetro da cintura eram fortemente influenciados pela quantidade de alimentos consumida e que as intervenções, visando a redução do excesso ponderal, deveriam incidir na redução do consumo de alimentos e não especificamente nos macronutrientes (McCarthy et al., 2006). No mesmo sentido, a investigação em que trabalhadores de escritório comeram mais chocolates quando as tabletes eram colocadas em cima das secretárias e dentro de frascos transparentes, do que quando estes eram colocados em frascos opacos, mostrou que a simples visão do alimento pode estimular a pessoa a comer, bem como as quantidades ingeridas também se relacionam de forma directa com as quantidades disponíveis no prato, assim como com o número de pessoas à mesa (Cohen e Farley, 2008).

Uma criança norte-americana assiste em média a dez mil anúncios de alimentos na televisão a cada ano, sendo 90% deles sobre fast-food, refrigerantes ou gomas (Harris and Bargh, 2009). Para Bargh e Morsella, tal circunstância é indissociável do nível de consumo deste tipo de alimentos entre as crianças norte-americanas, atestando que, contrariamente ao que é afirmado pela indústria da publicidade, os anúncios não afectam apenas as escolhas dos consumidores, mas actuam efectivamente sobre os comportamentos alimentares (Bargh and Morsella, 2008). Para Cohen e Farley (2008), tal adquire relevância significativa no quadro da luta contra a epidemia da obesidade, porquanto deixa antever que as campanhas sobre nutrição e hábitos de vida saudáveis não conseguem contrariar o automatismo dos comportamentos alimentares e, por esse motivo, estão condenadas ao fracasso.

Assim, temos a necessidade de agir directamente sobre o ambiente, eventualmente através de regulamentos que definam as porções e o tipo de alimentos que podem ser consumidos. Existe a necessidade de regulamentação de publicidade na televisão, para certos produtos alimentares, e medidas que controlem a indústria alimentar que intensamente coloca no mercado não alimentos mas remédios. Devemos ainda procurar ensinar/esclarecer como podemos ser mais saudáveis e nos sentirmos bem connosco próprios, melhorando assim a qualidade de vida e o bem-estar das famílias e das crianças.

Pensamos ter conseguido dar o nosso contributo na luta conta a obesidade, fazendo ver as dificuldades que os nossos jovens com excesso de peso sentem no dia-a- dia e, por outro lado, realçando o que nos falta, enquanto sociedade, para podermos estar à altura deles.

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