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Esta pesquisa aponta para a caracterização de dois grupos de sujeitos (tradutores em formação), os quais podem ser localizados em pontos diferenciados do continuum novato- experto.

Após análise das três fases deste estudo longitudinal e o levantamento do perfil de cada um dos cinco sujeitos, constatamos que não é possível estabelecer uma relação clara entre os dois patamares nos quais os sujeitos desta pesquisa se inserem e os dados obtidos através de questionário (Tabela 2), no início da pesquisa, relativos a formação acadêmica, experiência e hábitos.

Quando observamos a produção textual focalizando os complexos oracionais, entretanto, constatamos aspectos claramente diferenciados e pontos comuns entre os grupos. Quantitativamente, os sujeitos que mais verbalizam sobre suas dificuldades e conseqüentemente são cientes de problemas são S1 (5 vezes), S2 e S3 (4 vezes cada um). S4 problematiza os complexos oracionais apenas em uma ocasião, enquanto S5 não citou dificuldades relacionadas a esse aspecto. Considerando o número total de pausas e complexos analisados, como pôde ser observado, apesar de suscitarem pausas quando da sua tradução, os complexos oracionais foram pouco mencionados nos relatos retrospectivos, os quais focalizaram escolhas de itens lexicais, prioritariamente. Foram selecionadas 17 unidades de análise com base nos textos originais, sendo que, no total, houve apenas 14 verbalizações sobre complexos oracionais nos TAPs ao todo, considerandoos 5 sujeitos.

Se buscarmos padrões para os perfis dos sujeitos, podemos apontar que o grupo no patamar intermediário possui tempo de revisão relativamente longo e apresenta menos problemas ao executar as tarefas. Os sujeitos possuem estratégias de busca variadas, que incluem consulta a corpora eletrônicos e fazem buscas a grupos nominais inteiros, aumentando a contextualização de seus resultados. O grupo no patamar inicial, por outro lado,

apresenta como padrão apenas o fato de possuírem o dicionário como fonte principal (S4) ou exclusiva (S5) de busca. Além disso, a maioria de suas buscas é feita a itens isolados, não obtendo resultados contextualizados. Como foi apontado, um deles (S4) possui tempos de revisão relativamente longos, sendo que o outro (S5) despende pouco tempo na fase de revisão.

Observando o impacto da familiarização dos sujeitos com os instrumentos de coleta, descobrimos que houve um aumento no número de verbalizações, sobretudo no grupo intermediário, quando comparamos a primeira com a terceira fase do estudo. Na primeira tarefa apenas os sujeitos S1, S2 e S3 falaram sobre os complexos oracionais, uma vez cada um. Na Tarefa 2, S1 e S2 mencionaram uma vez cada um. Já na Tarefa 3, S1 e S3 mencionaram, 3 vezes cada um, os complexos oracionais; S2 verbalizou 2 vezes e S4 apenas uma vez.

Se observarmos o desenvolvimento de cada sujeito no decorrer do estudo, constatamos que S1, desde a primeira tarefa, encontrava-se em um estágio intermediário do continuum novato-experto. As aulas de Tradução II causaram um impacto em seus níveis de metarreflexão (Relatos 7, 18, 26, 27 e 35), mas sem impacto na metalinguagem e sem grandes mudanças em seu produto tradutório. Em S2, os índices de metalinguagem e metarreflexão, uma fase de revisão longa e as altas taxas de recursividade aliadas a produtos textuais sem problemas de coesão fazem deste um sujeito que se encontra em um nível intermediário no continuum novato-experto. S3 parece estar em um patamar próximo ao de S1 e S2 no continuum; apresenta bons níveis de metalinguagem e metarreflexão e seus textos apresentam construções não problemáticas. Já os textos produzidos por S4 apresentam problemas, inclusive decorrentes de interpretações errôneas (‘quebra-cabeça ainda maior’, ‘conhecidos ironicamente como hormônios do amor’, como pôde ser visto na seção 3.2) do sujeito ao ler o texto, que constroem significados diferentes; o sujeito apresenta metalinguagem e

metarreflexão e diz que as aulas tiveram impacto sobre seu processo, mas a instrução formal de apenas seis meses parece não ter sido suficiente para este sujeito que se encontra em um estágio mais inicial do continuum novato-experto quando comparado a S1, S2 e S3. S5, assim como S4, parece estar nos estágios iniciais do continuum; entretanto, diferentemente de S4, S5 não possui metalinguagem e metarreflexão e não desenvolve a prática de revisão.

Quando perguntados sobre os conceitos vistos em aula que mais foram úteis quando da realização da tarefa, todos os sujeitos mencionaram ‘tipos textuais’, ‘gênero’ e ‘registro’. Também houve menções a ‘coesão’ e, em menor freqüência, a ‘intertextualidade’; entretanto, não houve menção explícita a outras unidades estudadas na disciplina, como ‘variação lingüística’ e ‘síntese de significados’. Também é importante salientar que, apesar de muito citado pelos sujeitos, o tipo textual não foi facilmente identificado nas tarefas. Alguns sujeitos não foram capazes de identificar o tipo de texto(Relato 30, de S4),perceber características de determinados tipos de texto e, além disso, não souberam fazer escolhas lexicais relacionadas ao tipo de texto (‘mamães rato’, de S4 e ‘tipos de comida’, de S5, por exemplo).

Quanto às fases do processo tradutório, apesar de alguns sujeitos apresentarem fase de orientação muito breve, de até 10 segundos (S2/T2) e até mesmo dizerem que não leram todo o texto (S5/T2), alguns sujeitos despenderam mais tempo nessa fase. É interessante observar que o sujeito que teve a fase de orientação mais breve é um dos sujeitos que se localiza em níveis intermediários do continuum novato-experto, apontando que o tempo desta fase não está tão diretamente ligado a bons níveis de desempenho. Em relação à fase de revisão, os dados são ainda mais divergentes. Com exceção de S5, todos os sujeitos dedicaram tempo significativo a essa fase. Sobre essa fase também podemos apontar que, apesar dos três sujeitos localizados em níveis intermediários do continuum possuírem perfil

semelhante na mesma, S4 também despende muito tempo na mesma fase e, entretanto, não é capaz de detectar problemas em seu texto e realizar as alterações necessárias.

No trabalho final da disciplina Tradução II, quando foram pedidos para revisar o texto desta primeira tarefa, S1 e S2, os sujeitos que informaram que o tempo para a revisão foi suficiente, realizaram poucas alterações. S1 corrigiu apenas duas referências coesivas que estavam ambíguas; e S2 resolveu um problema no título do texto, a tradução de ‘guide’, que havia omitido, e corrigiu alguns erros de digitação e a falta de acentuação. S3, o sujeito disse que gosta de se afastar do texto antes de revisá-lo, realizou poucas alterações e seu texto permaneceu com alguns problemas relacionados à usualidade de suas escolhas lexicais. S4, que disse precisar de uma revisão profunda, resolveu os problemas de ortografia, acentuação e a tradução de ‘seção de orgânicos’ para ‘produce department’, entretanto, a tradução ‘tabela’ para ‘pyramid’ persistiu. S5, que afirmou que seu texto estava pronto, podendo apenas ter melhoras ocasionais, solucionou os maiores problemas de sua primeira tradução (‘free meet’ e ‘perguntas que exijam uma preparação’), entretanto, seu texto permaneceu com vários erros de digitação e falta de acentuação.

Neste estudo, S1, S2 e S3, que encontram-se em níveis intermediários do continuum, em alguns momentos têm soluções muito boas para as dificuldades da tarefa, mas, em outros momentos, parecem não atentar para a existência do problema e, por não haver reflexão, as soluções automatizadas são problemáticas. S4 e S5, por sua vez, não problematizam o texto. S5 dedica pouco tempo às suas tarefas e seu baixo desempenho pode dever-se a esse fato. S4, entretanto, é o sujeito que despende mais tempo a quase todas as tarefas, mas parece não problematizar o texto, deixando de revisar muitas traduções problemáticas.

Em relação ao impacto deste trabalho no âmbito do LETRA, a pesquisa corrobora estudos já realizados, reafirmando a necessidade de se observar mais detalhadamente o perfil

de tradutores expertos para se obter dados adicionais aos já relatados. No que diz respeito ao aporte de análise de produção textual sob a perspectiva dos complexos oracionais que suscitam problemas na execução de tarefas, esta pesquisa revela a necessidade de se contar com descrições da língua portuguesa que possam embasar as análises, sobretudo em nível de registro. Isso nos permitiria fazer observações mais justificadas sobre as escolhas dos sujeitos, seja em nível lexical, seja em configurações de complexos oracionais.

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