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Os resultados dos estudos ora apresentados evidenciam que a mortalidade neonatal em Salvador reduziu, a partir dos anos de 1990, a velocidade de queda que vinha apresentando desde 1980, e particularmente entre 2000 e 2006, tendeu à estabilização. Este fato é bastante preocupante, pois os níveis desta mortalidade ainda estão em patamares elevados, se comparados com aqueles de áreas de maior desenvolvimento sócio- econômico, tanto em nível nacional quanto internacional. O predomínio de causas de mortes redutíveis por adequada atenção à gestação, ao parto e ao recém-nascido sugerem baixa resolutividade do sistema de saúde, fato que demanda imediata intervenção no sentido de reversão deste quadro.

Uma maior compreensão da dinâmica do processo que representa a mortalidade neonatal foi possível com o estudo da distribuição da mortalidade neonatal no espaço urbano do referido município, quando foram observadas diferenças marcantes, delineando um padrão espacial na qual as maiores taxas coincidiram com áreas pauperizadas, com maior concentração de população pobre, marcada pela precariedade populacional, pelas deficiências de infra-estrutura e de serviços básicos. O baixo peso ao nascer destacou-se como o mais importante fator explicativo deste padrão, o que é indicativo de também estar relacionado às condições de vida. Considerando que o baixo peso ao nascer pode advir da prematuridade, e sendo ambos fatores de riscos de alto potencial de evitabilidade, é imperativa maior ênfase à prevenção dessas condições adversas de nascimento, principalmente no pré-natal, através do diagnóstico e intervenção adequados. Por outro lado, salienta-se o fato de que esses dois fatores podem intermediar a ação de outros determinantes, como o nível sócio-econômico que tem reflexos nas condições de saúde da mulher podendo culminar em gestações e conceptos de alto risco.

Esta relação entre a mortalidade neonatal e condições de vida foi confirmada pelo gradiente linear e crescente do risco desta mortalidade do estrato de melhor para o de pior condição de vida, evidenciando a presença de desigualdade social. Todavia, destaca-se que quando da análise da evolução temporal em aglomerados menores, aquele onde as condições de vida eram intermediárias foi o único que apresentou decréscimo desta mortalidade com significância estatística. Este comportamento, aliado a reduzidíssima variação da tendência da mortalidade neonatal no estrato de elevada condições de vida, falam a favor de algum grau de redução da desigualdade social nesta mortalidade, de certa forma sugerindo um primeiro passo em direção de uma possível convergência. Por sua vez, a quase estagnação do risco desta mortalidade no período 2000-2006, no estrato de muito baixa condição de vida é inquietante, evidenciando que este aglomerado permanece não responsivo às ações vigentes de saúde, constituído por um grupo populacional de alta vulnerabilidade à morbimortalidade neonatal.

Nesse contexto, torna-se premente maior atenção dos gestores públicos à mortalidade neonatal já que com a tendência à estabilização em níveis elevados, a velocidade de redução da mortalidade infantil fica comprometida. As medidas básicas de saúde, utilizadas mais amplamente no Brasil a partir da década de 80 tiveram grande impacto sobre o óbito pós-neonatal, porém, no componente neonatal seus efeitos parecem ter sido limitados, exigindo novas intervenções, especialmente aquelas voltadas para a assistência no pré-natal e no nascimento, como maior capacitação dos profissionais de saúde e reestruturação dos serviços materno-infantis.

Os achados desses estudos sugerem ineficiência do sistema local de saúde para a reversão das altas taxas da mortalidade neonatal. Em função disto, há necessidade de ampliação da cobertura dos programas que atuam na prevenção dos óbitos neonatais, tais

como o “Programa de Humanização do Pré-Natal e Nascimento”, o “Programa de Aleitamento Materno”, o “Programa de Gravidez de Alto Risco” e a “Iniciativa Hospital Amigo da Criança”, além de maior visibilidade às informações produzidas pelas “Redes de Perinatologia” e pelos “Comitês de Prevenção do Óbito Materno e Infantil”, recentemente implantados. Esses programas, se implementados de forma mais efetiva, com especial atenção voltada à qualidade, tendem a ter impacto positivo na redução dos óbitos neonatais. No entanto, é imprescindível a integração de ações de outros setores cujas ações possam repercutir em melhorias nas condições de vida das populações, promovendo redução na desigualdade social.

Ressalta-se a necessidade de avanço nas investigações visando identificar fatores que possam explicar a tendência de estabilização da mortalidade neonatal neste espaço geográfico. Sugere-se aqui, o exame das principais causas de óbito neonatal em cada estrato de condições de vida, além do estudo da distribuição espacial dos recursos de saúde materno-infantis disponíveis, por estarem intimamente relacionados a esta mortalidade. Ademais, também se faz necessário investigar fatores explicativos da elevada magnitude do risco de morte no estrato populacional de intermediária condição de vida.

Os gestores de saúde envolvidos no planejamento de intervenções para redução dos óbitos neonatais deverão considerar os diferentes riscos desta mortalidade no espaço urbano, destinando maior atenção e recursos aos grupos prioritários, que possuem os riscos de maior magnitude. Desse modo, será possível alcançar equidade em saúde, que corresponde, conforme Vieira da Silva e Almeida Filho1 ao “reconhecimento da saúde como direito e à priorização das necessidades como categoria essencial para as formas de

1 Almeida Filho N, Vieira-da-Silva LM. Eqüidade em saúde: uma análise crítica de conceitos. Cad Saúde

justiça. Priorizar necessidades não significa impor necessidades, porém definir o padrão tecnicamente aceitável interagindo com as expectativas dos diversos modos de vida dos diferentes grupos sociais”.

ANEXO