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Parte III Trabalho de investigação

3.6 Conclusões

Com este trabalho de investigação pretendeu-se avaliar o padrão de sono de um pequeno grupo de crianças (n=20) em idade pré-escolar (3 anos), que fazem uma sesta diária no Jardim de Infância, cuja duração pode atingir as três horas. Deste modo, para a prossecução deste objetivo foram utilizados dois métodos distintos de recolha de dados: (1) um questionário aplicado aos pais sobre os hábitos de sono das crianças, e (2) observação de aspetos relativas à sesta diurna das crianças em contexto de Jardim de Infância. A avaliação dos hábitos de sono das crianças em contexto familiar incluiu características relacionadas com as rotinas do sono, a ritmicidade e a separação afetiva. A observação da sesta diurna realizada no Jardim de Infância incidiu em alguns aspetos comportamentais das crianças e do meio físico envolvente.

Uma vez que o sono em idade pré-escolar é fundamental para o desenvolvimento da criança a nível físico, emocional e intelectual, é de extrema importância que as crianças tenham hábitos que proporcionem uma duração e qualidade de sono adequados às suas necessidades.

É inequívoco que todas as crianças e também os adultos beneficiam da existência de rotinas relativas ao sono, como as que estão especificamente associadas à hora de deitar. Estas rotinas prendem-se com o que a criança faz antes de adormecer. São exemplos disso, o vestir o pijama, ler uma história, deitar e apagar a luz para dormir. Neste estudo verificou-se que 85% das crianças fazem sempre uma rotina na hora de ir para a cama, sendo que, mais de metade da amostra é colocada na cama por um dos pais. Também mais de metade da amostra nunca adormeceu antes de ser colocada na cama, sendo este o local em que 50% das crianças adormeceram três ou mais vezes na semana

61 em estudo. Verificou-se também que há crianças que têm dificuldades em adormecer sozinhas. De acordo com a literatura, o facto de algumas crianças não adormecerem sozinhas deve-se aos maus hábitos desenvolvidos pelas crianças, que frequentemente estão associados à incapacidade dos pais em lidar de forma adequada com a situação.

No que respeita à ritmicidade do sono, à partida, uma criança saudável que se deita sempre por volta da mesma hora, se levanta à mesma hora e que não tem despertares longos durante a noite, será uma criança bem disposta, com menos suscetibilidade para problemas no desenvolvimento físico, cognitivo e emocional. No presente estudo verificou-se que 85% das crianças conserva uma rotina da hora de ir para a cama e que 75% conserva também essa rotina na hora de levantar. Constatou-se também que a maioria das crianças (75%) faz uma sesta diária após o almoço, o que segundo os pediatras é recomendado se a criança assim o solicitar. Durante os dias que as crianças frequentam o Jardim de Infância, há um tempo específico para a realização da sesta, mais precisamente das doze às quinze horas, sendo que neste período todas as crianças têm de ir para o dormitório. De acordo com a literatura, as crianças a partir dos 6 meses são já capazes de dormir uma noite seguida. Neste estudo, porém, apenas 35% das crianças nunca acordam durante a noite. Das crianças que acordam frequentemente durante a noite, 65% normalmente nunca leva mais de trinta minutos a voltar a adormecer. Assim, poder-se-á presumir que a duração e qualidade de sono destas crianças não terá sido fortemente afetada na semana em estudo.

A separação afetiva diz respeito à dificuldade que muitas crianças têm em separar- se dos pais para dormirem, adotando muitas vezes comportamentos minimizadores do stresse que esta situação lhes provoca. Há crianças que usam um objeto de segurança, como por exemplo um boneco ou um cobertor, para minimizar esta perda temporária dos pais. Neste estudo, de acordo com a informação prestada pelos pais, constatou-se que 40% das crianças nunca usaram estes objetos, mas, no entanto, 35% das crianças usam- no três ou mais noites por semana. Segundo a AAP (2007), o uso deste objeto não é de maneira nenhuma prejudicial para as crianças, sendo até em certos casos benéfico, pois diminui o stresse da criança para dormir. Outro fator de stresse que está descrito para as crianças é o medo do escuro. Apesar de 80% das crianças participantes neste estudo

62 nunca ter revelado medo do escuro, de acordo com os pais, 35% mostrou necessidade de luz acesa enquanto dorme, três ou mais noites por semana.

Constatou-se ainda a interrupção do sono noturno em algumas crianças, que acordaram angustiadas por algum sonho ou temor, mas a percentagem foi reduzida (10%).

Sabe-se que existem pais que levam as crianças para a sua cama quando estas acordam durante a noite. Neste estudo, esta situação é referida por metade dos pais, com uma frequência variável na semana avaliada.

Pela análise dos resultados relativos ao contexto familiar, globalmente, pode concluir-se que a maioria das crianças participantes neste estudo apresenta uma rotina de sono adequada à sua idade, tendo como referência as recomendações preconizadas.

No que diz respeito ao período de sesta diurno realizado no Jardim de Infância, para o qual estão disponibilizadas três horas (das 12h às 15h), os resultados deste estudo mostraram diferenças importantes entre os ritmos de sono das crianças. Todas as crianças dormiram a sesta, cuja duração média foi de duas horas e quatro minutos, no entanto, houve crianças que dormiram apenas uma hora e outras que foi preciso acordá- las porque queriam continuar a dormir já depois do tempo limite da sesta. Assim, percebe-se que a dinâmica natural dos Jardins de Infância pode não ir totalmente ao encontro dos ritmos distintos de todas crianças.

É por volta dos três/quatro anos que muitas crianças começam a fazer um único sono noturno (monofásico). Assim, dependendo da duração desse sono, pode considerar- se que, para algumas crianças, a imposição da sesta pode ter implicações sobre o padrão de sono noturno. Segundo as recomendações preconizadas pela AAP (2001), WHO (2004) e SPP (2011) o máximo do tempo de sesta que deve ser dado às crianças é de duas horas. As crianças participantes neste estudo têm disponíveis diariamente três horas para dormir a sesta, sendo que algumas dormem durante todo este tempo.

Ainda de acordo com as orientações daAAP (2001), a sesta deve ser realizada em ambiente de luz natural, de modo a facilitar o seu reconhecimento como um complemento do sono noturno. Assim, haverá menor risco de interferências no ritmo circadiano do sono. Ora, ainda que algumas crianças durmam com alguma luminosidade,

63 no Jardim de Infância onde decorreu este estudo o ambiente proporcionado para a sesta é o mais escuro possível, o que contradiz as recomendações.

Ao longo da sesta, verificaram-se despertares por parte das crianças. Esta situação ocorreu em 45% das crianças, mas por motivos diferentes. A necessidade de ir à casa de banho foi a causa para a interrupção do sono da maioria das crianças (56%). Das restantes crianças, 11% acordaram devido à presença de tosse e 33% acordaram sem motivo aparente. A avaliação das interrupções do sono durante a sesta foi pertinente, pois sabe- se que muitas crianças têm o tempo de sono adequado, mas apresentam-se sempre sonolentas porque este não é de qualidade. Sabe-se que não só a duração do sono, mas também a sua qualidade, afeta o bem-estar da criança.

Para além da avaliação das variáveis pré-determinadas, foi ainda possível constatar que algumas crianças têm problemas de separação na hora de dormir e que por isso não conseguem adormecer sem um adulto estar por perto. Nenhuma criança recorre ao uso da chupeta, pois já interiorizaram que no Jardim de Infância não o podem fazer. No entanto, verificou-se que algumas crianças recorrem à ponta do cobertor ou ao dedo para chucharem até adormecer, fazendo do dedo ou do cobertor o seu objeto de transição. Constatou-se ainda que, durante a sesta, algumas crianças apresentaram ressonar primário e bruxismo do sono (ranger dos dentes), e ainda posições à primeira vista inadequadas, o que poderá afetar a qualidade de sono destas crianças. Esta última situação pode indicar também que a criança tem algum problema de saúde mais grave, como por exemplo, problemas respiratórios, o que a leva a colocar-se em determinadas posições, de modo a facilitar a respiração durante o sono.

Em suma, os resultados do presente estudo sugerem que, no geral, o padrão de sono das crianças em contexto familiar não apresenta grandes desvios em relação às recomendações internacionais. Porém, o mesmo não se poderá dizer em relação a alguns aspetos da sesta diurna que decorre no Jardim de Infância, com destaque para o tempo excessivo que lhe é disponibilizado e para a ausência de luz natural para todas as crianças. Como referido anteriormente, a qualidade do sono é imprescindível para a manutenção de uma vida salutar, sendo que os hábitos de sono desajustados têm múltiplas implicações negativas, como por exemplo, diminuição da motivação e concentração, falta

64 de memória, sonolência diurna, alterações de humor, queda da imunidade e maior risco de desenvolvimento de obesidade.

Partindo do pressuposto que quando nos referimos à primazia do interesse da criança, está implícito o seu desenvolvimento físico, intelectual e emocional, seria pertinente haver uma intervenção junto do Jardim de Infância, no sentido de melhorar algumas das suas práticas respeitantes à sesta das crianças.

Limitações do estudo

As limitações do presente estudo são inúmeras e muito importantes. Desde logo é uma amostra de conveniência que apresenta uma dimensão muito reduzida (n=20) e ausência de representatividade. Desta forma, a comparação com resultados de estudos publicados a nível nacional e internacional ficou comprometida. Para além disso, os estudos analisados que apresentavam algumas semelhanças com o que aqui se expõe, nomeadamente na faixa etária, tinham um caráter mais clínico dado que o foco era sobretudo dado aos distúrbios do sono. Este fato também limitou a tão importante comparação de dados e interpretação de resultados. Outra limitação do estudo relaciona- se com aspetos socioculturais, uma vez que as respostas dos pais podem ter sido dadas em função do que é mais aceitável socialmente, e não em função do que realmente acontece. A ausência de conhecimento da situação clínica das crianças, que pode ter consequências no seu padrão de sono, e do número de horas de sono noturno, constituem também limitações importantes a referir. Do ponto de vista metodológico seria interessante desenvolver um estudo com delineamento longitudinal, que permitisse avaliar a eficácia de uma intervenção sobre aspetos relativos à sesta diurna no Jardim de Infância.

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