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Na condução dessa pesquisa foram verificados alguns fatores complicadores de ordem acadêmica e de ordem operacional. Apesar do processo de cementação ser utilizado industrialmente há muitas décadas, verifica-se que não existem muitos trabalhos que analisem os efeitos de trincas nas camadas cementadas. Dos existentes, a maioria se refere ao comportamento de peças em fadiga ou na determinação do limite de resistência à fadiga de peças cementadas. E com relação à aplicação da tenacidade à fratura em camadas cementadas as pesquisas são bastante escassas. Além disso, não são comuns referências sobre propriedades mecânicas dos aços no estado temperado e revenido em temperaturas abaixo de 200 °C. Operacionalmente, foi verificada uma grande fragilidade dos materiais devido às condições impostas pelo tratamento térmico, que resultaram em dificuldades na obtenção de trincas com crescimento estável e propriedades de tração confiáveis. Estes fatos quase inviabilizaram a execução do trabalho. Esse inconveniente da fragilidade foi contornado através dos seguintes artifícios:

• Nos corpos de prova de tenacidade à fratura fez-se uma incisão com eletroerosão a fio nos entalhes pré-usinados para se ter um facilitador da nucleação da trinca de fadiga.

• Nos corpos de prova de tração fez-se polimento com lixa de modo a se obter acabamentos superficiais com rugosidades Rz = 10 e Rz = 3 µm.

Foi confirmado que a camada cementada é uma região de grande complexidade para ser estudada, devido aos gradientes de carbono, propriedades mecânicas, microestrutura e tensões

residuais que quando tem seus efeitos somados, dificultam a análise. Isto está de acordo com o relatado pelos autores citados no capítulo 2.

Assumiu-se que a partir do uso de amostras retiradas numa mesma família de aço com variação apenas do teor de carbono, seria possível simular o comportamento da tenacidade à fratura ao longo de uma camada cementada. Para a comprovação da hipótese, utilizou-se aços da família SAE 51xx, no caso em questão SAE 5115, 5140, 5160 e 52100 devido a falta do SAE 51100. Assumiu-se também variar apenas o teor de carbono de modo significativo, conforme justificado pelo fator de liga, morfologia dos carbonetos de cromo e de ferro, e pelo comportamento dos elementos de liga em função do potencial de carbono da atmosfera cementante. Constatou-se também que as durezas individuais dos corpos de prova, coincidem com a curva de dureza obtida após a cementação, têmpera e revenimento de pinhões do mesmo aço SAE 5115. Tal fato mostrou consistência na proposta de se fazer análises discretas para entender o comportamento contínuo ao longo da camada cementada, no que diz respeito à variação da tenacidade à fratura.

A dificuldade de nucleação e propagação da trinca de fadiga nos aços aqui estudados que simulam a camada cementada, pode ser correlacionada com a mesma dificuldade relatada pelos autores citados no capítulo 2. Esses autores também constataram instabilidade da trinca de fadiga na superfície mais externa da camada cementada onde o teor de carbono é elevado e que são comparáveis às dificuldades observadas nesta dissertação para o aço SAE 52100. Para este aço o valor de ∆KTH é próximo do KIC, e a curva da/dN x ∆K possui uma grande inclinação que

caracteriza a instabilidade da propagação da trinca de fadiga na superfície da camada cementada. À medida que trinca avança na camada cementada onde diminui o teor de carbono e dureza, com conseqüente aumento da tenacidade à fratura, verifica-se que diminuem as inclinações das curvas da/dN x ∆K, permitindo interpretar que uma trinca pode ser retardada ou ancorada ao atingir um local de maior resistência à propagação da trinca.

Observou-se que à medida que uma trinca avança ao longo da camada cementada, ela sai de um local onde predomina a MFEL até atingir um local abaixo da camada cementada onde predomina a MFEP. Assumindo que estes resultados são válidos para uma camada cementada,

então em 1 mm de espessura da camada as dimensões da zona plástica aumentam em 17 vezes quando a trinca avança em direção ao núcleo. Assim sendo, desde que a tensão aplicada o permita, uma trinca pode ser retardada ou ancorada na camada cementada assim que atinja uma região de maior tenacidade à fratura abaixo da superfície. Isso desde que seu comprimento fique abaixo do crítico para a região em questão, de modo a não ocorrer fratura frágil. Essa previsão pode ser feita com as equações propostas que relacionam o comprimento da trinca crítica em função da dureza na camada cementada. Tal hipótese talvez seja verdadeira, uma vez que o processo de cementação é largamente utilizado nas indústrias, e são relativamente pequenas as incidências de fraturas, devido trincas por fadiga, mesmo sabendo-se que existem muitas descontinuidades superficiais geradas nos processos de fabricação das peças (riscos de usinagem, batidas, inclusões, carbonetos, etc).

As análises das microestruturas confirmam as características esperadas para as aparências das estruturas martensíticas em função do teor de carbono, quando revenida abaixo de 200 °C. Confirma também a grande heterogeneidade microestrutural que é observada nas pequenas espessuras da camada cementada. As diferenças de morfologias que são verificadas para as martensitas obtidas para teores de carbono de 0,15, 0,40, 0,60 e 1,00 % atestam esse fato.

Confirmou-se ainda que a tenacidade à fratura varia de modo inversamente proporcional ao teor de carbono e microdureza, indicando que o modelo proposto pode ser utilizado para previsão do comportamento da tenacidade à fratura de camada cementada. E também que é possível obter por regressão com boa correlação e pequeno erro, um polinômio que possa ser utilizado nessa previsão. Porém esses dados são válidos apenas para avaliar a tenacidade à fratura da camada cementada do aço SAE 5115 e podem ser utilizados para outras geometrias mais complexas desde que seja aplicado o fator de forma correspondente. O comprimento crítico de trinca obtido para cada, demonstra que os defeitos inerentes, tais como oxidação, descarbonetação, carbonetos, inclusões e marcas de usinagem, podem ter o comportamento de pré-trincas. E devido à variedade e distribuição aleatória desses defeitos ao longo da camada cementada, justificam as hipóteses descritas no texto de que talvez a nucleação e a propagação da trinca de fadiga ocorram devido uma competição estatística destes defeitos quando submetidos a tensões locais de tração. Essa

competição pode acelerar ou não o crescimento da trinca, caso seus efeitos possam ser somados ou subtraídos, associados aos efeitos das tensões residuais de compressão características das camadas cementadas. A resistência à propagação de trinca diminui com o teor de carbono, indicando que uma trinca superficial pode ser paralisada ou retardada, quando durante sua propagação atingir um ponto que tenha um valor de KIC mais elevado. Esta observação vem

também justificar a dificuldade de se conduzir teste de fadiga de modo estável em aços cementados, temperados e revenidos. É difícil determinar se o da/dN pontual aplicado em um ensaio faria a trinca ultrapassar ou não o seu comprimento crítico naquele local. No caso de outros tipos de aços para cementação, tais como SAE 4320, 8620, 9310 e outros, seria viável fazer um estudo semelhante para determinação dos polinômios característicos desses aços.

As fractografias confirmaram a predominância do mecanismo de fratura intergranular para teores de carbono acima de 0,40 %, como é esperado para aços de baixa liga cementados e temperados. Para o aço SAE 5115 predominou o micromecanismo de fratura alveolar. Para os aços SAE 5140, 5160 e 52100, verifica-se o micromecanismo predominantemente intergranular com uma certa quantidade de alvéolos sendo que o percentual de cada micromecanismo observado (intergranular ou alveolar) está associado à austenita retida transformada em fase mais dúctil durante o revenimento, ou carbonetos esféricos arrancados durante à propagação da trinca no corpo de prova de tenacidade à fratura.

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