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Condição de Endividamento e Inadimplência no Brasil

1 INTRODUÇÃO

2.6 Psicologia Econômica

2.6.7 Condição de Endividamento e Inadimplência no Brasil

O endividamento é algo que consome a renda dos indivíduos. Lea (1999) destaca que endividamento tem relação com pessoas que têm problemas em saldar suas dívidas, seja agora, ou num futuro próximo. Davies e Lea (1995) e Perry (2008) evidenciaram em seus estudos que a primeira, não a única, razão para o endividamento refere-se a problemas de cunho econômico, como complicações familiares, tanto em termos de renda, quanto problemas de saúde e acidentes, maior número de filhos e emprego precário.

É relevante ressaltar que, segundo Lea (1999), existe, na Psicologia Econômica, a distinção dos termos crédito, débito e endividamento. O autor afirma que crédito refere-se a situações em que é combinado um pagamento posterior, mediante uma relação de troca. Já o débito, à luz da abordagem desse arcabouço teórico, configura-se na situação em que o tomador adia o pagamento do compromisso ora assumido sem o consentimento do

emprestador. Por fim, endividamento ou sobre-endividamento tem relação com pessoas que apresentam problemas de dívidas, as quais possuem dificuldades para saldá-la no momento (endividamento), ou em um futuro próximo (sobre-endividamento).

Diante disso, considerando a questão do endividamento, A PEIC analisa, mensalmente, o referido fator, apresentado no Gráfico 2, mensurando como evolui o nível de endividamento das famílias brasileiras.

Gráfico 3 - Endividamento das famílias brasileiras - Por faixa de renda

Fonte: CNC (2014, p. 4).

O Gráfico 2 mostra uma separação de renda no índices de endividamento. A linha inferior evidencia as famílias endividadas que recebem acima de 10 salários mínimos. Acerca desse grupo de famílias, nota-se, desde 2013, uma queda global no endividamento das famílias de um ano para o outro, ocorrendo alguns picos de crescimento nos meses de julho e setembro a dezembro de 2013.

No início de 2014, o gráfico apresentou crescimento do endividamento em janeiro e abril. Esse gráfico destaca que as épocas de férias, início de ano escolar e pagamentos de impostos afetam diretamente o endividamento de famílias que possuem renda familiar acima de 10 salários mínimos.

A linha superior do Gráfico 2 refere-se a famílias que recebem até 10 salários mínimos. Nota-se que, ao longo de um ano, o endividamento dessas famílias permanece praticamente o mesmo, apresentando apenas algumas variações. Dessa forma, torna-se possível afirmar que, em média, 64,5% das famílias brasileiras que possuíam renda familiar até 10 salários mínimos, de abril de 2013 a abril de 2014, estavam endividadas.

Além de comparar as famílias conforme a renda, a pesquisa realizada pela PEIC (2014) mensurou, também, o nível de endividamento da população, como apresentado na Tabela 2.

Tabela 2. Nível de Endividamento (% em relação ao total de famílias)

Categoria Abril de 2013 Março de 2014 Abril de 2014

Muito endividado 12,1% 11,0% 11,8%

Mais ou menos endividado 22,2% 24,0% 24,1%

Pouco endividado 28,5% 26,0% 26,3%

Não tem dívidas desse tipo 36,5% 38,7% 37,5%

Não sabe 0,5% 0,3% 0,2%

Não respondeu 0,1% 0,0% 0,0%

Fonte: CNC (2014, p. 2).

Como evidenciado na Tabela 2, as famílias se autodeclararam na pesquisa não estarem endividadas ou pouco endividadas. A categoria que se declarou estar “mais ou menos endividado” cresceu no último ano, passando de 22,2% para 24,1%, evidenciando, nessa categoria, um aumento da condição de endividamento.

Dos respondentes da PEIC que declararam possuir dívidas, em média, 74,8% dessa dívida é advinda dos cartões de crédito, como retratado na Tabela 3. Essa pesquisa confirma os estudos de Hayhoe, Leach e Turner (1999), Chien e DeVaney (2001) e Joo, Grable e Bagwell (2003), pois todos estudaram a relação do comportamento e atitude dos indivíduos com os seus cartões de crédito.

Tabela 3. Tipo de dívida (% de famílias)

Abril 2014

Tipo Total Até 10 SM Renda Familiar mensal + de 10 SM

Cartão de crédito 74,8% 76,2% 69,0% Cheque especial 5,5% 5,0% 8,1% Cheque pré-datado 2,0% 1,8% 2,8% Crédito consignado 4,7% 4,4% 6,1% Crédito pessoal 9,9% 9,5% 11,6% Carnês 16,9% 18,5% 9,8% Financiamento de carros 13,8% 11,2% 26,3% Financiamento de casa 7,8% 5,5% 17,8% Outras dívidas 2,4% 2,6% 1,2% Não sabe 0,2% 0,2% 0,1% Não respondeu 0,3% 0,3% 0,3% Fonte: CNC (2014, p. 3).

A Tabela 3 destaca que os maiores responsáveis por endividamento das famílias que recebem até 10 salários mínimos são: cartões de crédito, carnês e financiamento de carro. Já para as famílias que recebem mais de 10 salários mínimos, os principais responsáveis por seu endividamento são: cartões de crédito, financiamento de carro e financiamento de casa.

Trindade, Righi e Vieira (2012) evidenciaram em seu estudo, realizado em 31 municípios da Mesorregião Rio-Grandense, que o endividamento feminino está relacionado

com status, preocupação e materialismo, confirmando que o endividamento vai além da relação consumo e renda.

Kim et al. (2014) constataram que o endividamento das famílias na Coréia aumentou rapidamente nos últimos anos. Os autores evidenciaram que esse crescimento deveu-se ao aumento dos preços, atitudes negligentes (relacionadas à propensão ao endividamento) para com os empréstimos e condições favoráveis de financiamentos oferecidas pelos bancos. Esse estudo mostrou ainda que 70 a 80% das famílias endividadas pertenciam à classe de alta renda.

É importante destacar que endividamento não significa o não pagamento da dívida, porém, quando o pagamento da dívida não acontece, o cliente se torna inadimplente. O BACEN publicou, em 21 de dezembro de 1999, a Resolução 2.682, a qual define a classificação de risco e os prazos de inadimplência. Conforme a referida resolução, os atrasos de até 14 dias não configuram risco iminente de inadimplência às operações de crédito das instituições, mas um risco potencial.

Dessa forma, é possível afirmar que o endividamento, condição antecessora à inadimplência, pode conter mais explicações acerca do comportamento do indivíduo do que a condição de inadimplência em si. A literatura mostra que situações adversas e condições econômicas não são as únicas responsáveis pelo endividamento e inadimplência das pessoas.

Diante de todo esse contexto, são propostas as hipóteses desta pesquisa. O objetivo a ser investigado é o risco de endividamento. Esse risco pode ser medido de duas formas: (1) a partir de autodeclaração do indivíduo; (2) a partir da constatação de tal situação por meio das dívidas declaradas dos indivíduos, frequência de pagamento e o reconhecimento, por parte do indivíduo, de sua condição financeira.

A partir daí, a primeira hipótese a ser testada está relacionada com a autodeclaração do indivíduo. O objetivo é investigar se o consumidor se sente ou não endividado, mesmo pagando as suas contas em dia.

H1: Controladas as características demográficas e situacionais, as variáveis

comportamentais e psicológicas investigadas influenciam a sensação de endividamento dos indivíduos.

Na primeira hipótese, serão investigadas de que forma os aspectos comportamentais e psicológicos são capazes de influenciar o sentimento de endividamento por parte do indivíduo.

A segunda hipótese a ser investigada está relacionada ao risco de endividamento dos indivíduos em relação aos aspectos investigados. Dessa forma, busca-se entender se existe relação entre o risco de endividamento com as variáveis propostas.

H2: Controladas as características demográficas e situacionais, as variáveis

comportamentais e psicológicas investigadas influenciam o risco de endividamento geral dos indivíduos.

Busca-se, assim, investigar se os aspectos comportamentais e psicológicos investigados são capazes de predizer o risco de endividamento a partir da triangulação da quantidade de dívida, frequência de pagamento e reconhecimento da condição financeira do indivíduo.

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