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2. ESTADO DA ARTE SOBRE REUTILIZAÇÃO DE MATERIAIS EM

2.2. Reciclagem de pavimentos rodoviários

2.2.2. Condicionantes à incorporação do material fresado

As misturas betuminosas recuperadas provêm de obras de construção, reabilitação, conservação e demolição de pavimentos rodoviários e aeroportuários. Estas misturas podem ser constituídas por misturas betuminosas fresadas, por placas retiradas de camadas de pavimento posteriormente desagregadas ou britadas, ou por materiais excedentários da produção de misturas betuminosas (Especificação LNEC E 472, 2009).

No entanto, a incorporação de material fresado levanta alguns problemas ao nível da formulação, da tecnologia de fabrico das misturas betuminosas e do envelhecimento do betume. Este último é um aspeto ao qual foi dada especial relevância no presente estudo. A seguir

explica-se de que forma estas condicionantes influenciam a produção das novas misturas betuminosas recicladas.

i. Formulação

A formulação das misturas betuminosas recicladas depende das caraterísticas do material fresado, dos seus constituintes e da taxa de incorporação que irá condicionar a seleção de “novos” materiais (Guimarães, 2012). De modo a facilitar a compreensão do processo de formulação deste tipo de misturas, é apresentado na Figura 2.9 um organograma com a metodologia que se deve seguir na formulação de misturas recicladas a quente em central (Batista et al. (2000) e Batista (2006)).

Figura 2.9 – Metodologia de formulação de misturas betuminosas recicladas a quente Esta metodologia de formulação compreende quatro fases. A primeira fase trata-se da caraterização da mistura recuperada (material fresado ou RAP) e do estudo da composição da mistura de agregados (agregados reciclados e agregados virgens). Os agregados novos são selecionados de modo a que, juntamente com os agregados reciclados, se obtenha uma composição granulométrica que cumpra as especificações do caderno de encargos. Na fase seguinte, é estimada a quantidade total de betume da mistura recorrendo a fórmulas empíricas baseadas na superfície específica dos agregados.

A terceira fase procura selecionar o tipo de betume, que juntamente com o betume presente no material a reciclar e eventualmente com um rejuvenescedor, cumpra as caraterísticas pretendidas para o ligante. Na última fase otimiza-se a mistura, recorrendo ao método Marshall ou outro método que aplique ensaios mecânicos e que permita determinar a quantidade final de betume a utilizar na mistura (Batista, 2006, Batista et al., 2000).

ii. Tecnologia de fabrico de misturas betuminosas recicladas a quente em central

Para a reciclagem a quente em central de misturas betuminosas podem utilizar-se centrais de fabrico contínuas ou descontínuas, devidamente adaptadas para este efeito. Deverão estar munidas dos dispositivos necessários a uma adequada incorporação do material fresado, de forma a evitar degradação de mistura e em particular do betume presente no material fresado (Especificação LNEC E 472, 2009). A seguir, descreve-se as principais caraterísticas das centrais betuminosas que devem ser utilizadas na reciclagem.

▪ Centrais Contínuas

As centrais contínuas deverão dispor de um sistema que permita a introdução de misturas betuminosas numa zona do tambor-misturador onde se encontrem protegidas do queimador. O aquecimento e desidratação destes materiais são feitos pelos gases de combustão quentes, e pelo contacto com os agregados virgens que deverão ser sobreaquecidos. Tendo em conta o tipo de tambor secador-misturador (TSM) da central e as adaptações efetuadas para adição do material fresado, as taxas de incorporação deste tipo de material poderá variar numa gama que varia entre os 10% e os 50% (EAPA, 1998, Especificação LNEC E 472, 2009).

Na Figura 2.10 apresenta-se um esquema de uma central betuminosa contínua adaptada para o fabrico de misturas betuminosas recicladas a quente.

Neste tipo de centrais, existem ainda diferentes métodos para o fabrico das misturas betuminosas recicladas a quente, sendo os principais: central com TSM de fluxos paralelos, central com TSM de fluxos contracorrentes e central contínua de tambor duplo (EAPA, 1998).

▪ Centrais Descontinuas

Nas centrais descontínuas, as técnicas de reciclagem existentes, também denominadas de reciclagem em central de torre, incluem os métodos a frio, a quente e ainda um método

Figura 2.10 – Esquema da central betuminosa contínua (adaptado de EAPA (1998))

No método a frio, o material fresado é introduzido a frio junto com os agregados ou diretamente na unidade de mistura (Figura 2.11). Os agregados virgens são sobreaquecidos de modo a que a mistura final apresente uma temperatura adequada. Por este motivo, nestes métodos, só em condições especiais se consegue ir além de incorporações de 30%.

Figura 2.11 – Esquema da central betuminosa descontínua ou de torre (EAPA, 1998) Para alcançar taxas de reciclagem mais elevadas, o material fresado pode ser aquecido e introduzido na unidade de mistura (método a quente) ou ser aquecido juntamente com os agregados (método Recyclean) antes de ser elevado para a unidade. Desta forma, conseguem-se taxas de reciclagem que podem atingir, no primeiro caso 70% e no segundo caso pelo menos 35% (EAPA, 1998).

No entanto, todos estes métodos implicam que o material fresado tenha sido britado e crivado para as dimensões adequadas, onde os materiais de maiores granulometrias são rejeitados.

As centrais betuminosas descontínuas têm uma estruturação de funcionamento muito flexível, o que permite uma variação do tipo de mistura ou da fórmula de trabalho sempre que necessário. Outro especto a ter em atenção quando se utiliza elevadas taxas de material fresado, é que este processo obriga a recorrer a centrais com algumas alterações relativamente às que são utilizadas na produção de misturas convencionais. Um exemplo disso é o trabalho de Palha et al. (2014) em que a central (Figura 2.12), se diferencia das restantes centrais descontínuas nas seguintes componentes:

▪ Anel especial para introdução de material fresado (MF) no interior do tambor secador; ▪ Linha de introdução de MF até ao misturador incluindo tolva de pesagem;

▪ Linha de introdução de fresados no anel do tambor secador com dosagem volumétrica; ▪ Sistema de betume espuma à entrada do misturador;

▪ Sistema automático para a introdução de fibras com dosagem ponderal; ▪ Sistema automático para introdução de líquidos com dosagem volumétrica.

Figura 2.12 – Exemplo de central descontínua ou de torre

Nesse trabalho de Palha et al. (2014), a obtenção de elevadas taxas de reciclagem é conseguida com base na separação e introdução do material fresado em diferentes fases do processo produtivo. Todo este processo permite melhorar a qualidade de produção das misturas e reduzir o envelhecimento do betume.

iii. Envelhecimento do betume

Os betumes sofrem um processo de envelhecimento, a que corresponde alterações físicas e químicas, com reflexo no seu comportamento, em consequência das condições que são impostas ao longo da sua vida, desde a produção na refinaria até ao final do ciclo em serviço na camada do pavimento rodoviário (Guimarães, 2012). Todo este ciclo faz com que o betume perca

gradualmente a sua principal caraterística, a flexibilidade. Este processo resulta da oxidação devido à exposição ao ar e da evaporação dos componentes voláteis, que leva à perda do seu comportamento viscoelástico. Os problemas que estão associados são o endurecimento e aumento da fragilidade do betume, que potência fenómenos de degradação, como fendilhamento térmico/fadiga e desagregação superficial pela perda de adesão entre o betume e os agregados (Antunes, 2005, Johansson et al., 1998).

Os betumes ao longo da sua vida vão passando por vários estádios. Este termo é utilizado no domínio da química para indicar cada um dos momentos em que se pode dividir um processo ou evolução do envelhecimento do betume. Assim, o processo de envelhecimento pode apresentar determinados estádios tendo em conta a especificidade das condições envolvidas. Segundo Whiteoak (1991) as principais fases do envelhecimento dos betumes são:

▪ Durante o armazenamento e transporte do betume a temperaturas elevadas em períodos que podem ser prolongados;

▪ Durante a fase construtiva, envolvendo o fabrico da mistura betuminosa a quente e o seu armazenamento, transporte e colocação em obra;

▪ Durante o serviço, enquanto constituinte de uma camada de pavimento, sobretudo na camada de desgaste, onde fica exposto a solicitações e aos agentes atmosféricos. Não se tem dado grande relevância à contribuição da fase de armazenamento do betume para o envelhecimento uma vez que a área da superfície do betume que está exposta ao ar é pequena quando comparada com o volume armazenado (Whiteoak, 1991).

As duas últimas etapas têm maior importância para o envelhecimento, onde se distingue a fase construtiva, como sendo a de envelhecimento a curto prazo, da fase de serviço no pavimento, como sendo a de envelhecimento de longo prazo (Guimarães, 2012).

A vida útil do betume é prolongada pela reciclagem da mistura betuminosa. Desta forma dá-se início a um novo ciclo de vida e o betume deve oferecer uma resposta equilibrada na contribuição para as propriedades funcionais e estruturais das novas misturas betuminosas. É necessário um equilíbrio entre a rigidez e a elasticidade, de modo a conferir ao betume uma certa flexibilidade a baixas temperaturas, impedindo assim o fendilhamento térmico. Ao mesmo tempo uma rigidez suficiente para que no patamar das temperaturas elevadas do pavimento se evite a ocorrência de deformações permanentes (Mahrez e Karim, 2003).