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2. A RESPONSABILIDADE CIVIL E O DIREITO DE FAMÍLIA

2.2 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA

2.2.1 Conduta culposa do agente

Na responsabilidade civil subjetiva, fundada no artigo 186 do Código Civil, a conduta culposa é um dos pressupostos essenciais à formação da responsabilidade subjetiva.

Entende-se por conduta todo o “comportamento humano voluntário que se exterioriza através de uma ação ou omissão, produzindo consequências jurídicas”.34

No caso em comento, a ação é a forma mais comum de exteriorização da conduta, uma vez que as pessoas estão obrigadas a abster-se da prática de atos que possam lesar seu semelhante, de modo que a violação desse dever geral de abstenção se obtém através de um fazer. Assim, “consiste, pois, a ação em um movimento corpóreo comissivo, um comportamento positivo, como a destruição de uma coisa alheia, a morte ou lesão corporal causada em alguém, e assim por diante.”35

Já a omissão consiste no “[...] dever jurídico de agir, de praticar um ato pra impedir o resultado, dever, esse, que pode advir da lei, do negócio jurídico ou de uma conduta anterior do próprio omitente, criando o risco da ocorrência do resultado, devendo, por isso, agir para impedí-lo.”36 Logo, só pode ser responsabilizado por omissão aquele que tem o dever jurídico de agir, ou seja, estiver numa situação que o obrigue a impedir o resultado, pois, de modo contrário, toda omissão seria relevante.

Consoante o entendimento de Sérgio Cavalieri, o ato comissivo (ação) é aquele que não deveria, enquanto a omissão é a não observância de um dever.

33 Ibid, p. 37.

34 Ibid, p. 38. 35 Ibid, p. 38. 36 Ibid, p. 38.

No entanto, não basta apenas uma ação ou omissão para caracterizar a conduta culposa do agente, sendo necessário que este, no momento em que agiu, tenha capacidade de entender o que está fazendo e consciência da sua ação, além de que a conduta deverá se desviar do comportamento dele exigível. Nesse viés, a primeira exigência faz referência à imputabilidade do agente, a qual possui como elementos a maturidade e a sanidade mental, ao passo que a segunda se refere à culpa. “Dessa forma, para que alguém, ao praticar um ato ilícito, seja obrigado a reparar o dano causado, é necessário que tenha capacidade de discernimento, caso contrário, aquele que não pode querer e entender não incorre em culpa.”37

Nesse caso, “imputabilidade é, pois, o conjunto de condições pessoais que dão ao agente capacidade para poder responder pelas consequências de uma conduta contrária ao dever; imputável é aquele que podia e devia ter agido de outro modo.”38 É inviável responsabilizar alguém pela prática de um ato danoso se, no momento em que o pratica, não tem capacidade de entender o caráter reprovável da sua conduta.

Todavia, não basta apenas a imputabilidade do agente para que o ato lhe possa ser imputado, exigindo, ainda, o elemento culpa, pressuposto básico da responsabilidade civil subjetiva.

Quanto à culpa, importante tecer algumas considerações quanto ao seu significado, já que esta pode ser compreendida em sentidos distintos. O artigo 186 do Código Civil, anteriormente transcrito, estabelece que, aquele que agir com culpa, violar direito e causar dano a outrem, comete ato ilícito. Nesse ínterim, pode-se dizer que neste artigo está presente a culpa lato sensu, a qual de acordo com Sérgio Cavalieri Filho:

Culpa lato sensu indica o elemento subjetivo da conduta humana, o aspecto intrínseco do comportamento, a questão mais relevante da responsabilidade subjetiva. E assim é porque a realização externa de um fato contrário ao dever jurídico deve responder a um ato interno de vontade que faça do agente a causa moral do resultado.39

Nesse viés, pode-se dizer que a culpa lato sensu abrange tanto o dolo como a culpa em sentido estrito. Por dolo, entende-se a conduta intencional, na qual o agente atua conscientemente de forma que deseja que ocorra o resultado antijurídico e assume o risco de produzí-lo, ou seja, é a vontade conscientemente dirigida à produção de um resultado ilícito.

37 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 4: responsabilidade civil. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 35.

38 FILHO, op. cit., p.40. 39 Ibid, p. 44.

Já a culpa em sentido estrito (culpa stricto sensu) não existe a intenção de lesar. A conduta é voluntária, assim como no dolo, mas o resultado alcançado não. O agente não deseja o resultado, mas acaba por atingí-lo ao agir sem o dever objetivo de cuidado, o qual revela-se pela imprudência, negligência ou imperícia.

Convém citar as palavras de Rui Stoco:

Quando existe a intenção deliberada de ofender o direito, ou de ocasionar prejuízo a outrem, há o dolo, isto é, o pleno conhecimento do mal e o direito proposito de o praticar. Se não houvesse esse intento deliberado, proposital, mas o prejuízo veio a surgir, por imprudência ou negligencia, existe a culpa (stricto sensu).40

No mesmo sentido, Sérgio Cavalieri Filho:

Tanto no dolo como na culpa há conduta voluntária do agente, só que no primeiro caso a conduta já nasce ilícita, porquanto a vontade de dirige à concretização de um resultado antijurídico – o dolo abrange a conduta e o efeito lesivo dele resultante -, enquanto que no segundo a conduta nasce lícita, tornando-se ilícita na medida em que se desvia dos padrões socialmente adequados. [...] Em suma, no dolo o agente quer a ação e o resultado, ao passo que na culpa ele só quer a ação, vindo a atingir o resultado por desvio acidental de conduta decorrente de falta de cuidado.41

Todavia, na seara da responsabilidade civil, não possui grande relevância a distinção entre dolo e culpa em sentido estrito, uma vez que o objetivo é reparar o dano sofrido pela vítima e não punir o agente culpado, medindo-se a indenização pela extensão do dano, e não pelo grau de culpa do agente.

Nesse sentido, conforme destaca Sérgio Cavalieri, não há necessidade em distinguir dolo de culpa, visto que, pelo nosso Direito, “o agente responde igualmente pelas consequências da sua conduta, sem se indagar se o resultado danoso entrou nas cogitações do infrator ou se a violação foi especialmente querida”.42 Para o autor, a função da indenização é exclusivamente reparadora, não de punição da conduta, como ocorre na responsabilidade penal, onde o grau de culpa do agente exerce influência capital na graduação da pena.