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CONEXÕES ENTRE A AGRICULTURA URBANA E

1. INTRODUÇÃO

1.2. CONEXÕES ENTRE A AGRICULTURA URBANA E

Em consonância com o estabelecido no decreto 7272, em agosto de 2011, foi lançado o primeiro Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PLANSAN), onde a implantação de uma Política Nacional de Agricultura Urbana aparece como uma meta prioritária para 2012/2015, dentro do objetivo de:

“fomentar o abastecimento alimentar como forma de consolidar a organização de circuitos locais e regionais de produção, abastecimento e consumo para a garantia do acesso regular e permanente da população brasileira a alimentos, em quantidade suficiente, qualidade e diversidade, observadas as práticas alimentares promotoras da saúde e respeitados os aspectos culturais e ambientais “(MDS, 2011)

Se a inserção da agricultura urbana e periurbana integrou-se ao conjunto de propostas do campo da segurança alimentar por ocasião da II Conferência Nacional de SAN, em 2004, foi na III CNSAN, em 2007, que foram elaboradas as bases de uma Política Nacional de Agricultura Urbana e Periurbana, como proposta de ação prioritária na área do abastecimento alimentar, com diretrizes de articulação dos temas de segurança alimentar e nutricional, incluindo o ciclo de produção-comercialização- consumo de alimentos e produtos em bases agroecológicas, bem como a transversalidade dessa política, alcançando os temas do urbanismo e os planos diretores do desenvolvimento sustentável e da inclusão social através da melhoria de renda na economia solidária (CONSEA, 2013).

Já em 2011, por ocasião da IV CNSAN, a agricultura urbana se consolida nas proposições aprovadas e, como resultado, o tema passa a compor o primeiro Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PLANSAN) 2012–2015. Em cumprimento à meta estabelecida de “Implantar a Política Nacional de Agricultura Urbana” diversos projetos foram implementados pelo Ministério do Desenvolvimento Social (MDS).

De 2003 a 2013, o MDS apoiou a implantação de 526 projetos, incluindo produção de alimentos (hortas, lavouras, ervas medicinais e criação de pequenos animais); beneficiamento/ processamento (miniagroindústrias) e comercialização (feiras) num total de R$ 149.282.862 para 138.070 beneficiários diretos. No entanto, mudanças na coordenação da Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, em 2013, determinaram que os editais fossem descontinuados, os recursos direcionados a outros programas e também foi interrompido o processo de construção da PNAUP em diálogo com a sociedade.

Associado às ações ligadas à estruturação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar (SISAN), o tema permanece junto à Câmara Interministerial de SAN (CAISAN), que vem encaminhando, de forma articulada com o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), sua reintegração no conjunto das políticas relacionadas a SAN.

Do ponto de vista da segurança alimentar e nutricional, o país tem sido bem sucedido no combate à desnutrição. O Relatório de Insegurança Alimentar no Mundo, de 2014, publicado pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), revelou uma redução expressiva da fome e da desnutrição nos últimos anos no Brasil. Por meio do indicador de monitoramento internacional de Prevalência de Subalimentação, usado pela FAO há cinquenta anos, foi possível verificar que o Brasil atingiu nível abaixo de 5%, o limite estatístico da medida, abaixo do qual se considera que um país superou o problema da fome. Desde março de 2013, todas as famílias em situação de extrema pobreza passaram a receber os benefícios que garantem um mínimo de renda per capita de cerca de US$ 1,25 por dia, fazendo com que 22 milhões de brasileiros fossem retirados da extrema pobreza desde 2011(FAO, 2014).

Se, por um lado, a fome passa a ser um fenômeno episódico, a questão que se coloca é a de garantir o acesso a uma alimentação adequada e saudável. Ou seja, em que medida o direito humano à alimentação significa a possibilidade de o poder público intervir não só contra a fome, mas contra a alimentação de má qualidade. A questão alimentar realiza interface com diversas políticas públicas, que, além de dispersas, não constituem prioridade em nenhuma delas.

Lavinas e Nabuco (1996) avaliam que as ações e as políticas sociais na área alimentar são pautadas pela falta de planejamento e pulverização dos recursos em projetos muitas vezes superpostos e não-complementares. Também para Cunha (1997), as iniciativas públicas encontram-se dispersas em distintos níveis federativos e em diversas estruturas administrativas e burocráticas dentro do aparato estatal. No entanto, o cenário da questão alimentar é bastante crítico e urgente. O Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN), que reúne organizações e movimentos sociais, em seu VII Encontro Nacional, realizado em Porto Alegre em 2013, elegeu como tema mobilizador Que alimentos (não) estamos comendo? para tratar de aspectos do sistema alimentar mundial e da urgência em se dar visibilidade às contradições que se vêm acentuando no campo alimentar e nutricional no Brasil e no mundo.

Ao propor a reflexão sobre os vários fatores que incidem sobre nossas escolhas alimentares e sobre os modelos de produzir, comercializar e consumir os alimentos, as organizações que fazem parte do FBSSAN procuram chamar a atenção sobre a necessidade de se definirem os mecanismos de efetivação do DHAA em face da persistência de ameaças que comprometem práticas alimentares saudáveis e respeitosas da diversidade cultural, bem como dão pleno curso a modelos de produção causadores de danos sociais e ambientais e que comprometem a sociobiodiversidade (FBSSAN, 2013).

A intervenção estatal situa-se na órbita da ação pública, apoiada na noção de cidadania alimentar, distinguindo-se dos direitos do consumidor, garantidos pelos mecanismos de mercado. Trata-se de verificar como o poder público pode garantir assistência alimentar para proteger as famílias contra a fome ou contra a alimentação inadequada e ao mesmo tempo intervir no mercado de forma a garantir padrões de produção, distribuição e de consumo adequados, articulados e acessíveis a toda a população (Coelho et al., 1999).

Tendo sua origem no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), o direito humano à alimentação adequada reconhece não só o direito fundamental de estar livre da fome, mas inclui o direito a um padrão alimentar saudável e adequado. Significa, portanto, atribuir responsabilidade aos

diferentes níveis do Estado, no sentido de respeitar, proteger, promover e prover esse direito.

Segundo esta perspectiva, dentre as dimensões incluídas no direito humano à alimentação incluem-se o direito às terras produtivas, aos recursos naturais, ao acesso a uma rede de comércio local e, finalmente, incorpora o direito de produzir, de maneira adequada e soberana, seu próprio alimento e/ou de ter recursos (financeiros, físicos e materiais) para alimentar-se de forma adequada e com dignidade (Burity, 2010).

Em 2002, o Relator Especial da ONU para o direito à alimentação, Olivier De Schutter, definiu o Direito Humano à Alimentação Adequada da seguinte forma:

“O direito à alimentação adequada é um direito humano inerente a todas as pessoas de ter acesso regular, permanente e irrestrito, quer diretamente ou por meio de aquisições financeiras, a alimentos seguros e saudáveis, em quantidade e qualidade adequadas e suficientes, correspondentes às tradições culturais do seu povo e que garanta uma vida livre do medo, digna e plena nas dimensões física e mental, individual e coletiva” (Burity,2010, p.15).