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Conhecimento, maneira de pensar, mentalidade técnica, racionalização

4.2 Significados de técnica nos dicionários

4.2.3 Conhecimento, maneira de pensar, mentalidade técnica, racionalização

Outro significado que se faz presente nas definições é a acepção de técnica como conhecimento e como maneira de pensar: maneira de pensar de um indivíduo (Wiese, apud BALDUS e WILLEMS, 1939); mentalidade técnica,

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racionalização (BALDUS e WILLEMS, 1939); a técnica moderna é matemática aplicada e ciência natural; repousa no conhecimento científico; criada pela razão humana (BERNSDORF e BÜLLOW, 1950); um saber prático que permite utilizar a natureza (BIROU, 1966/1973); pode ser considerada como procedimento, método e modo de pensar (SCHOECK, 1969/1973); as técnicas podem ser apreendidas, podem ser intelectuais (THEODORSON e THEODORSON, 1969/1975); conjunto de procedimentos e instrumentos, apoiados no saber científico (DEL CAMPO, MARSAL, GARMENDIA, 1975-6); conjunto de normas e modos de proceder (GALLINO, 1978/2005); aplicação prática dos conhecimentos a partir de regras práticas (ACEBO IBAÑEZ e BRIE, 2001/2006).

Nos sentidos que foram agrupados nesse item, embora em termos gerais, foram qualificados na mesma acepção, é possível identificar uma diferença em dois grupos de autores. A noção de técnica como saber prático que permite utilizar a natureza, como conjunto de procedimentos e instrumentos, normas e modos de proceder, está presente em obras que foram escritas por autores da França, Itália, Espanha, Estados Unidos da América e Argentina. Enquanto a noção de técnica como maneira de pensar, mentalidade técnica e racionalização, está presente em obras de autores alemães: Wiese (apud BALDUS e WILLEMS, 1939) e Bernsdorf e Büllow (1950). Baldus e Willems (1939), embora exerceram carreira acadêmica no Brasil e, portanto, publicaram sua obra no país, ambos nasceram e estudaram na Alemanha. Em síntese, os dicionários que registram a acepção de técnica como maneira de pensar e como racionalização, tem como responsáveis autores vinculados à sociologia alemã. Isso pode ser um indicativo de que a associação da técnica com mentalidade técnica é um tema que recebeu maior atenção da sociologia na Alemanha do que em outros países.

4.2.4 Atividade humana, elemento da cultura.

O quarto significado que se identificou nas definições de técnica: importância crucial na sociedade (BALDUS e WILLEMS, 1939); atividade prática

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do homem (Pimenta, 1955); relação recíproca com a economia e a cultura (Peter Heintz in: KÖNIG, 1963/1971); uma dimensão do homem moderno, da concepção de si mesmo e de sua concepção de mundo (SCHOECK, 1969/1973); dimensão social da técnica (Giancarlo Rovati in: DEMARCHI e ELLENA, 1976); elemento fundamental de qualquer atividade cultural (BLINKERT, 1976/1980); as técnicas compõem uma notável parte da cultura (subcultura) (GALLINO, 1978/2005); condicionante muito importante para a vida social; uma das atividades humanas; deve ser entendida em relação com as demais atividades (ACEBO IBAÑEZ e BRIE, 2001/2006).

Para Mannheim (1962), as técnicas formam parte de todo um sistema social e cultural. Segundo ele, a técnica social moderna, além de ser importante para a sociedade industrial, é relevante para a preservação psicológica, econômica e social desse tipo de sociedade. O filósofo Álvaro Vieira Pinto (2005, p. 62) partilha a ideia de que a técnica, por definição, está presente em todo ato humano. No mesmo sentido Ruy Gama (1986, p. 31) afirma que a técnica é tão antiga quanto o homem. A citação desses três autores ilustra usos desse sentido que é atribuído à técnica, dessa acepção que a considera como uma atividade humana fundamental e, portanto, em estreita interação com a cultura.

A acepção de técnica como relacionada à ciência ou arte consta em 4 obras, publicadas em 1905, 1959, 1966 e 1975-6. Nessa última obra, tem esse sentido a primeira das quatro definições, a qual foi retirada do Diccionario de la Real Española, 1ª edic, 1947 e a terceira definição retirada do Diccionario de la Real Academia Española, 10ª edic. 1852. Em outras palavras, esse sentido de técnica que pode ser considerado de uso mais antigo vai entrando em desuso com o passar dos anos, à medida que é assumido outro sentido como atual.

O segundo sentido, além de ser o mais frequente, pois consta em 11 obras que dicionarizam o termo, foi dicionarizado em obras publicadas entre 1939 e 2003. O terceiro e o quarto significado de técnica constam em 8 obras publicadas entre 1939 e 2001, sendo que 4 dessas obras apresentam os dois

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sentidos. Não é possível constatar mudança de sentido nas outras três acepções de técnica.

Em resumo, das 4 acepções identificadas nas definições de técnica, a que a associa à ciência ou à arte pode ser considerada como de uso mais antigo. Com o passar dos anos, essa noção deixou de constar nos dicionários e enciclopédias de Sociologia e Ciências Sociais, que passaram a registrar com mais frequência as outras três acepções de técnica que contemplam um significado mais amplo que a primeira.

Ao se observar os quatro sentidos de técnica, presentes nas obras publicadas por autores brasileiros, constata-se que a acepção de técnica como ciência ou arte não consta em nenhuma das obras que dicionarizam o termo. O segundo e o quarto sentido, isto é, as acepções de técnica como conjunto de meios e habilidades que os seres humanos utilizam para transformar a natureza e satisfazer necessidades e desejos e, atividade humana / elemento da cultura, respectivamente, constam nas obras publicadas por Baldus e Willems (1939) e Pimenta (1955). Por sua vez, o sentido de técnica como conhecimento, maneira de pensar, mentalidade técnica, racionalização, está presente apenas na obra de Baldus e Willems (1939). Das 11 obras publicadas por autores brasileiros, essas duas obras são as únicas que dicionarizam técnica. Ou seja, a mesma invisibilidade que ocorre com o termo ciência se repete com o termo técnica. Além dessa invisibilidade, ocorre, na verdade, um abandono desses dois termos na medida em que não são mais dicionarizados por nenhuma das 7 obras publicadas, depois de 1955, por autores brasileiros, com exceção do DCS publicado pela FGV (1986) que traduz do inglês o termo ciência publicado pela obra coordenada por GOULD e KOLB (1964).

Das 20 obras que dicionarizam o termo técnica, o Diccionario de ciencias sociales, publicado sob a coordenação de Del Campo, Marsal e Garmendia (1975-6), registra que o termo técnica foi elaborado pelo grupo espanhol, composto por 93 autores, sendo 87 homens e 6 mulheres. Como é uma obra de autoria coletiva que não identifica quem elaborou a definição, é a única

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das 20 obras que dicionarizaram o termo técnica, que pode ter tido participação feminina na elaboração do significado do termo. Nas outras 19 obras, a definição do termo técnica foi elaborada por autores masculinos.

Em síntese, das quatro acepções de técnica identificadas, o sentido de ciência e arte, em termos gerais, consta em obras que foram publicadas até a metade da década de 1970. De maneira similar, ocorre o mesmo com a noção de técnica como maneira de pensar, racionalização e mentalidade técnica. Após esse período, predominam as acepções de técnica como meios e habilidades para transformar a natureza e satisfazer desejos e necessidades, e atividade humana / elemento da cultura.

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