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Conhecimento profissional do professor

2.1- Introdução

Neste capítulo se fez a análise do conhecimento do professor, sua natureza e conteúdo. Fez-se uma abordagem concetual do conhecimento profissional do professor partindo do princípio de que existe um conjunto de conhecimentos que servem de base para o exercício da profissão de professor, em particular do professor de Matemática.

De início foca-se a atenção sobre o conhecimento profissional do professor, abordado sobre duas perspetivas (o conhecimento formal e o conhecimento prático). A natureza e conteúdo desse conhecimento é discutido, apoiando-se em vários autores, que estudaram e reconheceram a existência de um conhecimento para o exercício da atividade docente assente na atividade prática e adquirido com a prática, também se aborda a influência do uso da tecnologia no ensino, sendo hoje um conhecimento indispensável para a profissão, tendo em conta que o conhecimento do professor deve ser entendido como aquilo que os professores devem saber, fazer, compreender, para tornar o ensino em algo mais do que uma forma de trabalho.

O conhecimento do professor “é conjunto de saberes, destrezas, atitudes, disposições que deve possuir o professor para o ensino” (García, 1999, p.1).

O conhecimento do professor vem sendo estudado mais profundamente após a categorização elaborada por Shulman (1986, 1987). A partir daí muitos estudiosos têm procurado descobrir como esse conhecimento se manifesta e assim, têm sido elaborados conceitos, categorizações e descrições desse conhecimento, o que levou à criação de vários modelos que informam quais são e como as categorias do conhecimento profissional se relacionam entre si.

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No final é dado destaque ao conhecimento didático (Ponte, 2012) como o conhecimento base para a docência, que ao nosso ver, deve ser a maior preocupação para as escolas de formação inicial de professores, em particular na formação inicial de professores de Matemática.

2.2- O conhecimento do professor

O conhecimento é um saber dinâmico que pode ser alterado pela aprendizagem, pela experiência e por vários outros processos. É fundamentalmente individual, contudo pode ser coletivo (Ponte & Oliveira, 2002). O conhecimento dos professores está em constantes mudanças, que acontecem pela implementação de novos conhecimentos que emergem da pesquisa específica das ciências, pela reformulação das demandas curriculares, pelas descobertas no campo da pedagogia e psicologia da aprendizagem e pela aplicação das tecnologias de comunicação e informação (García, 1999; Mishra & Koehler, 2006)

A conceptualização do conhecimento do professor é influenciada por muitas áreas disciplinares, psicologia, didáticas das ciências, sociologia, filosofia e mais recentemente pelas tecnologias de comunicação e informação, cada uma delas tem abordagem própria sobre o conhecimento, conceitos, tipologias e reflexões.

O conhecimento pode ser definido, segundo Guerreiro (2017), que assume a definição de conhecimento expressa por Fenwick, Edwards e Sawchuk (2011), como “invenção contínua e exploração, produzida através de relações entre consciência, identidade, ação e interação com objetos e dinâmica estrutural", (Guerreiro, 2017, p. 40)

É essencial analisar o conhecimento do professor na medida em que é este que informa a sua prática (Ponte, 2012). Contudo, ainda hoje, mais de 30 anos após a realização de vários estudos e desenvolvimento de diversas abordagens, a influência do conhecimento do professor na sua atuação “é amplamente reconhecida, mas não existe consenso quanto ao conhecimento que é fundamental” (Rocha, 2012, p. 17).

Os estudos a volta do conhecimento do professor atravessaram vários estádios (Rocha, 2012). Inicialmente aplicou-se o paradigma de investigação prognóstico-produto, com cariz quantitativo, cujo foco estava em calcular a eficiência do ensino, estabelecendo uma relação entre o conhecimento do professor e sua repercussão na aprendizagem dos alunos,

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entre o número de disciplinas de Matemática feitas pelo professor na sua formação e o índice de aprendizagem dos seus alunos (Santos, 2000; Rocha, 2012).

Os resultados alcançados não provaram o estabelecimento de uma relação causa-efeito entre o conhecimento do professor, nem suas atitudes se revelaram relacionadas com a aprendizagem dos alunos, o que levou ao questionamento do tipo de investigação (Santos, 2000). Procedeu-se então a uma mudança no objeto de estudo, passando a incidir sobre o que o professor faz.

Uma nova fase de investigação abriu-se, a atenção sobre os conhecimento do professor, passou a estar centrado na identificação dos métodos, procedimentos e estratégias mais eficientes para ensinar os conteúdos, sobre o papel exercido pelo professor nas atividades de ensino, pois ao professor cabia a missão de implementar o estabelecido pelos investigadores, a fonte do conhecimento vinha de fora (Guimarães, 2008), o professor assumia um papel passivo, de utilizador do conhecimento. Era o período da investigação processo-produto, marcada por uma metodologia de índole quantitativa (Rocha, 2012; Santos, 2000).

Neste mesmo período alguns especialistas começaram a introduzir a observação como parte da investigação, como método de recolha de dados, e isto levou os investigadores a aperceberem-se da complexa cultura da sala de aulas e quão difícil era (é) a atividade de ensinar (Rocha, 2012; Santos, 2000).

Para uma melhor interpretação e conhecimento da complexa cultura observada na sala de aulas, novas formas de investigação foram requeridas, houve mudança de paradigma, houve uma nova forma de encarar a atividade do professor. “O ensino passa a ser considerado como uma atividade que inclui raciocínio e ação” (Santos, 2000, p. 20), que levou a valorização do papel do professor, da procura da compreensão dos seus processos mentais e do seu comportamento, marcando uma viragem na metodologia quantitativa para outra, de cunho essencialmente qualitativo (Santos, 2000).

A ação do professor passa a ter o novo foco, decisões e atuação em sala de aulas, a relação entre as decisões e o conhecimento e seus objetivos, a interpretação da ação, a forma como se forma e como se carateriza. O conhecimento do professor passa a ser o objeto da

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investigação (Rocha, 2012), levando os estudos a uma índole fundamentalmente interpretativa.

Com esta viragem na investigação sobre o professor, formaram-se diversas perspetivas teóricas sobre o conhecimento do professor que assentam sob diferentes ênfases, de ordem pessoal, profissional, académica e didática (Souza, 2014) resultando dai o reconhecimento da importância do pensamento e conhecimento do professor (Guimarães, 2003).

Estas diversas perspetivas sobre o conhecimento profissional do professor, no campo da investigação em Educação, levaram ao surgimento de uma profusão de conceitos associados ao conhecimento do professor. Guimarães (2008), num levantamento de termos relacionados ao conhecimento do professor encontrou várias designações: conhecimento científico, conhecimento estratégico, conhecimento proposicional, conhecimento situado, conhecimento tácito, conhecimento pessoal, conhecimento prático, conhecimento profissional reflexivo, conhecimento artístico, conhecimento artesanal, conhecimento técnico (Guimarães, 2008, pp. 822-827).

Esta grande diversidade conceptual para designar o conhecimento profissional do professor deve-se a complexidade das atividades que o professor desenvolve, que vão desde as tarefas exercidas que envolvem relação com pessoas (alunos, colegas, funcionários, pais e demais indivíduos da comunidade), o pensamento, o conhecimento, as decisões e ações, as diferentes abordagens que faz partindo de diferentes quadros teóricos (Guimarães, 2008) e da natureza do próprio conceito de conhecimento profissional.

O estudo do conhecimento profissional pode ser feito segundo diversas abordagens, onde as principais são as que privilegiam as questões relativas à natureza (Ponte, 1998) e ao conteúdo do conhecimento (Santos, 2000).

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Clandinin e Connelly (1996) e Ohi (2007), na busca da descrição do conhecimento profissional dos professores, o compararam a uma paisagem1, pois consideram o conhecimento do professor composto de uma grande “variedade de componentes e influenciado por uma variedade de pessoas, lugares e coisas” (Ohi, 2007, p. 1)

As pesquisas sobre o conhecimento do professor levaram Canavarro (2003), Roldão (2014) à seguinte questão: Que conhecimentos são essenciais para o professor assegurar a função de ensinar, de promover a aprendizagem enquanto ato sustentado?

A conceitualização do conhecimento profissional do professor ganhou ênfase nos prolíferos trabalhos de Elbaz (1983) e Shulman (1986, 1987). Shulman (1987) diz que o conhecimento do professor é o que “os professores deveriam saber, fazer, compreender para transformar o ensino em algo mais do que uma forma de trabalho individual” (Shulman, 1987, p.5).

Ponte (2000), reconhece que existe um conhecimento profissional do professor, o qual “importa caraterizar e compreender, nomeadamente no que se refere à sua natureza, componentes e estrutura e modo como se constitui e desenvolve” (p. 7).

A caraterização do conhecimento do professor não se resume no saber dos professores, mas como o sabem, como têm consciência do que sabem, como usam e exemplificam o conhecimento que possuem (Canavarro, 2003; Rocha, 2012).

O conhecimento profissional dos professores pode ser concebido em dois níveis, o nível macro e o nível micro (Ponte, 1992). O nível macro tem três categorias, o conhecimento de senso comum, o conhecimento científico e o conhecimento profissional (Ponte, 1992).

No nível micro, o conhecimento tem a seguinte tipologia conhecimento descritivo que envolve conceitos e imagens; o conhecimento preposicional ou argumentativo que envolve cadeias de raciocínios; o conhecimento ativo e processual, o saber fazer, as regras de ação, o controlo, a metacognição e a reflexão (Ponte, 1992).

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O conhecimento de senso comum é pouco estruturado, menos elaborado e exigente, não tem grandes preocupações de coerência ou rigor lógico, é influenciado mais pelo processo de socialização, orientado essencialmente para satisfação das necessidades e resulta da interiorização das representações, adaptando-se às normas sociais prevalecentes em combinação com a experiência individual e geralmente admite mudanças (Ponte 1992).

O conhecimento científico é caraterizado por uma construção rigorosa dos conceitos e suas interligações com base no uso de regras consensuais, está relacionado com a prática e é usado no exercício da atividade, sendo mais eficaz quanto mais se inspirar e reforçar em resultados científicos (Ponte, 1992).

O conhecimento académico refere-se à criação e validação do conhecimento científico, propõe-se responder às numerosas formas de curiosidade intelectual, seguindo critérios de validade e de forma profunda. O seu objetivo é compreender, explicar e identifica-se pela clareza das suas definições, pela utilização de argumentos objetivos (Ponte 1992).

O “conhecimento profissional refere-se a atividades socialmente reconhecidas, realizadas em domínios de prática bem definidos” (Ponte & Oliveira, 2002, p.3). É o conhecimento necessário para desempenhar com sucesso uma atividade profissional, uma atividade que envolve tantos processos de rotina como a resolução de problemas concretos num domínio delimitado de prática social (Ponte, Oliveira, Brunheira, & Varandas, 1998)

O conhecimento profissional diferencia-se do conhecimento do senso comum e do conhecimento académico. O conhecimento profissional é o conhecimento necessário para exercer eficazmente uma atividade profissional, contemplando problemas diferentes dos da vida académica (conhecimento académico) ou da vida diária (conhecimento do senso comum) e abarca um conjunto de conhecimentos e competências e não apenas saber raciocinar (Ponte, Oliveira, Brunheira, & Varandas, 1998; Santos, 2000).

Para Bernstein (1999), as diferentes formas de conhecimento são realizadas em dois tipos de discursos ou códigos de conhecimento, “o discurso horizontal e o discurso vertical” (Bernstein, 1999, p.158).

O discurso horizontal corresponde a uma forma de conhecimento organizado e diferenciado em segmentos, normalmente entendido como o conhecimento do dia-a-dia ou do senso comum, tende a ser oral, local, dependente do contexto específico, é tácito.

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Em contrapartida, o discurso vertical é abstraído de significados incorporados na vida quotidiana, é explícito, sistemático, conceitual e usa linguagem especializada. Tem regras fortes que orientam o acesso, a transmissão e a avaliação (Bernstein, 1999; Harju & Åkerblom, 2017).

O discurso vertical tem duas modalidades de conhecimento – as estruturas hierárquicas e as estruturas horizontais. A estrutura hierárquica do conhecimento corresponde a formas de conhecimento caraterizadas pela integração de proposições e teorias que se realizam nos níveis abstratos. As estruturas horizontais do conhecimento, caraterizam-se por uma linguagem especializadas e que possuí formas de questionamento e normas (Bernstein, 1999).

O conhecimento científico é um discurso vertical com uma estrutura hierárquica integrada pelas estruturas horizontais (Bernstein 1999; Harju & Åkerblom, 2017).

“O conhecimento profissional é um produto da atividade do professor caraterizado pela acumulação de experiências práticas num determinado domínio e, será tanto mais eficaz se poder sustentar em conhecimento de ordem científica” (Llinares, 2000, p. 18) esta ideia é realçada por Ponte (2000), quando afirma que, “o conhecimento profissional está ligado a ação e tem uma forte ligação com o conhecimento comum e adquire consistência quando é articulado com o conhecimento académico” (Ponte, 2000, p. 11).

O conhecimento do professor resultante do processo de trabalho e a capacidade do pensamento, foram designados por Schön (1983) de reflexão e distinguiu-o em duas formas: “a reflexão na ação e a reflexão sobre a ação” (Schön, 1983, p.3), identificando- as como modalidades do conhecimento prático do professor, que segundo o autor, é aplicado na resolução de problemas que surgem na sala de aulas pela ligação criativa entre os conhecimentos da técnica com o vasto conjunto de saberes da ação prática.

A reflexão na ação é o processo que possibilita a compreensão durante a própria ação, é um movimento do pensamento que ocorre durante a atuação (Guimarães, 2003); a reflexão sobre a ação, ocorre depois da ação reconstituindo a ação de forma mental, levando o professor a refletir sobre a sua atuação, atividades propostas, questões efetuadas, ajudando a conhecer as suas ações, pensar no que aconteceu e qual a solução dada e eventualmente adoção de um outro sentido (Guimarães, 2003; Roldão, 2007).

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O conhecimento profissional é visto como um conjunto de competências adquiridas pela realização da reflexão em três níveis: “reflexão na ação, reflexão sobre a ação e, a reflexão sobre a reflexão na ação” (Schön, 1983, p.6).

Shulman (1986), revelou os domínios do conhecimento que são necessários a um professor, o conhecimento pedagógico geral (GPK), conhecimento dos estudantes e como eles aprendem, conhecimento do assunto (CK), conhecimento de conteúdo pedagógico (PCK), conhecimento de outros conteúdos, conhecimento do currículo e o conhecimento dos objetivos educacionais (Fernandez, 2014; Guerreiro, 2017; Ohi, 2007).

Guimarães (2008), fazendo uma sumula dos conhecimentos profissionais do professor, destacou: o conhecimento pessoal que tem a ver com o que professor conhece de si como pessoa; o conhecimento do contexto escolar e social onde desenvolve a prática docente; o conhecimento sobre a matéria que ensina; o conhecimento curricular e; o conhecimento relativo aos alunos e aos processos de ensino e aprendizagem (Elbaz, 1983; Canavarro, 2003; Guimarães, 2008).

O conhecimento profissional do professor é o sistema de noções e saberes, não monolíticos (Serrazina, 1999), sobre o qual se baseia o professor para a realização da sua atividade profissional, está relacionado com a ação, com o conhecimento de senso comum e é fortemente implicado pelo conhecimento científico. É um saber prático que resulta da incorporação da experiência com o conhecimento teórico (Santos, 2000) importantes para poder exercer a profissão (Souza, 2014) ou seja, um conhecimento profissional específico.

Santos e Ponte (2002), referindo-se aos conhecimentos profissionais dos professores de Matemática, dizem que:

Os conhecimentos académicos e o senso comum podem ajudar, mas o professor precisa de ter uma apreensão intuitiva das situações, articulando pensamento e ação, ser capaz de fazer uma gestão dinâmica das relações sociais (Santos & Ponte, 2002. pp.32-33).

Estes autores realçaram que os seus conhecimentos se desdobram por diversas áreas e destacaram três: o saber matemático enquanto disciplina, os conceitos, procedimentos fundamentais, formas de representação e sua conexão com os diversos tópicos e com outras disciplinas; o saber didático consubstanciado nos modos de fazer gestão curricular, no conhecimento dos alunos e seus processos de aprendizagem, organização e finalidades dos conteúdos e formas de avaliação; o saber de ordem organizacional que envolve o

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trabalhar em conjunto com outros colegas, mobilizar órgãos e recursos da escola para resolução de problemas (Santos & Ponte, 2002).

Serrazina (2014), com alguma aproximação às ideias de Santos e Ponte (2002), defende, como cruciais para o professor de Matemática, também três tipos de conhecimento profissional: o conhecimento da Matemática, conhecimento dos alunos e o conhecimento das práticas de ensino.

O conhecimento profissional tem uma natureza específica, que emerge da sua combinação com o conhecimento académico e do conhecimento comum, como resultado torna-se eficaz na resolução de problemas práticos, concretos com a utilização dos recursos existentes. “O conhecimento profissional baseia-se sobretudo na experiência e na reflexão sobre a experiência, não só individual, mas de todo o corpo profissional” (Ponte, 2000, p.11).

2.3- Natureza do conhecimento do professor

Conhecer a natureza do conhecimento do professor revela-se ser uma tarefa árdua e complexa, a julgar pelas diversas abordagens e autores que se consagraram no seu estudo, como Schön (1987), Shulman (1986, 1987), Elbaz (1983), Fenstermacher (1994), Santos (2000), Canavarro (2003), Guimarães (2017), Guimarães (2003), Ponte (1998, 2000, 2012), Martins (2011), Guerreiro (2017) e outros.

Estes autores têm procurado contribuir para a caraterização do conhecimento do professor, sendo a dicotomia conhecimento prático e conhecimento teórico, a que mais se destaca. Enquanto alguns investigadores atribuem um papel mais relevante à teoria, outros afirmam que esse papel está reservado à prática. Entretanto há a aceitação destas duas fontes enquanto bases de criação e do desenvolvimento do saber.

Conhecer a natureza do conhecimento consiste em procurar as caraterísticas desse conhecimento que é teórico e prático simultaneamente, tal como Guimarães (2008) citando Azcárate, afirma: “é uma composição peculiar de conhecimentos teóricos e práticos, com uma estruturação complexa, elaborada através de um largo processo de formação, em que ocupa um lugar significativo a informação procedente da experiência profissional” (Guimarães, 2008, p.22)

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O conhecimento é entendido como um corpo de saberes, a que se pode aceder a partir de uma fonte escrita (racionalismo técnico) ou que é visto na ação do indivíduo (epistemologia da prática) (Santos, 2000).

O conhecimento científico a que Schön (1983) designa de “racionalidade técnica” (p.1), é típico das sociedades que acreditam no poder da ciência, onde o conhecimento é formal e obedece a princípios bem definidos que possibilitam a certificação da sua validade, tem na prática dos professores um campo da sua utilização. A teoria e a prática assumem-se como dois domínios distintos na formação dos professores.

O professor é um técnico que aplica o conhecimento produzido pela investigação científica quanto a matéria que ensina (conteúdo disciplinar) e quanto as formas de transmitir e organizar o conhecimento (Guimarães, 2008). O ensino é um processo de aplicação do conhecimento à prática escolar com as adaptações necessárias, influenciadas pelos contextos, realizados pelo professor (Schön, 1983).

O conhecimento considerado numa perspetiva de racionalidade técnica ou numa perspetiva da epistemológica da prática, é o conhecimento que é adquirido e desenvolvido em situações práticas (Guimarães, 2008; Santos, 2000). O conhecimento, nesta perspetiva tem origem na ação, contempla as competências práticas que as situações divergentes exigem, é tácito e implícito, desenvolve-se com a experiência (Schön, 1983) e é “considerado como fonte de conhecimento profissional” (Guimarães, 2008, p. 822).

Fenstermacher (1994) distingue duas vertentes do conhecimento do professor: “o conhecimento formal e o conhecimento prático” (Fenstermacher, 1994, p.4).

O conhecimento formal corresponde ao conhecimento científico, associado às ciências convencionais, que “é obtido a partir de estudos que empregam métodos científicos convencionais, quantitativos e qualitativos” (Fenstermacher, 1994, p.7) e possui altos padrões de alcance, validade, generalidade e intersubjetividade, sendo independente do contexto, situação ou tempo em que é produzido. É um conhecimento que se expressa por proposições, é coerente com a teoria (Fenstermacher, 1994, Canavarro, 2003; Guimarães, 2008).

As situações que o professor enfrenta na prática profissional são de elevada complexidade, de carácter único e instáveis, de desordem, de indeterminação e de

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singularidade, marcada pela gestão de conflitos de valores (Schön, 1987; Ponte & Oliveira, 2000) para as quais “a ciência e a técnica não contém todas as respostas às questões e problemas que se observam na prática” (Guimarães, 2008, p.821)

A capacidade de gerir as situações (questões e problemas), se apoia em conhecimentos de cunho académico, interligados com outros recursos como são a apreensão intuitiva das situações, articulando pensamento e ação e a gestão da dinâmica das relações sociais (Fenstermacher, 1994).

Nesses contextos, os professores manifestam e desenvolvem um conhecimento prático, fortemente implicado pelo conhecimento adquirido pela experiência. Embora a investigação prove que os professores dão pouco crédito ao conhecimento adquirido pela experiência. Tal omissão deve-se ao fato de não se reconhecer o conhecimento orientado pela prática e da falta da reflexão sobre esse conhecimento (Fenstermacher, 1994).

O conhecimento prático é descrito como intrínseco às situações da prática, que se fortalece a partir da experiência, que envolve a ação e a reflexão que dela se faz (Canavarro, 2003; Guimarães, 2003), é um conhecimento estritamente situado, que surge num determinado tempo, numa determinada situação (situacional) e contexto (contextual), é de natureza experiencial e não necessariamente explícito (Canavarro, 2003; Guimarães, 2008), pode ou não ser suscetível de expressão, escrita ou oral e se relaciona geralmente com o saber fazer as coisas, o lugar e tempo certos para as fazer, o ser capaz de ver e interpretar acontecimentos relacionados com as ações que realiza (Guimarães 2008), ou seja, “engloba a experiência de estilos de aprendizagem do aluno, interesses, necessidades, pontos fortes e dificuldades, um repertório de técnicas instrucionais e habilidades de gestão da sala de aulas” (Fenstermacher ,1994, p.8).

O conhecimento prático tem a ver com as situações reais da atividade docente que permitem aos professores atuar na “complexidade da aula” (Cid, 2009, p.229), atuando segundo modelos feitos por princípios práticos e funcionais, desenvolvidos lentamente ao longo do período de experiência (Cid, 2009; Fenstermacher, 1994; Guimarães, 2008;).

Os conhecimentos que combinam a teoria e a prática, com base fortemente experiencial, assumem-se como o conhecimento prático dos professores (Canavarro 2003) no ensino, o conhecimento prático é mais do que saber fazer, é um conceito coletivo relativo à vida

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mental dos professores, as suas reflexões, objetivos, projetos, desejos e experiências vividas (Guimarães 2008).

Dependendo muito da perspetiva epistemológica existem várias terminologias para o conhecimento profissional do professor, cognitivo, sociocultural, disciplinar e prático.

Sobre o ponto de vista cognitivo, o conhecimento profissional é o resultado da ação profissional e estabelece-se através do trabalho e do desempenho profissional. Para a perspetiva sociocultural, o conhecimento profissional desenvolve-se gradual e paulatinamente com a socialização do professor no contexto de uma cultura (Santos, 2000).

Na perspetiva disciplinar, Shulmam (1986), indica diversas fontes para o conhecimento profissional dos professores, a teoria, a prática e o domínio dos valores ideológicos e

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