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1.3 Considerações finais

2.1.2 Conjunto José Walter

O Cj. José Walter é um dos maiores representantes na produção da política do BNH/SFH operacionalizada em Fortaleza pela atuação da COHAB-CE. Nele se verifica algumas das características mais emblemáticas do que essa produção representou nos arranjos institucionais, na lógica empresarial de ampla escala e de localização periférica. Juntamente ao Cj. Palmeiras, ele inaugura na FES a tendência a receber grandes conjuntos, que se seguiria nas décadas seguintes.

A princípio chamado Cj. Sétima Cidade ou Conjunto Integrado do Mondubim – pela localização no distrito do Mondubim –, o Cj. José Walter foi inaugurado entre os anos 1970 e 1973, em quatro etapas de construção, à 15 quilômetros do Centro de Fortaleza. Considerado o primeiro conjunto-bairro de Fortaleza, foi implantado à margem do 3º Anel Viário (Avenida Perimetral), para além do tecido urbano consolidado no período (Figura 21). Olímpio (2011) confirma em sua pesquisa que o terreno pertencia à família Montenegro27 e foi adquirido pela

prefeitura, à época gerida pelo prefeito José Walter –, embora não haja consenso se a aquisição tenha se dado por doação ou venda. No período que antecede a implantação do

27 A família Montenegro ainda permanece como uma das maiores proprietárias fundiárias na área metropolitana de Fortaleza, concentrando grande parte das glebas vazias na Frente de Expansão Sul. Configuram, portanto, importante agente nas dinâmicas urbanísticas identificadas no local, como se confirmará adiante no capítulo.

conjunto, a área tinha uma ocupação extremamente rarefeita, com características mistas de área rural e urbana. Mesmo após a construção do conjunto, muitos dessas características, expressas pelo cultivo de vegetais e criação de animais, permaneceram por anos.

Figura 21 – Localização do Cj. José Walter na FES

Fonte: Elaboração própria (2018).

Com um montante de 4.774 unidades habitacionais, loteadas em uma gleba de 221.724m², o conjunto contribuiu para o acelerado adensamento, área periférica e precária nas suas poucas infraestruturas, equipamentos sociais e serviços– entre os anos 1970 e 1980, a população do distrito do Mondubim passou de 66.618 habitantes à 192.945, quase triplicando o seu porte. À época, o conjunto José Walter foi celebrado com um dos maiores da América Latina (MÁXIMO, 2012).

A demanda por serviços urbanos cresceu em ritmo muito mais acelerado que a implantação destes, configurando um intenso déficit urbanístico para as milhares de famílias que se instalavam no conjunto. Chamado “Núcleo Habitacional Integrado” na concepção da COHAB-CE, o projeto do Cj. José Walter previa a construção de uma gama de equipamentos sociais – escolas, banco, posto de saúde, clube social, delegacia, centro cívico, centros comerciais, Igreja, praça de esporte cívico, cinema, bosque e teatro de arena. Em quase sua totalidade, entretanto, esses conjuntos tiveram a construção concluída anos após a entrega das

casas (Figuras 22 e 23), ou mesmo nunca saíram do projeto (OLÍMPIO, 2011). Pelas imagens do período de construção, é possível observar como a inserção do conjunto era precária pela implantação completamente desvinculada da malha urbana (Figura 24).

Figura 22 – Fotografia da construção do Cj. José Walter em área periurbana

Fonte: OLÍMPIO (2011).

Figura 23 – Construção das UHs do Cj. José Walter

Figura 24 – Fotografia aérea do conjunto José Walter à época da entrega das unidades, nos anos 1970

Fonte: DIAS (2013)

A produção habitacional do conjunto consistia em quatro diferentes tipologias de casas unifamiliares em lotes de 200m², que variavam em área edificada, número de cômodos e acabamentos. Cada tipologia estava associada a faixas salariais estratificadas, mas a escolha dos endereços ocorria mediante sorteio presencial dos beneficiários (Figura 25). O tipo “A” de planta correspondia a unidades de 38m², com sala, cozinha, varanda e dois dormitórios. O tipo “B”, planta utilizada em cerca de 50% das unidades produzidas, apresentava uma área de 47m² e se diferenciava do tipo “A” pelo acréscimo de um dormitório (Figura 26). O tipo “C” tinham o mesmo programa do tipo “B”, mas com áreas maiores no lugar da varanda mais reduzida. O tipo “D” mantinha o programa de 3 dormitórios, mas correspondia a uma habitação de maiores dimensões, com 58m², e melhor acabamento, inclusive sendo o único tipo a incluir a construção de um caixa d’água. O último tipo, “D”, correspondia a uma habitação mista tipo “duplex” conjugada, no qual o pavimento térreo se destinaria a atividade comercial e o pavimento superior, a uma habitação do tipo “A”. Essa planta de 66m² edificados foi utilizada em menos de 1% das unidades produzidas.

Figura 25 – Planta de implantação Cj. José Walter

Fonte: Acervo da COHAB-CE.

Figura 26 – Planta das casas conjugadas do tipo “B” no Cj. José Walter

Fonte: OLÍMPIO (2011).

A má inserção do Cj. José Walter na estrutura urbana e metropolitana de Fortaleza no período de inauguração desencadeou uma gama de problemas para os moradores. Em particular, a distância da moradia aos locais de trabalho e serviços, que agravados pelas poucas opções de transporte público, levava a necessidade de longas jornadas de deslocamento. As limitações no sistema de distribuição de energia elétrica e abastecimento de água – agravado pela enorme parcela de moradias construídas sem caixa d’água, apesar deste ser uma exigência do Código Urbano de 1962, vigente ao período – colaboravam para o quadro de precariedade do local.

Para além destas dificuldades, o padrão construtivo da COHAB-CE, afamado pela má qualidade projetual e de acabamentos também apresentava limitações qualitativas. Desde detalhes como janelas que abrem para fora – fator que impedia a colocação de grades de segurança externa e na prática levou a reinstalação das esquadrias no sentido reverso pelos moradores logo nos primeiros anos – e escolha de materiais – como a telha de amianto utilizada como coberta em todas as unidades, a intensificar o desconforto térmico e acústico, e também substituídas por telhas de barro em grande parte das unidades – a escolhas projetuais de reversão mais complicada como o pé-direito das unidades, abaixo das recomendações das regulações referentes às edificações nos anos 1970. O que se verifica, de fato, foi que a lógica de barateamento da produção na localização, na replicação do projeto e na construção célere acarretou em encargos à população atendida pelo programa.

A construção do José Walter foi tão significativa no período, pela escala e impacto na urbanização do setor da cidade, que hoje dá nome ao bairro em que se insere. Nas décadas desde sua implantação em 1973, verificaram-se muitas transformações nas dinâmicas urbanísticas, em particular pela provisão, ainda que atrasada, de equipamentos e melhorias nas infraestruturas, assim como a dinamização de usos e serviços – em grande parte pelas reivindicações ou mesmo construção autônoma dos moradores. Os lotes passaram pelo aumento das taxas de ocupação, muitas vezes chegando à ocupação máxima da edificação sobrepor por completo o perímetro do lote. As quadras de áreas livres e institucionais distribuídas nas pequenas unidades de vizinhança esboçadas no projeto original permaneceram sem grandes alterações (Figura 27).

Figura 27– Esquemas de implantação de quadras no Cj. José Walter

Figura 28 – Imagem de satélite de setor do Cj. José Walter

Fonte: Google Earth, 2015.

Dentro do perímetro original do conjunto, hoje cerceados por outras ocupações, verificou-se crescimento populacional – com mais de 22mil residentes– e adensamento construtivo, apresentando 6.504 residências permanentes no Censo 2010. Esse crescimento se deve, em particular, à verticalização de muitas edificações originais e desmembramento de lotes para construção de novas moradias (Figuras 28 e 29). A tipologia de lotes unifamiliares de 200m² facilitou a transformação do perfil morfológico das edificações do bairro pelos moradores, que descaracterizaram os projetos originais para melhor atenderem às suas necessidades habitacionais. Apesar dessas irregularidades urbanísticas, o PLHISFOR de 2012 não indica presença de assentamentos informais no perímetro do conjunto.

Figura 29 – Mapa das edificações no Cj. José Walter pela componente verticalização Fonte: Elaboração própria com dados da SEFIN (2015)

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