• Nenhum resultado encontrado

2.5. Participação Social

2.5.3 Conselhos Gestores de Desenvolvimento: lócus de participação cidadã

A atuação qualificada dos conselhos será alcançada pelos atores sociais na ação cidadã. Isso está expresso no pensamento de Gohn (2004), que identifica um aporte que traduz o sentido desta pesquisa quanto à participação social. Ela afirma que, na esfera pública, a participação da sociedade civil em Conselhos não deve jamais pretender substituir a ação estatal. Ao contrário, deve atuar empreendendo forças para que repercutam os diálogos e que o Estado cumpra deveres para com os direitos sociais de todos os cidadãos. Ela assim expressa:

Essa participação deve ser ativa e considerar a experiência de cada cidadão que nela se insere e não tratá-los como corpos amorfos a serem enquadrados em estruturas prévias, num modelo pragmatista (GOHN, 2004, p. 24).

Sobre a realidade da participação no país, a autora assim arremata:

A cidadania nos anos 1990 foi incorporada nos discursos oficiais e ressignificada na direção próxima à idéia (sic) de participação civil, de exercício da civilidade, de responsabilidade social dos cidadãos como um todo, porque ela trata não apenas dos direitos, mas também de deveres, ela homogeneíza os atores. Estes deveres envolvem a tentativa de responsabilização dos cidadãos em arenas públicas, via parcerias nas políticas sociais governamentais (...). No novo cenário, a sociedade civil se amplia para entrelaçar-se com a sociedade política, colaborando para o novo caráter contraditório e fragmentado que o Estado passa a ter nos anos 1990. Desenvolve-se o novo espaço público, denominado público não estatal, onde irão situar-se conselhos, fóruns, redes e articulações entre a sociedade civil e representantes do poder público para a gestão de parcelas da coisa pública que dizem respeito ao atendimento das demandas sociais. Essas demandas passam a ser tratadas como parte da “Questão Social” do país (GOHN, 2011, p. 22).

No Brasil, o processo de democratização a partir dos anos 90 consolidou medidas de descentralização de gestão administrativa, financeira e das políticas públicas. A chamada municipalização estabeleceu uma nova institucionalidade nos canais de participação da sociedade civil junto ao Estado na forma de conselhos gestores de políticas públicas, com atribuição de consulta, deliberação e controle social (VILLELA et al., p. 38).

Nas últimas décadas, a instalação de Conselhos se disseminou nos municípios brasileiros. Constituídos a partir de leis federais, foram progressivamente merecendo regulamentações para seu funcionamento em nível municipal. Em essência, são instâncias que reúnem a sociedade civil e os governos locais para formulação conjunta de diretrizes e estratégias de gestão, ao mesmo tempo em que, em tese, oportunizam a avaliação das ações de governo e alocação de recursos.

Como explicam Villela et al. (2017), conselhos gestores podem ser vistos como inovação e, necessariamente, caracterizam-se por elementos como os apresentados na figura 4, a seguir.

Figura 4 - Elementos característicos dos conselhos gestores

Fonte: Elaboração da pesquisadora a partir dos elementos relacionados por Villela et al. (2017).

Para os autores, os conselhos, enquanto espaços heterogêneos nos quais podem ser expressos interesses antagônicos, prestam-se, potencialmente, para manifestar posições diversas. A partir da correlação de forças estabelecida, podem ser lugares de efetivo controle social, ou seja, de exercício do direito da sociedade civil de fiscalizar as ações do poder público. Contudo, esse desenho organizacional da gestão pública brasileira para as institucionalidades focadas no desenvolvimento rural vem apresentando problemas e limites, ao ponto de, em nível das decisões dos governos locais, apresentarem-se como “meros espaços de consentimento das

ações do poder público sem sua real efetividade, tornando-se um meio de legitimação” (VILLELA et al., 2017).

Os mesmos autores relacionaram possíveis limitações na atuação dos Conselhos, como a seguir listado (Figura 5).

Figura 5 - Aspectos limitadores na atuação dos conselhos. Fonte: Elaboração da autora, a partir de Villela et al. (2017).

Também Zani (2012) elenca obstáculos que, além das fragilidades comumente identificadas nas administrações municipais, apresentam-se nos conselhos gestores: maior atenção às questões burocráticas; baixa qualificação técnica e política; representações encaradas como meras formalidades; falta de recursos para viabilizar a participação; fragilidade da base informacional que ampare as decisões. Além disso, o autor aponta escassa representação por jovens e mulheres; pouca interação entre os representantes; conflitos entre representantes de diferentes segmentos e a ausência de práticas de avaliação e monitoramento dos planos e projetos.

Jacobi (2003, p. 322), em mesmo sentido, alerta sobre a existência de “permanentes e tensos vínculos entre representação e participação”. Nos conselhos gestores deliberativos, de composição plural e paritária entre estado e Sociedade Civil, ainda que sejam arranjos institucionais atuando na lógica da responsabilização compartilhada, a grande indagação recai sobre a sua capacidade de empreender práticas realmente inovadoras para a efetiva democratização nos procedimentos de gestão (JACOBI, 2003). Nesses espaços de pensamentos tão plurais, segundo o autor, os conflitos que lhes são inerentes deveriam ganhar visibilidade e serem tratados mediante processos educativos. Tal entendimento encontra consonância

em Fischer (2002), que enfatiza a importância de uma pedagogia social nos processos gestionários.

Como frisa Jacobi (2003, p. 332), a “criação de condições para uma nova sociabilidade deve ser crescentemente apoiada em processos educativos orientados para a ‘deliberação pública”. É por essa maneira, na opinião do autor, que a presença da pluralidade de atores alcança a capacidade de participação sem tutelas para, assim, contribuir na institucionalização do controle social.

Para analisar o exercício e a qualidade da participação enquanto prática social, Mouffe (2003) demonstra posição radical de democracia e considera que posições antagônicas e, por efeito, os dissensos, estão sempre presentes e devem ser valorizados. Como destaca em sua argumentação, o desejável seria “uma esfera pública vibrante onde muitas visões conflitantes podem se expressar e onde há possibilidade de escolha entre projetos alternativos legítimos” (MOUFFE, 2003, p. 11).

Em geral, a bibliografia vem demonstrando tendências de fragilidade desses espaços institucionalizados para a promoção do desenvolvimento, assim como lançando forte dúvida sobre sua efetividade enquanto lugares de deliberação cidadã. Por esse pensamento é que, enquanto arena de diálogos, os conselhos precisam ter questionada a sua real abertura para a expressão das distintas identidades que compõem as sociedades rurais.

Esse é o aporte teórico que respalda o propósito de conhecer e analisar práticas e percepções a respeito da participação igualitária no âmbito de uma institucionalidade de deliberação.

3 Metodologia

A pesquisa social sempre se refere a um se refere a agir estratégico em que se objetiva respostas a um questionamento sobre um fenômeno social específico. Em favor desse processo, dois movimentos se apresentam: primeiro, o de a prefiguração da experiência de pesquisa, que prevê as práticas de coleta, de tratamento e de análise dos dados empíricos e, depois, o de sua reconstrução (CARDANO, 2017).

A figura abaixo apresenta o delineamento dado à pesquisa empreendida, o qual prefigurou a sua implementação.

Figura 6 - Prefiguração da pesquisa Fonte: Elaboração da autora.