Performance of Cockfighting in Northeast Brazil: Animal Rights Threatened by permissive law
7. Considerações finais
A partir do exposto, percebe-‐‑se que no Brasil tanto as dis- putas de galo como eventos a exemplo da farra do boi, os ro- deios e vaquejadas ainda realizados são interpretados como manifestações culturais. E esta classificação pode colocar em risco, entre outros, a espécie de galo utilizada para as brigas. Atribuir estas práticas como integrante do “meio ambiente cul- tural” claramente representa argumento para a continuidade
dos eventos que permitem/provocam as lesões, mutilações e até a morte destas aves ditas combatentes.
Observa-‐‑se que, mesmo em face da legislação que protege a fauna, as atuais normas e doutrina do direito ambiental podem ser permissivas, pois geram interpretações da justiça favoráveis às rinhas de galo. Os preceitos legais e constitucionais entram em conflito quando se trata de meio ambiente natural e meio ambiente cultural. Como se constata, a prática das rinhas traz a identificação de valores da região ou população, no caso, os Estados da Paraíba e Rio Grande do Norte. Constituem uma manifestação cultural tutelados também pelo Direito Ambiental. Porém a referida atividade se confronta com o dispositivo cons- titucional previsto no art. 225, § 1o, VII, o qual proíbe que ani- mais sejam submetidos a práticas cruéis (BRASIL, 1988).
No caso das rinhas, tem-‐‑se claro que é irrelevante se o ani- mal sacrificado está ou não em extinção, pois é dever do poder público que toda a fauna seja protegida, uma vez que o direito ambiental se preocupou com a totalidade do ambiente. Ora, o fato de se retirar um animal de seu habitat – no
caso dos galos são criados em cativeiro e levados para uma arena de lutas – já pode-‐‑se considerar uma situação que provoca o estresse das aves. Portanto, os maus tratos sempre estarão pre- sentes, até porque os animais são estimulados para o combate.
Qualquer controvérsia acerca da permissão ou não das rinhas de galo pode ser dirimida com base na lei maior, que claramente as proíbe. A determinação do artigo 225 da Constituição assegu- ra à coletividade um meio ambiente ecologicamente equilibrado e incumbe ao Poder Público a tarefa de protegê-‐‑lo, de forma que as gerações futuras também utilizem esses mesmos recursos. A fauna é, portanto, protegida nesse mesmo dispositivo, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem maus tratos e/ou submetam os animais à crueldade
Ainda acerca da proteção animal, percebe-‐‑se que ocorre no Brasil um fenômeno no mínimo curioso: a partir do surgimen-
to de importante aparato legal protetor dos animais, verifica-‐‑se um processo tardio de conscientização social sobre os direitos da fauna. Trata-‐‑se da típica situação em que a lei tenta modificar costumes e comportamentos já enraizados pela população.
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Recebido: 15.07.2012 Avaliado em 20.11.2012
C
:
*
Diego Breno Leal Vilela**, Maria da Graça Silveira Gomes da Costa***
R : Na contemporaneidade, o mercado econômico aparece como espaço privilegiado para a ação dos novos movimentos sociais. Nessa perspectiva, as escolhas de consumo passam a levar em conta valores éticos que ultrapassam questões econômicas comumente ligadas ao consumo. Partindo de um estudo etnográfico junto a um grupo ve- gano/punk/anarquista na cidade de Campina Grande – PB, esse arti- go tem como objetivo demonstrar como o veganismo, na medida em que promove opções diferenciadas de consumo, pode ser considerado uma forma de consumo político, e, por conseguinte, também de ativis- mo. Para o vegano, o não consumo de carne, antes de ser fruto de uma dieta alimentar, é, com efeito, consequência de um posicionamento ético e político que pode ser caracterizado como anti-‐‑especista. Ao uti- lizarem de estratégias e ações políticas como boicotes às empresas que exploram os animais, ou a reciclagem de alimentos, percebemos que, longe de ser um ato inocente, o processo de escolha da compra ou não-‐‑compra de mercadorias são capazes de expressar relações sociais e valores que se relacionam ao consumo, sobretudo na forma de con- sumo político que expressam e refletem, de fato, verdadeiras visões de mundo ou maneiras particulares de interpretar a realidade. Assim, o consumo se apresenta como um meio eficaz e objetivo de atuar ético e politicamente na sociedade.
P -‐‑ : Ativismo. Veganismo. Consumo político. Observa- ção participante.
* Trabalho apresentado no 3º Congresso Mundial de Bioética e Direito dos Animais,
reali zado entre os dias 22 a 25 de agosto de 2012, na cidade do Recife-‐‑PE.
** Mestrando do Programa de Pós-‐‑Graduação em Antropologia Social da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
A : Nowadays, the economic market appears as a privileged space for the action of new social movements. From this perspective, consumption choices are to take into account ethical values beyond economic issues commonly associated with the consumption. Based on an ethnographic study with a group vegan / punk / anarchist in Campina Grande -‐‑ PB, this article aims to demonstrate how veganism, in that it promotes consumption of different options can be considered a form of political consumption and therefore also of activism. For the vegan, non-‐‑consumption of meat, before being the result of a diet is in fact the result of an ethical and political environment that can be characterized as anti-‐‑speciesist. By using strategies such as boyco s and political actions to companies that exploit animals, recycling or food, we realized that, far from being an innocent act, the process of choice of purchase or non-‐‑purchase of goods are capable of expressing social relations and values that relate to consumption, particularly in the form of political consumption that express and reflect, in fact, true worldviews or particular ways of interpreting reality. Thus, consump- tion is presented as an effective and objective of acting ethically and politically in society.
K -‐‑ : Activism. Veganism. Political consumption. Participant observation.
S : 1-‐‑Introdução; 2-‐‑ Veganismo e consumo político e alimenta- ção; 3 -‐‑ A cozinha enquanto lugar estratégico: quebrando o tabu do sabor, seduzindo pelo paladar; 4 -‐‑ Considerações Finais; 5-‐‑ Referên- cias Bibliográficas.
1. Introdução
Em um cenário onde os mercados econômicos ocupam um lugar central, várias pessoas, grupos e movimentos sociais têm buscado formas inovadoras de agir politicamente. Neste contex- to, mais do que o Estado, as instituições e a própria esfera polí- tica, é o mercado que está aparecendo como espaço privilegiado de ação dos chamados novos movimentos sociais. Esses atores estão passando a construir “uma nova cultura de ação política visando a reapropriação da economia a partir de valores pró- prios” (Portilho, 2009, p. 204).
Neste contexto – onde o mercado passa a ser apropriado por sujeitos que desejam lhe conferir outros valores, redefinindo as relações ente produtor e consumidor – o campo do consumo passa então a ocupar um papel de suma importância, na medida em que, cada vez mais, o sucesso da proposta de se construir um mercado mais sustentável e menos predatório, depende, dire- tamente, da politização do consumo. Na perspectiva de Nunes (2010),
O consumo politizado (ou político, ou engajado) representa a ação de indivíduos ou grupos de indivíduos que fazem escolhas entre produ- tores ou fabricantes e seus produtos com o objetivo de alterar ( ou ao menos tentar alterar), de maneira objetiva, as práticas de mercado. Suas escolhas são baseadas em atitudes e valores que levam em conta a justiça, a ética ou outras razões não econômicas. Consumidores poli- tizados são pessoas que se engajam em situações que envolvem fazer escolhas (as escolhas engajadas). (NUNES, 2010, P. 16)
Para pensar apenas em alguns exemplos, é neste sentido, que grupos de feministas promovem o boicote a marcas de cerve- ja que disseminam a imagem da mulher enquanto objeto, que grupos de pacifistas não consomem uma dada marca de refri- gerante que financia uma guerra e que veganos não consumem uma infinidade de produtos de empresas que realizam testes em animais.
De acordo com Portilho (2008), “o que designamos, gene- ricamente, por movimento de consumidores parece represen- tar, pelo menos, três categorias distintas de movimento social, com objetivos e ações, às vezes, bem diferentes entre si”. São eles: os movimentos de defesa dos direitos dos consumidores. Os movimentos anticonsumo e os movimentos pró-‐‑consumo responsável.
Nesse texto, trataremos do caso de um grupo de veganos – e também punks/anarquistas – que se situam no limiar entre o se- gundo e o terceiro tipo de movimento de consumidores aponta- dos acima. O conjunto de ideias e questões que estão implicadas
no termo veganismo, pode se desdobrar em várias formas de agir politicamente.
Nosso objetivo, é demonstrar, na prática, ou seja, a partir das ações desempenhadas pelos sujeitos aqui em questão, que o ve- ganismo, na medida em que promove opções diferenciadas de consumo, pode ser considerado uma forma de consumo políti- co, e, por conseguinte, também de ativismo.
Para alcançar os objetivos propostos, apresentaremos aqui uma etnografia que narra e descreve, situações práticas e coti- dianas que nos permitem refletir sobre as questões que estão em jogo no ato da compra de um dado produto para os sujeitos do qual estamos tratando. Os fatos aqui narrados são frutos de uma experiência de vivência/pesquisa ocorrida entre os anos de 2008/2009 na cidade de Campina Grande, quando tive a oportu- nidade de dividir o mesmo espaço com esses sujeitos. A meto- dologia utilizada foi a observação participante, sendo realizada também entrevistas abertas.
Diante da carência de investigações sobre o consumo político no Brasil, tentaremos neste trabalho dar uma contribuição mais empírica/etnográfica que teórica, para esse campo de estudos que se apresenta como novo e cheio de possibilidades.