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Considerações clínicas e laboratoriais

4. Discussão e Conclusões

4.4. Considerações clínicas e laboratoriais

A primeira questão que se coloca prende-se com a utilização da noção de febre não quantificada mantida e/ou frequente como critério de inclusão. Em países de baixa e média renda a percepção de febre não é totalmente precisa pois raramente é avaliada por recurso a termómetros; inclusive algumas unidades sanitárias também não dispõem deste instrumento. A percepção materna e o toque para detectar febre sobretudo em crianças, apesar de ser uma prática comum, está longe de ser um método eficaz e preciso da avaliação da temperatura corporal. No entanto, muitos técnicos de saúde consideram que a percepção subjectiva da existência de febre é suficiente e em algumas zonas endémicas de malária não é invulgar a alta hospitalar com a prescrição de antipalúdicos e/ou antibióticos sem quantificação e confirmação do estado febril (Singh et al., 2003).

Em termos da evolução da febre, a larga maioria dos doentes incluídos no estudo reportou uma duração inferior a 21 dias, o que em termos teóricos, é totalmente enquadrável num quadro clínico de arbovirose. Apenas foram incluídos 1,6% e 1% do total das amostras do Huambo e de Benguela, respectivamente, com uma duração superior a 21 dias. O motivo de inclusão destes doentes relacionou-se com o preenchimento dos restantes critérios de inclusão, nomeadamente uma clínica compatível com malária.

A percentagem de doentes febris aquando da admissão no estudo foi de 26,3% na província de Benguela e de 31,8% na província do Huambo.

Verificou-se uma diferença entre ambas as fases no que concerne a sintomatologia mais relevante. Enquanto na província do Huambo houve um predomínio da clínica respiratória (tosse e corrimento nasal) seguida das queixas álgicas, na província de Benguela ocorreu o inverso. A presença de hemorragias e/ou exantemas foi residual em ambas as fases. Por outro lado a existência de palidez cutâneo-mucosa já foi relevante

Discussão e Conclusões

esplenomegália com maior expressão na província de Benguela correlacionaram-se com a existência de um TDR positivo para malária.

A realização de PCR para Plasmodium spp. na primeira fase do estudo demonstrou uma

óptima performance do TDR utilizado, uma vez que dos 5 doentes com um TDR positivo para malária, apenas um teve um resultado negativo por PCR. Por outro lado, dos 42 doentes que tiveram relatada uma pesquisa de Plasmodium spp. como positiva

por microscopia óptima, somente 4 tiveram confirmação por PCR (todos com um TDR positivo). Pelo exposto, a realização de PCR para o diagnóstico de malária foi considerada como redundante, razão pela qual não foi contemplada na segunda fase do estudo.

O registo de malária clínica sem confirmação laboratorial e/ou de malária com uma gota espessa negativa, apesar de não ter sido evidenciado nos doentes incluídos neste estudo, uma vez que em todos os casos de malária com TDR negativo existiu uma referência a uma microscopia positiva, era uma prática comum das equipas clínicas locais como se pode constatar na figura 16. Acresce-se ainda que numa expressiva maioria dos casos relatados como tendo uma microscopia positiva não ocorreu a confirmação por métodos de biologia molecular (PCR), situação que merece uma reflexão sobre as práticas e a experiência laboratorial a nível local. Deste modo, na província do Huambo ficou bem patente que os prescritores locais não decidem em função do resultado do TDR para a malária.

No que diz respeito ao verificado na província de Benguela, dos 77 casos relatados como tendo uma pesquisa positiva de Plasmodium spp. por microscopia óptica, apenas dois tiveram um TDR negativo. Recorde-se que em ambas as fases foi aplicado o mesmo TDR.

A incerteza que floresce reside na anuência e na actuação em conformidade com o resultado do TDR para malária por parte dos prescritores locais, especialmente em épocas de baixa prevalência de malária. Nestas circunstâncias, perante uma clínica compatível com malária e um resultado negativo do TDR, os prescritores locais colocam frequentemente esse resultado em causa. Contudo, não devemos negligenciar a falta de recursos e de técnicas laboratoriais para o diagnóstico diferencial, que poderão ser inexistentes nesses locais de trabalho.

Discussão e Conclusões

A taxa de positividade por RT-PCR para dengue e para chikungunya f o i m u i t o b a i x a (0% para dengue e 2,1% para chikungunya) na província de Benguela e foi nula na província do Huambo. Como factores pré-analíticos eventualmente contributivos para este facto devem ser mencionados as dificuldades na manutenção da cadeia de frio e no transporte das amostras. Apesar das amostras terem sido conservadas a uma temperatura de -20 °C, as dificuldades de um fornecimento contínuo de energia eléctrica (rede pública e/ou gerador a gasóleo) foram uma realidade podendo eventualmente ter existido 1 ou 2 ciclos de descongelação incompleta durante as fases de conservação e de transporte das amostras. Outro factor a considerar deve ser a fase da doença em que a colheita da amostra foi realizada, nomeadamente se fora do período de virémia.

No que diz respeito à utilização do TDR para chikungunya, continua por clarificar a sua aplicabilidade clínica embora existam dois estudos que apontam para uma baixa performance do TDR utilizado neste estudo, referindo uma sensibilidade de 30% e de 50,8% e uma especificidade de 73% e de 89,2% (Prat et al., 2014; Kosasih et al., 2012). Estes resultados são contraditórios com os mencionados no folheto informativo do TDR

SD BIOLINE® Chikungunya IgM, que reporta uma sensibilidade de 97,1% e uma

especificidade de 98,9% (Standard Diagnostics, 2008). No entanto, refira-se que o TDR para chikungunya utilizado neste trabalho não foi usado com o intuito de avaliar a sua performance mas sim como a única ferramenta diagnóstica disponível nas condições do terreno mesmo com as suas limitações.