• Nenhum resultado encontrado

Nosso problema inicial era compreender como a dimensão ideológica do jornalismo é percebida pelos estudantes. A própria natureza do questionamento nos guiou para tentar respondê-lo através de uma investigação que nos mantivesse em contato direto com nosso objeto empírico. Por isso escolhemos orientá-la a partir dos pressupostos do Interacionismo Simbólico. As leituras que fizemos sobre esta escola de pensamento nos permitiram compreender a construção da identidade do ser humano por um viés social a partir da sua relação com o outro, seja este um indivíduo ou, como no caso deste estudo, uma ideologia que se faz presente no plano simbólico. O diálogo que se estabelece nesta relação é que irá produzir sentido entre seus atores.

Por outro lado, também precisamos revisitar a construção da dimensão ideológica do jornalismo. Isso porque precisávamos apreender como ela é estabelecida, quais suas principais representações e como o campo jornalístico age para mantê-la importante para a sociedade.

Assim, ao final deste trabalho pudemos entender que a dimensão ideológica do jornalismo, com toda sua cultura, valores, mitos e representações profissionais, participa da construção identitária dos estudantes do Curso de Jornalismo da UFRN atuando na instância do outro generalizado (MEAD, 2010), tal qual um conjunto de atitudes dos membros desta comunidade, contribuindo para a construção do self do indivíduo tornando-o um sujeito jornalista. Apesar de o mercado de trabalho e o ensino em jornalismo compartilharem aspectos desta dimensão, eles divergem em alguns pontos – o que é compreensível, dados os objetivos de cada campo – permitindo que este outro generalizado apresente diversos espectros pelos quais a percepção do estudante pode caminhar ao longo da sua formação: do mítico jornalista que representa a sociedade, a democracia e os valores como a liberdade e a independência, a aquele que, simplesmente, desiste da profissão por motivos financeiros.

Dissemos que a percepção do aluno pode caminhar entre os espectros do outro generalizado, porque é individualmente que ele vai construir os sentidos sobre os discursos que lhe são oferecidos. E, justamente para compreender estes sentidos que, neste ponto, retomamos as ideias de Blumer (1980) sobre a natureza do pensamento do interacionismo simbólico, reunidas por ele em três premissas.

A primeira estabelece que os seres humanos agem em relação ao mundo fundamentando-se nos significados oferecidos por ele [...]; A segunda premissa consiste no fato de os significados de tais elementos serem provenientes da ou provocados pela interação social que se mantém com as demais pessoas. A terceira premissa reza que tais significados são manipulados por um processo interpretativo (e por este modificados) utilizado pela pessoa ao se relacionar com os elementos com que entra em contato (BLUMER, 1980, p.119).

Tendo elas em vista, entendemos que a sociedade potiguar ainda oferece aos seus indivíduos a ideia da formação superior para o exercício da atividade de jornalista, o que é um ganho se observado pelo viés daqueles que lutam pela obrigatoriedade do diploma nesta época. Isso move estas pessoas a agirem no sentido de buscar uma instituição que possa atendê-los e que, historicamente, é responsável pela inclusão de seus egressos no mercado de trabalho. Apreendemos estes significados porque eles estão presentes nos discursos de todos os estudantes que participaram desta pesquisa, seja revestido de influência familiar ou de uma relação próxima com os produtos midiáticos ou, ainda, pelas características que o indivíduo julga ter para exercer a profissão de jornalista.

Neste sentido, tanto a universidade quanto o mercado de trabalho tornam-se mundos dos quais os estudantes extraem os significados a fim de construírem os seus próprios mundos jornalísticos. São as relações desenvolvidas entre o aluno e estas duas instâncias, inclusive com seus atores (profissionais, professores, colegas de turma, funcionários administrativos, etc.) que fornecem tais significados. É a interpretação deles que define qual espectro do outro generalizado está participando da formação do futuro jornalista.

Por fim, lembramos que este é um trabalho de interpretação de significados oriundos de processos relacionais entre o pesquisador e o seu mundo. Nossas motivações guiaram nosso olhar, nossa leitura, nossos diálogos e, consequentemente, produziu novos sentidos. Certamente, também, estamos saindo deste trabalho modificados.

REFERÊNCIAS

ABIB, J. A. D. Teoria social e dialógica do sujeito. In. Psicologia: Teoria e Prática. São Paulo. Mackenzie; v.7 n.1. p. 97-106. 2005.

ADGHIRNI, Z. L. O jornalista: do mito ao mercado. Estudos em Jornalismo e Mídia. v. 2, n. 1, p. 45-57. 1º semestre 2005.

AVANZA, M. F.; CASADEI, E. B. A cultura profissional dos estudantes de jornalismo: o desenho de um lugar social. 10º Encontro da SBPJor. Anais... Curitiba, PUC, 2012.

Disponível em < http://soac.unb.br/index.php/ENPJor/XENPJOR/paper/view/2023>. Acesso em 02.07.2013.

BARBOUR, R. S. Grupos focais. Porto Alegre: Bookman Artmed, 2009 BECKER, H. S. A Escola de Chicago. Mana. v. 2, n. 2, p. 177-188, 1996.

BLUMER, H. A natureza do interacionismo simbólico. In, MORTENSEN, C. D. Teoria da

Comunicação. São Paulo: Mosaico, 1980.

BOURDIEU, P. Sobre a televisão: seguido de a influência do jornalismo e os jogos olímpicos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor,1997.

______. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,1998.

DECOM - DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DA UFRN. Projeto Pedagógico Decom 2000. Natal, 1999.

DEUZE, M. Journalism studies beyond media: on ideology and identity. Ecquid Novi: African Journalism Studies, v. 25, i. 2, 2004. P. 275-293. Routledge. Disponível em <http://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/02560054.2004.9653298>. Acesso em 15/12/2015.

DEUZE, M. what is journalism? Professional identity and ideology of journalists

reconsidered. Journalism, v. 6, i. 4, 2005. p. 442-464. SAGE Publications. Disponível em <http://jou.sagepub.com/content/6/4/442.short>. Acesso em 15/12/2015.

DIAS, R. Um retrato de quem retrata o mundo: uma compilação de representações sociais e da identidade profissional do jornalista. Mediação, v. 14, n. 14, p. 151-166 jan./jun. de 2012. DUBAR, C. A socialização: construção das identidades sociais e profissionais. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

______. A crise das identidades: a interpretação de uma mutação. São Paulo: Edusp, 2009. ______. A construção de si pela atividade de trabalho: a socialização profissional. Cadernos

de Pesquisa v. 42 n.146 p.351-367 maio/ago. 2012.

ENNES, M. A. Interacionismo simbólico: contribuições para se pensar os processos identitários. Perspectivas, São Paulo, v. 43, p. 63-81, jan./jun. 2013.

FEMINA, C.; MAIA, K. Os valores sociais e o mercado de trabalho para os estudantes de jornalismo da ufrn: considerações sobre uma dialética para o cotidiano. 4º Conferência ICA para a América Latina. Anais... Brasília, UnB, 2014, p. 515-520. Disponível em

<www.ica2014.com.br>. Acesso em 07.09.2014.

FIDALGO, J. Jornalistas na busca inacabada de identidade. In. 4º Congresso Sopcom. Livro

de Actas... Aveiro: Universidade de Aveiro, 2005, p. 1322-1333. Disponível em <

http://repositorium.sdum.uminho.pt/handle/1822/7435>. Acesso em 19.05.2015.

GATTI, B. A. Grupo Focal na pesquisa em Ciências Sociais e Humanas. Brasília: Liber Livro, 2012.

GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1999.

KIND, Luciana. Notas para o trabalho com a técnica de Grupos Focais. Psicologia em

Revista. Belo Horizonte, v.10 n. 15 jun. 2004. p. 124-136.

LOPES, F. L. Ser jornalista no Brasil: identidade profissional e formação acadêmica. São Paulo: Paulus, 2013.

LUBISCO, Nídia Maria Lienert (org.). Manual de estilo acadêmico: monografias, dissertações e teses. 4. ed. revista e ampliada. Salvador: EDUFBA, 2008.

MAIA, K.; FEMINA, C. Os valores profissionais dos estudantes da UFRN: comunicação corporativa, entretenimento e jornalismo. Revista Brasileira de Ensino de Jornalismo, Brasília, v. 2, n. 11, p. 82-94, jul./dez. 2012

MARCONDES FILHO, C. Ser jornalista: o desafio das tecnologias e o fim das ilusões. São Paulo: Paulus, 2009.

MARQUES, Angela Cristina Salgueiro; ROCHA, Simone Maria. A produção de sentidos nos contextos de recepção: em foco o grupo focal. Revista Fronteiras - Estudos Midiáticos. v. VIII n. 1. jan-abr 2006. p. 38-53.

MEAD, G. H. A brincadeira, o jogo e o outro generalizado. Pesquisas e Práticas

Psicossociais v. 5, n. 1, São João del-Rei, p. 131-136, janeiro/julho 2010.

MELLADO, C. et all. A pré-socialização dos futuros jornalistas: uma investigação das

percepções profissionais de estudantes de jornalismo em sete países. 10º Encontro da SBPJor.

Anais... Curitiba, PUC, 2012. Disponível em <

http://soac.unb.br/index.php/ENPJor/XENPJOR/paper/view/2023>. Acesso em 02.07.2013. NEVEU, E. Sociologia do jornalismo. São Paulo: Loyola, 2006.

OLIVEIRA, M. R. Profissão jornalista: um estudo sobre representações sociais, identidade profissional e as condições de produção da notícia. 2005, 225 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação). Programa de Pós-Graduação em Comunicação, Unesp, Bauru, 2005. PENA, F. Teoria do jornalismo. São Paulo: Contexto, 2006.

PEREIRA, F. O jornalista on-line: um novo status profissional? Uma análise sobre a

produção da notícia na internet a partir da aplicação do conceito de ‘jornalista sentado’. 2003, 187 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação). Programa de Pós-Graduação em

Comunicação, UnB, Brasília, 2003.

______. Jornalistas-intelectuais no Brasil. Identidades, práticas e transformações no mundo social. 2008, 469f. Tese (Doutorado em Comunicação). Programa de Pós-graduação em Comunicação, UnB, Brasília, 2008.

______. O mundo dos jornalistas: aspectos teóricos e metodológicos. Intercom – Revista

Brasileira de Ciências da Comunicação. São Paulo, v. 32, n. 2, p. 217-235, jul./dez. 2009.

PEREIRA, F.; SOUZA, J. Valores e cultura profissional dos estudantes de jornalismo em Brasília. Formação e pré-socialização. 10º Encontro da SBPJor. Anais... Curitiba, PUC, 2012. Disponível em < http://soac.unb.br/index.php/ENPJor/XENPJOR/paper/view/2023>. Acesso em 02.07.2013.

QUADROS, C.; LARANGEIRA, A. Da perspectiva de trabalho à realidade do futuro

profissional do jornalismo. 10º Encontro da SBPJor. Anais... Curitiba, PUC, 2012. Disponível em < http://soac.unb.br/index.php/ENPJor/XENPJOR/paper/view/2023>. Acesso em

02.07.2013.

SENA, P. R. C. O sertão potiguar comunica: Midiatização e Práticas Sociais. Ou como a recepção da pauta política se desdobra em práticas sociais em Pau dos Ferros. 2011, 101 f. Dissertação (Mestrado em Estudos da Mídia). Programa de Pós-Graduação em Estudos da Mídia, UFRN, Natal, 2011.

STRAUSS, A. Espelhos e máscaras: a busca de identidade. São Paulo: Edusp, 1999. TRAQUINA, N. O estudo do jornalismo no século XX. São Leopoldo: Unisinos, 2001. ______. Teorias do Jornalismo. Por que as notícias são como são. v. 1. Florianópolis: Insular, 2005.

______. Teorias do Jornalismo. A tribo jornalística – uma comunidade interpretativa transnacional. v. 2. Florianópolis: Insular, 2013.

TRAVANCAS, I. O mundo dos jornalistas. São Paulo: Summus, 1993.

VICTORIANO, F.; DARRIGRANDI, C. Representación. In. SZURMUK, M.; IRWIN, R. M.

Diccionário de estudios culturales latinoamericanos. México: Siglo XXI, 2009.

ZANATTA, M. S. Nas teias da identidade: contribuições para a discussão do conceito de identidade na teoria sociológica. Perspectiva, Erechim. v. 35, n. 132, p. 41-54,

ANEXO I – TEMAS CHAVES PARA O QUESTIONÁRIO DO GRUPO FOCAL

Documentos relacionados