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Em novembro de 1926, Gramsci é preso pela polícia fascista e, ao perceber que sua estadia na prisão seria longa, passou a refletir sobre os motivos de sua derrota pessoal, que se relacionava com a derrota do movimento revolucionário na Itália e no Ocidente.

Com seu corpo aprisionado, mas ainda com sua mente em movimento – imagina continuar sua tarefa de militante comunista – mesmo que as condições carcerárias lhe trouxessem problemas de saúde e inúmeras dificuldades.

Revolução, revolução passiva, partido, hegemonia, Estado, cultura, escola, filosofia, senso comum, bom senso e tantas outras categorias e temas são mobilizados em um ritmo próprio e não linear, mas, em um sentido muito claro: o da revolução comunista.

O que o presente trabalho procurou demonstrar é que é nesse sentido que sua filosofia da educação deve ser entendida, isto é, ao mesmo tempo como um fim e um meio para a efetivação de uma nova ordem, capaz de forjar uma nova forma de vida e um novo tipo de ser humano.

A forma de vida burguesa é cotidianamente construída por uma complexa engenharia política que tem como tarefa naturalizar aquilo que é essencialmente histórico, social e político. Foi a partir desse pressuposto que Gramsci articulou categorias como Estado, cultura, bloco histórico, hegemonia, intelectuais, educação e outras.

Centrando suas análises nos elementos da política, Gramsci iluminou o caminho para o combate à forma de vida burguesa, ao capitalismo, tendo em vista a construção de uma sociedade comunista. A nova ordem!

Nessa empreitada, nessa luta filosófica / educacional/ política, Gramsci reelabora a estratégia revolucionária para países de formação social mais complexa, marcada pela distinção não geográfica que ele faz entre Oriente e Ocidente.

Depois da análise dos paradigmas francês e russo, sugere, influenciado por Engels, uma mudança na estratégia revolucionária aplicada até então pelos comunistas: a superação da guerra de movimento pela incorporação da guerra de posição. Não se trata da substituição de uma pela outra, mas da incorporação, em uma relação dialética que levaria em conta sempre a correlação de forças políticas de cada momento.

Em parte, é nesse contexto que se incorporam à estratégia revolucionária a luta cultural e, assim, a luta por educação. A luta por educação é então condição para o sucesso da estratégia revolucionária, ou seja, um meio para sua realização. Mas não só isso! A educação não é um simples instrumento da política e da luta revolucionária. Ela é também um fim, uma

utopia de um mundo em que os subalternos deixem de ser subalternos e possam ter acesso a um desenvolvimento humano unitário e integral.

Esse debate é importante, pois ele realoca em termos mais precisos as polêmicas intermináveis entre escola formal e informal; entre educação comunista antes e depois da revolução. É evidente que Gramsci constrói, no Caderno 12, um programa de escola unitária, que ele acredita ser o modelo de educação comunista. No entanto, não há nada em seus escritos que sugira a ideia etapista de que a luta por essa escola não possa ser empreendida desde já, e nem que a escola pública do Estado deva ser abandonada ou não tenha importância por ser uma instituição capitalista. Tanto a filosofia quanto a prática gramsciana negam veementemente esses pensamentos mecanicistas. (Aliás, para o autor não se separa a filosofia da prática.)

A luta por acesso, pela permanência e pela socialização dos conhecimentos socialmente construídos é o indicativo da filosofia educacional de Gramsci, bem como a relação democrática entre dirigentes e dirigidos. Seja nas escolas formais, na relação entre professores e alunos, seja nas escolas não formais, como redações de jornais, revistas e inclusive nas relações entre camaradas e companheiros do partido.

Se Gramsci acredita em um primado do conhecimento, em que aquele que sabe mais dirige o que ainda está em processo de desenvolvimento, por outro lado, não há lugar em seu pensamento para a ideia de que esse saber mais seja instrumento de dominação e opressão. Utopicamente e politicamente, desmantelar essa distinção entre dirigente/dirigido e garantir que o que sabe menos receba a educação para que possa substituir – se necessário –, o que sabe mais, são tarefas da escola e do partido – pois o partido é também uma escola.

É então um projeto de cultura, de modo de vida, comunista e democrático. Não uma democracia formal, liberal e burguesa. Mas uma democracia viva, operária, em que dialeticamente representante e representado formem uma unidade orgânica em um modelo de sociedade unitário.

Por fim, acredito que a filosofia política e educacional de Gramsci fornece elementos para guiar nossa ação como educadores para os dias de hoje. Em um momento em que reformas educacionais são propostas no sentido de garantir tipos distintos de educação para filhos das classes subalternas e filhos das elites dominantes, a atualidade das ideias do autor parece evidente.

Os excertos gramscianos são também elucidativos não apenas para desvendar os modelos educacionais propostos por aqueles que historicamente constroem a subalternidade cotidiana dos trabalhadores, mas também para uma visão crítica das formas de agir dos

modelos de educação e de representação implementados pelos partidos que se apresentam como representantes dos subalternos.

Será que, no Brasil, esses partidos têm um projeto de educação e participação política coerente com as tarefas sugeridas por Gramsci?

Essa pergunta parece central àqueles educadores comprometidos com a ampla e irrestrita socialização do saber construído historicamente pela humanidade. Na verdade, é uma pergunta a ser feita e respondida por todos que vislumbram uma sociedade menos desigual.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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