O comportamento reprodutivo humano é um dos que mais desperta interesse, e
são vastas as pesquisas acerca das preferências românticas e da seleção de parceiros
(Buston & Emlen, 2003; Castro & Lopes, 2011; Castro et al., 2012; Kniffin & Wilson,
2004; Miller et al., 2002; Lippa, 2007; Schmitt, 2005), mas poucas são as que se inte-
ressam no relacionamento estável pós-escolha, como os casamentos e uniões estáveis
(Buckle et al. 1996; Kaighbadi et al., 2010; Shackelford et al., 2005). Destes a maioria
foca nas estratégias de retenção de parceiros (Kaighbadi et al., 2010; Miner et al.,
2009; Shackelford et al., 2005), e poucos são os trabalhos sobre as diferenças sexuais
(Buunk et al., 2002; Weisfeld et al., 2011) e o amor no relacionamento romântico
(Contreras et al., 1996; Lucas et al., 2008; Schmitt, 2006).
Na sociedade ocidental, o amor romântico é um sentimento muito importante
para os relacionamentos românticos a ponto de, atualmente, a grande maioria deles se
fundarem em cima desse sentimento. Hoje podemos dizer que o amor romântico é tão
antigo quanto a humanidade, sendo considerado pela maioria dos antropólogos como
parte da cultura universal (Lieberman & Hatfield, 2006; Jankowiak & Fisher, 1992).
Como dito por Lieberman e Hatfield (2006), o amor romântico é considerado como o
sine qua non do casamento. Para evidenciar isso foi desenvolvida “A Pergunta”: na
metade de 1960, Kephart (1967) perguntou a vários universitários: “Se um homem
(mulher) tivesse todas as qualidades que você deseja, você se casaria com ele(a) se
você não estivesse apaixonado(a) por ele(a)?”. Kephart (1967) encontrou que os ho-
mens consideravam a paixão como essencial e que as mulheres eram mais práticas di-
zendo que a ausência do amor romântico não faria com que elas desconsiderassem a
possibilidade de casamento. Desde então vários pesquisadores continuaram a fazer “A
mandam cada vez mais a presença do amor no casamento (Lieberman & Hatfield,
2006). Atualmente, jovens homens e mulheres de muitos países (inclusive do Brasil)
consideram o amor romântico como pré-requisito para o comportamento de corte e
casamento. Apenas em poucos países Orientais, com uma cultura coletivista e baixo
poder socioeconômico, consideram o amor com um luxo no relacionamento (Lieber-
man & Hatfield, 2006).
Diante disso, nos propusemos a pesquisar sobre o que é o amor romântico, de-
vido a uma carência de definição do construto que encontramos na literatura, e pela
possibilidade de sua utilização em pesquisas sobre relacionamentos estáveis, em espe-
cial sobre a satisfação nesses relacionamentos. Para tal, escolhemos utilizar o Marria-
ge and Relationship Questionnaire (Russel & Wells, 1986) em especial a sua Escala
Amor que foi desenvolvida para medir o vínculo emocional no contexto de relaciona-
mentos estáveis.
Nossa pesquisa tomou como base uma compreensão do amor romântico como
uma complexa estratégia reprodutiva desenvolvida para favorecer os comportamentos
sexuais, como a escolha de parceiro e a manutenção do parceiro (Fisher et al., 2002).
Partindo disso, a validação da escala se mostrou forte, e encontramos correlações en-
tre a medida de vínculo afetivo e idade dos participantes, duração do relacionamento e
satisfação sexual. Nossos resultados também indicaram que o amor romântico de ca-
sais que pensam em se separar é menor que o daqueles casais que não pensam nessa
possibilidade. A literatura mostra que apesar de ser universal, o amor romântico sofre
desgastes no relacionamento com o tempo (Wendorf et al., 2011) e com os problemas
que o próprio relacionamento traz, como a manutenção do lar, o cuidado das crianças,
cionado com a satisfação sexual, pois esta é um dos componentes do amor (Fisher et
al., 2002).
Em nosso segundo estudo, investigamos diferenças sexuais que poderiam in-
fluenciar o amor romântico e consequentemente a satisfação do relacionamento. Nos-
sos resultados indicaram que a presença de filhos pode desgastar o relacionamento.
Uma vez que filhos são dependentes do momento que nascem até saírem de casa, nes-
se meio tempo os pais devem manter um ambiente propício para seu desenvolvimento
e crescimento. O cuidado de filhos requer tempo, atenção e investimento, por si só
eles diminuem o tempo que o casal passa a sós, aumentam a responsabilidade, trazem
preocupações e um alto investimento financeiro. De acordo com o Instituto de Vendas
e Trade Marketing (Invert, 2013) o custo financeiro pode variar de 53 mil reais (classe
D) a 2 milhões de reais (classe A) para criar um filho até os 23 anos. Além disso, o
amor romântico entre o casal pode diminuir com a chegada de filhos sendo recompen-
sado pelo sentimento de satisfação de ter filhos (Wendorf et al., 2011). Os resultados
também mostram que o amor romântico não possui fronteiras, e independe da escola-
ridade e religião do casal.
Ainda no segundo estudo, com relação às diferenças, vimos que as mulheres
permanecem mais seletivas depois do casamento/união, sempre julgando e avaliando
seus parceiros. O amor romântico dela é influenciado pela inteligência, possessividade
e compreensão do parceiro. Quando elas amam seus parceiros, elas pensam menos em
mudá-lo, em se separar, e não se arrependem de estar com ele. A percepção do estado
de ânimo, da fidelidade e da sociabilidade do parceiro também são melhores quando
ela o ama. Com isso podemos concluir que o amor romântico mexe com a percepção
feminina, ou seja, quando estão apaixonadas pelo parceiro as mulheres consideram os
parecem não julgar tanto suas parceiras depois que casam, apenas a sociabilidade e a
compreensão da parceira parecem afetar o amor romântico que eles sentem.
Este trabalho sugere, portanto, que o amor romântico é capaz de influenciar a
percepção que o indivíduo tem de sua(seu) parceira(o), e que apesar disso, algumas
características pessoais têm mais peso para um sexo que para o outro. Mas de uma
forma geral, a avaliação de um parceiro não para após a escolha, ela continua durante
o relacionamento.
Concluímos que a utilização de um instrumento validado para o português
para mensurar o vínculo afetivo pode trazer novas informações para a compreensão de
relacionamentos amorosos e para o sentimento de amor no Brasil. Acreditamos que a
partir de nossos trabalhos abrimos portas para futuras pesquisas que queiram examinar
o poder do amor nos relacionamentos e quais os fatores que podem influenciar a satis-
fação marital. Esta área de pesquisa é pouco estudada e ainda falta muito para esclare-
7. REFERÊNCIAS
Allen, J. S. & Bailey, K. G. (2007). Are mating strategies and mating tactics
independent constructs? Journal of Sex Research, 44(3), 225-232.
Buckle, L., Gallup Jr., G. G., & Rodd, Z. A. (1996). Marriage as a reproductive
contract: Patterns of marriage, divorce, and remarriage. Ethology and
Sociobiology, 17, 363-377.
Buss, D. M., & Barnes, M. (1996). Preferences in human Mate Selection. Journal of
Personality and Social Psychology, 50(3), 559-570.
Buss, D. M., & Schmitt, D. P. (1993). Sexual Strategies Theory: An evolutionary
perspective on human mating. Psychological Review, 100(2), 204-232.
Buss, D.M. (2006). The evolution of Love. In R. J. Sternberg & K. Weiss (orgs.), The
New Psychology of Love (pp. 65-86). New Haven, Conn.: Yale University
Press.
Buston, P. M., & Emlen, S. T. (2003). Cognitive process underlying human mate
choice: The relationship between self-perception and mate preference in
Western society. PNAS, 100(15), 8805-8810.
Buunk, B. P., Dijkstra, P., Fetchenhauer, D., Kenrick, D. T. (2002). Age and gender
differences in mate selection criteria for various involvement levels. Personal
Relationships, 9, 271-278.
Cassep-Borges, V., & Teodoro, M. L. M. (2007). Propriedades psicométricas da
versão brasileira da escala triangular do amor de Sternberg. Psicologia:
Reflexão e Critica, 20(3), 513-522.
Castro, F. N., & Lopes. F. A. (2011). Romantic preferences in Brazilian undergraduate
students: From the short term to the long term. Journal of Sex Research, 48(5),
Castro, F. N., Hattori, W. T., & Lopes, F. A. (2012). Relationship maintencence of
preference satisfaction? Male and female strategies in romantic partner choice.
Journal of Social, Evolutionary, and Cultural Psychology, 6(2), 217–226.
Contreras, R., Hendrick, S. S., & Hendrick, C. (1996). Perspectives on marital love
and satisfaction in Mexican American and Anglo-American couples. Journal of
Counseling & Development, 74, 408-415.
Darwin, C. R. (1871). The descent of man and selection in relation to sex. London:
Murray
Dawkins, R. (9189). The selfish gene. 2ª
ed. New York: Oxford University Press.
Fisher, H. E., Aron, A., & Brown, L. L. (2006). Romantic love: a mammalian brain
system for mate choice. Philosophical Transactions of The Royal Society B,
361, 2173-2186.
Fisher, H. E., Aron, A., Mashek, D., Li, H., & Brown, L. L. (2002). Defining the brain
systems of lust, romantic attraction, and attachment. Archives of Sexual
Behavior, 31(5), 413-419.
Gangestad S. W., & Simpson, J. A. (2000). The evolution of human mating: Trade-
offs and strategic pluralism. Behavioral and Brain Sciences, 23, 573-644.
Geary, D. C., Vigil, J., Byrd-Craven, J. (2004). Evolution of Human Mate Choice. The
Journal of Sex Research, 41, 27-42.
Gutierres, S. A., Kenrick, D. T., & Partch, J. J. (1999). Beauty, dominance, and the
mating game: Contrast effects in self-assessment reflect gender differences in
mate selection. Society for Personality and Social Psychology,25(9), 1126-1134.
Hendrick, C., & Hendrick, S. S. (1986). A theory and Method of Love. Journal of
Huber, H. C., Navarro, R. L., Womble, M. W., & Mumme, F. L. (2010). Family
resilience and midlife marital satifaction. The Family Journa, 18(2),136-145.
Jankowiak, W. R., & Fisher, E. F. (1992). A cross-cultural perspective on romantic
love. Ethnology, 31(2), 149-157.
Kaighbadi, F., Shackelford, T.K., & Buss, D.M. (2010). Spousal mate retention in the
newlywed year and three years later. Personality and Individual Differences, 48,
414-418.
Karremans, J. C., Frankenhuis, W. E., & Arons, S. (2010). Blind men prefer a low
waist-to-rip-ratio. Evolution and Human Behavioral, 31, 182-186.
Kenrick, D. T., & Keefe, R. C. (1992). Age preferences in mates reflect sex
differences in human reproductive strategies. Behavioral and Brain Sciences,
15, 75-133.
Kephart, W. M. (1967). Some correlates of romantic love. Journal of Marriage and
the Family, 29, 470-479.
Kniffin, M. K., & Wilson, D. S. (2004). The effect of nonphysical traits on the
perception of physical attractiveness: Three naturalistic studies. Evolution and
Human Behavior, 25, 88-101.
Krugger, D. J. (2010). Female scarcity reduces women’s marital ages and increases
variance in men’s marital ages. Evolutionary Psychology, 8(3), 420-431.
Landis, D., & O’Shea III, W. A. (2000). Cross-cultural aspects of passionate love: An
individual differences analysis. Journal of Cross-Cultural Psychology, 31(6),
752-777.
Lee, J. A. (1973). The colors of love. An exploration of the ways of loving. Don Mill,
Lieberman, D., & Hatgield, E. (2006). Passionate Love: cross-cultural and
evolutionary perspectives. In R. J. Sternberg & K. Weiss (orgs.), The New
Psychology of Love (pp. 274-297). New Haven, Conn.: Yale University Press.
Lippa, R. A. (2007). The preferred traits of mates in a cross-national study of
heterosexual and homosexual men and women: An examination of biological
and cultural influences. Archives of Sexual Behavior, 36, 193–208.
Lucas, T., Parkhill, M. R., Wendorf, C. A., Imamoglu, E. O., Weisfeld, C. C., &
Weisfeld, G. E. (2008). Cultural and evolutionary components of marital
satisfaction: A multidimensional assessment of measurement invariance.
Journal of Cross-Cultural Psychology, 39(1), 109-123.
Miller, L. C., Bhagavatula, A. P., & Pedersen, W. C. (2002). Men’s and women’s
mating preferences: Distinct evolutionary mechanisms? Currents Directions in
Psychological Science, 11(3), p. 88-93.
Miner, E. J., Starratt, V. G., Shackelford, T. K. (2009). It’s not all about her: Men’s
mate value and mate retention. Personality and Individual Differences, 47(3),
214–218.
Pawlowski. B. (2000). The biological meaning of preferences on the human mate
market. Anthropological Review, 63, 39-72.
Pawlowsky, B., & Dunbar, R. I. M. (1999). Impact of market value on human mate
choice decisions. Royal Society London, 266, 281-285.
Regan, P. C. (1998). What if you can’t get what you want? Willingness to compromise
ideal mate selection standards as a function of sex, mate value, and relationship
Rhodes, G., Simmons, L. W., & Peters, M. (2005). Attractiveness and sexual
behavior: Does attractiveness enhance mating success? Evolution and Human
Behavior, 26, 186-201.
Russell, R. J. H., & Wells, P. A. (1986). Marriage questionnaire. Unpublished
booklet.
Russell, R. J. H., & Wells, P. A. (2000). Predicting marital violence from the Marriage
and Relationship Questionnaire: Using LISREL to solve an incomplete data
problem. Personality and Individual Differences, 29, 429-440.
Schmitt, D. P. (2006). Evolutionary and cros-cultural perspectives on love: The
influence of gender, personality, and local ecology on emotion investment in
romantic relationships. In R. J. Sternberg & K. Weiss (orgs.), The New
Psychology of Love (pp. 249-273). New Haven, Conn.: Yale University Press.
Schmitt, D. P. (2005). Fundamentals of Human Mating Strategies. In D. M. Buss
(org.), The Handbook of Evolutionary Psychology (pp. 258-291). New Jersey:
Hoboken.
Shackelford, T. K., Goetz, A. T., & Buss, D. M. (2005). Mate retention in marriage:
Further evidence of the reliability of the mate retention inventory. Personality
and Individual Differences, 39, 415-425.
Sternberg, R. (1997). Construct validation of a triangular love scale. European
Journal of Social Psychology, 27, 313–335.
Sternberg, R. J. (1986). A triangular Theory of Love. Psychological Review, 93(2),
119-135.
Thornhill, R., & Gangestad, S. W. (1996). The evolution of human sexuality. TREE
Trivers, R. (1972). Parental Investment and sexual selection. In B. Campbell (org.),
Sexual selection and the descent of man: 1871-1971 (pp. 136–179). Chicago:
Aldine.
Weisfeld, C. C. (1997). Marriage in cross-culture perspective. In N. L. Segal, G. E.
Weisfeld & C. C. Weisfeld (orgs.), Uniting Psychology and Biology: Integrative
Perspectives on Human Development (pp. 355-367). Washington: American
Psychology Association.
Weisfeld, C. C., Dillon, L. M., Nowak, N. T., Mims, K. R., Weisfeld, G. E.,
Imamoglu, E. O., Butovskaya, M., & Shen, J. (2011). Sex differences and
similarities in married couples: Patterns across and within cultures. Archives in
Sexual Behavior, 40, 1165-1172.
Wendorf, C. A., Lucas, T., Imamoglu, E. O., Weisfeld, C. C., & Weisfeld, G. E.
(2011). Marital satisfaction across three cultures: Does the number of children
have an impact after accounting for other marital demographics? Journal of
Cross-Cultural Psychology, 42(3), 340-354.
Woodward, K., & Richards, M. H. (2004). The parental investment model ad
APÊNDICE A