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CAPÍTULO 2 ARTIGOS CIENTÍFICOS

3.1. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A política de drogas brasileira, após mais de 10 anos de vigência da Lei Nº 11.343/2006, não reduziu o uso, fabricação e circulação de substâncias entorpecentes ilícitas, produzindo índices mais elevados de consumo e violência. No plano social, a proibição con- duz ao aumento da criminalidade e da delinquência, pois a dependência econômica de alguns viciados os leva a cometer delitos para sustentar o vício e revender drogas como forma de subsistência.

Além de endurecer a pena para os traficantes, mesmo para o pequeno varejista, a legis- lação não estabelece critérios objetivos para diferenciar o usuário de drogas e o traficante, deixando a decisão para a polícia, no momento da prisão e, em seguida, para o Poder Judiciá- rio, ao proferir sua sentença, que levará em conta a natureza e a quantidade da substância a- preendida no local e as condições em que se desenvolveu a ação. Este grau de subjetividade, existente na lei, evidencia preconceitos e vulnerabilidades sociais e levam à prisão jovens, que na maioria das vezes não tem condições de pagar um advogado e que são facilmente substitu- ídos no crime organizado por outros jovens em caso de prisão ou morte.

O tráfico de drogas é o segundo crime que mais leva ao encarceramento, e a adoção de uma política de drogas repressora enseja grandes consequências, uma vez que parte da verba que poderia ser investida em emprego e educação é utilizada para gastos penitenciários. De fato, essas pessoas foram presas em razão do cometimento de um crime, entretanto, é preciso observar que a forma que a política de drogas se estabeleceu no Brasil não tem surtido os efei- tos esperados de diminuição do consumo e comercialização de drogas.

O presente trabalho buscou analisar como ocorre a caracterização quantitativa e quali- tativa do crime de tráfico de drogas a partir das sentenças condenatórias da Vara de Combate ao Crime Organizado da cidade de Belém-Pará. Neste contexto, o objetivo do primeiro artigo foi caracterizar o crime de tráfico de drogas por meio do estudo das sentenças condenatórias da Vara de combate ao Crime Organizado em Belém-Pará. Inicialmente, pode-se observar que a maioria dos acusados agia sozinho, foram presos em flagrante delito, com pequenas quanti-

dades de drogas, sendo cocaína a droga mais apreendida e o que tipo de conduta mais obser- vado nos processos foi armazenar a droga. Também, observou-se um tempo excessivo entre a prisão em flagrante dos acusados do fato e o julgamento dos processos e que a maioria dos acusados condenados não tinha antecedentes criminais.

No segundo artigo teve-se o intuito de mostrar a caracterização das sentenças condena- tórias do crime de tráfico de drogas em Belém-Pará, a partir de uma análise qualitativa. Após o estudo das sentenças, percebeu-se que as abordagens policiais aconteceram, em sua maioria, por meio de policiamento ostensivo em razão de denúncia anônima ou atitude suspeita. Além disso, as provas produzidas para embasar a sentenças condenatórias foram em sua maioria o depoimento de testemunhas policiais, somado ao laudo pericial.

A hipótese inicialmente estabelecida foi confirmada, uma vez que se verificou que o depoimento dos policiais é a prova testemunhal mais utilizada para fundamentar a condenação das sentenças e que a quantidade de drogas apreendida relatada na maioria das sentenças é de até 100 gramas.

Escolheu-se como local de estudo a Vara de Combate ao Crime Organizado, que tem competência privativa para processar e julgar os crimes praticados por organizações crimino- sas, entretanto, de acordo com as sentenças, não foi comprovado que os acusados participa- vam de organizações criminosas e sim, atuavam sozinhos.

Percebe-se que a política brasileira de drogas favorece a seletividade do sistema penal, na medida em que as agências policiais têm total arbítrio para avaliar a conduta que será esco- lhida, uma vez que podem parar qualquer um e revistar quem entender por suspeito, o que refletirá em toda persecução penal. As sentenças estudadas evidenciaram que permanece nas mãos dos policiais selecionar as pessoas que serão indiciados, o que influencia em todas as fases processuais, na medida em que na maioria das sentenças, notou-se que apenas testemu- nhas policiais foram ouvidas.

Em razão do fracasso da polícia proibicionista de drogas, conforme exposto ao longo do trabalho, verifica-se uma tendência de alguns países na busca de alternativas à repressão, reconhecendo as consequências devastadoras do sistema penal, principalmente a usuários de drogas.

A solução seria mudar a política de drogas atual para uma mais humana e eficaz, com investimento em redução de danos, além de descriminalizar o uso e o cultivo de drogas, a fim de possibilitar a prevenção e investir em alternativas sociais.

Neste sentido, Portugal descriminalizou o consumo de drogas, por meio da Lei Nº 30/2000, e afastou a aplicação de sanções penais aos delitos de consumo que eram considera- dos como crime desde 1926. A lei citada estabeleceu um regime em que o consumidor não pode exceder a quantidade necessária para o consumo médio individual por dez dias. Outro exemplo interessante é do Uruguai, que aprovou a Ley Nº 19.172, de 10 de dezembro de 2013, uma legislação que regulou a cadeia de produção, distribuição e venda de maconha (cannabis).

Assim, importante se estudar formas de se buscar maneiras preventivas e de redução de danos, uma vez que o sistema penal se ocupa de usuários de drogas, para os quais determi- na respostas penais relativamente brandas, ao invés de investir em políticas públicas de aco- lhimento direcionadas a usuários de drogas problemáticos.

Ademais, a intervenção penal pode permitir ao poder repressivo policial a prática de inúmeras ilegalidades, realizando flagrantes por tráfico de drogas em casos de consumos de drogas, além de deixar de investir em estratégias para a punição de grandes traficantes, en- chendo as prisões de pequenos traficantes e mulas.

Por certo que a figura típica de uso de droga para uso pessoal, prevista no Art. 28, da Lei Nº 11.343/2006, visa a proteção da saúde pública, entretanto, é preciso se observar que a saúde merece proteção jurídica, mas não especificamente proteção penal quando se trata de autolesão, principalmente, em razão de não haver uma diminuição o uso de drogas. Desta forma, os recursos desperdiçados na guerra contra as drogas deveriam ser investidos em pre- venção ao uso e no tratamento do usuário.

Não se sabe se a descriminalização das drogas é a solução para a superlotação carcerá- ria atribuída em grande parte aos crimes relacionados a drogas, entretanto, esta medida dimi- nuiria os altos custos da atividade estatal, bem como contribuiria para a redução de possíveis arbitrariedades relacionadas a discricionariedade existente quanto à tipificação do crime de

tráfico e uso de drogas para uso pessoal, além de possibilitar contribuir para diminuição do poder do narcotráfico no Brasil. É evidente que a proposta de descriminalização não pode ser afastada de investimentos em informação e educação, que auxiliem a população a entender e se conscientizar do consumo de substâncias entorpecentes.

As propostas feitas neste trabalho são respostas encontradas na pesquisa, na tentativa de melhorar a situação do sistema carcerário, mas a solução perfeita não se vislumbra. Desta maneira, já passa da hora de se perguntar o motivo de se manter esta política de drogas, que evidencia o discurso repressivo, sem que isso tenha conseguido reduzir o consumo, a venda e a violência em torno deste mercado ilícito.

3.1.1 Estratégias de Intervenção Pública

Na expectativa de que esta dissertação seja uma maneira de se repensar um novo para- digma da política de drogas brasileira, sugere-se as seguintes estratégias de intervenção públi- ca:

1. Título da proposta: Reconhecimento dos direitos humanos dos usuários de drogas.

Objetivo: Aplicação e fortalecimento de medidas de redução de danos e campanhas informativas de prevenção.

Quem pode executar: Secretaria de Justiça e Direitos Humanos do Estado do Pará. Resultados esperados: Redução do índice de usuários de drogas.

2. Título da proposta: Descriminalização do uso e da posse de pequenas quantidades de substâncias ilícitas.

Objetivo: Diminuir o encarceramento ocasionado pelos crimes relacionados a drogas.

Quem pode executar: Supremo Tribunal Federal, com o julgamento do Recurso Extraordinário Nº 635.659, o qual prevê a descriminalização da posse de drogas para uso pessoal. Pode ser executado também pelo Congresso Nacional, por meio de alteração legislativa.

Resultados esperados: Diminuir o encarceramento ocasionado pelos crimes relacionados a drogas.

3. Título da proposta: Classificação das substâncias entorpecentes em drogas “leves” e “pesadas” e diferenciação das penas do delito de tráfico de drogas.

Objetivo: Estabelecer uma gradação de penas para o crime de tráfico de drogas, a fim de que a pena de pequenos traficantes seja proporcional a quantidade de droga apreendida, bem como seu grau de participação no delito.

Quem pode executar: Congresso Nacional, por meio de alteração legislativa.

Resultados esperados: Diminuir o encarceramento ocasionado pelos crimes relacionados a drogas.

4. Título da proposta: Previsão de penas alternativas para os delitos de tráfico.

Objetivo: Inclusão de alternativas à pena de prisão, por medidas que incluam a presença em cursos de qualificação profissional e a facilitação de busca por emprego, a fim de afastá-los do comércio ilícito.

Quem pode executar: Congresso Nacional, por meio de alteração legislativa.

Resultados esperados: Diminuir o encarceramento ocasionado pelos crimes relacionados a drogas, a fim de que seja feita uma diferenciação entre o grande traficante de drogas e o pequeno traficante ou mula.

5. Título da proposta: Estreitar relações entre a polícia, Guarda Municipal e o Ministério Público.

Objetivo: Fomentar a utilização de aplicativos, a fim de agilizar a rápida comunicação entre os órgãos.

Quem pode executar: Ministério Público e Agências policiais.

Resultados esperados: Auferir maior eficiência à investigação criminal, com incentivo à investigação de inteligência.

6. Título da proposta: Investimento em tratamento de dependência de drogas pela rede pública de saúde.

Objetivo: Redução de danos relacionados ao consumo de drogas. Quem pode executar: Secretaria de Saúde do Estado do Pará.

7. Título da proposta: Investir em treinamento para as agências policiais. Objetivo: Alcançar uma investigação criminal mais profícua.

Quem pode executar: Agências policiais.

Resultados esperados: inquéritos policiais sejam mais bem instruídos, com presença de testemunhas oculares do tráfico de drogas, sempre que possível.

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