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Como parte das conclusões obtidas, pude observar que o grupo social focalizado valoriza o aspecto considerado ecológico no uso ritual do daime, explicitando a noção de auto-sustentabilidade e reivindicando o reflorestamento das espécies utilizadas no preparo da bebida. Esse aspecto singulariza o grupo focalizado, diferenciando-o de outros grupos que também fazem uso ritual da bebida. Estamos, portanto, trabalhando com a suposição de que há uma forte relação entre a formação de uma consciência ecológica com a construção de uma identidade social para o grupo focalizado. O aspecto identitário do grupo nos permite perceber a construção de uma memória coletiva para si, uma espécie de consciência coletiva que vem se formando ao longo do tempo. Temos procurado observar narrativas, relatos, rituais de congregação, onde essa memória se expressa.

Trabalhamos com a hipótese de uma organicidade entre a identidade social, a consciência ecológica, a memória coletiva, a religião e, é claro, o consumo da bebida e seus efeitos. É esta organicidade – que implicita uma inerência simbólica entre o referente “daime”

e a referência “visão” – que é o foco deste trabalho.

Podemos apontar os seguintes resultados decorrentes da pesquisa de campo:

mapeamento dos sítios etno-botânicos da região de Cachoeira Grande e de seus respectivos proprietários; elaboração de quadros descritivos e analíticos sobre as imagens realizadas na pesquisa de campo; leitura e seleção dos hinos do Santo Daime do hinário “O Cruzeiro” do mestre Raimundo Irineu Serra; leitura e análise dos depoimentos para a elaboração de categorias conceituais.

Observamos como a memória contida nos hinos e poemas místicos, neste trabalho analisados, deixam transparecer uma memória ligada ao lugar e à história de vida de seus moradores e freqüentadores. Isso pode ser visto nas narrativas dos Poemas Místicos que tratam de temas como: trabalho na terra, suor e recompensa da natureza. Por sua vez, os hinos, mesmo falando muito em elementos como sol, lua e natureza, remetem também a outros imaginários, como palácios, realeza e seres alienígenas. Essas características reforçam a idéia de uma memória que se expressa socialmente e contextualmente.

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