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Seção 3 – Da análise e discussão

4. Considerações Finais

Foco de discussões nas áreas da saúde e da educação, o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) tem se configurado em um cenário de contradições em que, por um lado é defendido como um transtorno de origem orgânica, anatomicamente localizado no córtex pré-frontal, que prejudica a direção e sustentação da atenção e em alguns casos relaciona-se à hiperatividade. Por outro lado, o TDAH é compreendido como um suposto transtorno, pois não existem evidências que comprovem a origem desta “disfunção” no organismo; esta compreensão contrapõe-se à posição que individualiza essa questão, considerando aspectos históricos, sociais e educacionais como imprescindíveis para o entendimento acerca do “transtorno”.

A Teoria Histórico-Cultural procura superar a dicotomia indivíduo/sociedade, biológico/cultural, propondo a incorporação do que é de ordem orgânica ao desenvolvimento histórico e cultural. Em meio ao confronto de teorias em que aparentemente se sobrepõe a visão que dá ao TDAH o status de transtorno a ser tratado por via medicamentosa, elaboramos uma questão: a relação entre aprendizagem e desenvolvimento é considerada para se entender a função psicológica da atenção? Assim, o objetivo geral deste trabalho foi analisar em pesquisas brasileiras sobre desenvolvimento da atenção e TDAH se e como a relação entre desenvolvimento e aprendizagem é considerada.

Na Seção 1 apresentamos os pressupostos da Teoria Histórico-Cultural que fundamentam nossa pesquisa, assim como uma crítica ao fenômeno medicalizante. Para discutir a relação entre

aprendizagem e desenvolvimento, elencamos alguns elementos da produção teórica de autores da Teoria Histórico-Cultural, tais como a Zona de Desenvolvimento Próximo (Vigotskii 1933/2017), a influência da escolarização no processo de desenvolvimento (Luria, 1974/2017) e o conceito de atividade (Leontiev, 1978; 1981/2017). Nessa seção também discorremos sobre as funções psicológicas superiores e, em especial, à função psicológica da atenção.

Na Seção 2 realizamos o delineamento da pesquisa e o percurso metodológico do trabalho, apresentando as características gerais do material levantado, critérios de inclusão e exclusão das pesquisas para a análise.Catalogamos 161 teses e dissertações das áreas de Educação e Psicologia, em levantamento realizado entre outubro de 2017 e fevereiro de 2018 nas seguintes bases de dados: Portal de Teses e Dissertações da CAPES, como principal referência e nos sites dos repositórios das Universidades, quando as teses e dissertações não estavam disponíveis integralmente na plataforma da CAPES. Apenas 15 pesquisas contemplavam, de fato, o objetivo do presente trabalho e foram selecionadas para a análise.

Na Seção 3 analisamos em profundidade as pesquisas que tratavam sobre aprendizagem, desenvolvimento da atenção e TDAH, a partir de três eixos que buscaram contemplar o objetivo de nossa pesquisa: 1) Relações entre aprendizagem e desenvolvimento; 2) Concepções sobre desenvolvimento da atenção e TDAH; 3) Ações/intervenções para o TDAH.

Entre as limitações da pesquisa, consideramos importante ressaltar que as dissertações e teses analisadas possuem uma profundidade teórica maior do que a que foi trazida nesta dissertação. Analisamos esses trabalhos a partir de eixos que orientaram nossa percepção, e dados os limites desta dissertação, não pudemos apresentar de maneira mais completa toda a riqueza das investigações a que se dedicaram as pesquisadoras e pesquisadores citados. Pudemos ver, num panorama mais geral, que a aprendizagem é considerada como direcionadora do curso do desenvolvimento apenas nas pesquisas que se fundamentam na perspectiva Histórico-Cultural.

Nas demais, a aprendizagem vem como elemento secundário ao desenvolvimento, que na maior parte dos casos é visto como resultado da maturação biológica.

Também constatamos a necessidade de estudos futuros que possam tratar da apropriação dos conceitos da Teoria Histórico-Cultural, uma vez que, ao de falar sobre desenvolvimento, Vigotski se mostrou como uma referência constante nos trabalhos analisados, mas nestes, em contrapartida, muitos de seus conceitos eram usados em contextos contraditórios em relação à teoria.

Ainda que considerem o TDAH como um transtorno que impede o desenvolvimento da capacidade de direcionamento e sustentação da atenção e controle voluntário do comportamento, foi constatado nas pesquisas que atividades que atuam com a intencionalidade de promover recursos para o desenvolvimento dessas funções, foram percebidas como positivas em seus objetivos. Nesse aspecto, ressaltamos a importância do caráter intencional do ensino, que deve buscar promover o desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Ressaltamos também que, a nosso ver, a partir destes resultados podemos observar que muitas pesquisas analisadas consideram a aprendizagem como promotora do desenvolvimento das funções que antes encontravam-se aquém do esperado, uma vez que apresentam progresso depois de intervenções com atividades voltadas para a regulação do comportamento e sustentação da atenção. Questionamos, portanto, a concepção de que existem limitações biológicas, uma vez que essas funções mostraram relevantes possibilidades de desenvolvimento.

Outra questão importante a ser destacada é que, o que torna possível o acesso às pesquisas por meio de buscas, além dos indexadores, são as palavras-chave contidas nos resumos, ao serem cadastradas nas plataformas digitais. Diversos trabalhos possivelmente tratam do tema da presente pesquisa, mas por motivos como este não puderam ser encontrados a partir de nossa busca. Ainda neste sentido, como relatamos anteriormente, muitos resumos também deixam a

desejar no quesito qualidade e presença de informações básicas como referencial teórico e objetivo geral do estudo realizado. A redação de resumo científico, à guisa de um cartão de visitas, precisa fornecer todos os elementos indispensáveis para que o leitor decida se será necessário ler todo o trabalho ou não, dependendo de suas intenções, seja para um levantamento bibliográfico, seja para conhecer a obra diante de si ou, ainda, outra finalidade.

Também merece destaque a importância, na formação de psicólogos, das disciplinas relacionadas aos campos da Psicologia da Aprendizagem e do Desenvolvimento ser apresentadas de modo consistente e ancoradas em sólidos pressupostos teóricos. Além disso, é fundamental que se estabeleça uma relação entre esses dois campos, uma vez que não se pode compreender o desenvolvimento humano alijado do processo de aprendizagem e nem uma aprendizagem restrita ao âmbito escolar.

Por fim, acreditamos que alterações no contexto escolar, como apresentadas em algumas das propostas elencadas nas pesquisas, relativas aos âmbitos pedagógico, didático, curricular, material etc. devem ser estendidas a todos os estudantes, como regra majoritária e não exceção, para aqueles que supostamente padecem de um transtorno-que-só-ocorre-na-escola, parafraseando Moysés (2001).

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