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Após séculos de seu surgimento, o capitalismo não tem se mostrado como um modo de produção estável e eficiente se caracterizando num patamar mais elevado que a humanidade poderia alcançar, como muito bem fora defendido pela economia política clássica.

Em pleno século XXI são as condições concretas de vida que denunciam que existe algo errado, algo não se encaixa nesse padrão de vida defendido ideologicamente como harmonioso e como o máximum de mobilidade social, cujas oportunidades estão indefinidamente abertas para todos.

Nesse pensamento cabe-nos questionarmos: será que a causa das possíveis instabilidades desse sistema, do crescimento da fome, da miséria, da persistência do trabalho degradante, das guerras civis travadas em busca do domínio econômico e político, do crescimento do desemprego, da persistente morte de crianças submetidas a níveis extremos de pobreza, entre outras questões desumanas; será que essas possíveis causas residem meramente na esfera política e, portanto, passível de ajustes para que esse mundo continue firme em sua caminhada?

De certo, numa perspectiva marxiana, transpor as barreiras que aprisionam o ser social, significa superar radicalmente essa ordem criada pelos próprios homens, mas alheia a esses mesmos. Ignorar o conhecimento ontológico dessa sociabilidade culmina em vãos esforços na busca pelo aperfeiçoamento do que inerentemente não é aperfeiçoável..

Nesse contexto, podemos vislumbrar que a busca pela efetivação dos direitos humanos como estratégia de enfrentamento das desigualdades sociais tem sido posta na ordem do dia. O conteúdo progressista que abarca o conceito desses direitos encontra-se ameaçado face à sua não efetivação no cotidiano dos sujeitos sociais.

Muitas vezes, a não concretude desses direitos na sua integralidade arrasta a discussão para um viés reformista que sugere que a solução poderá residir a partir da disputa pelo controle do Estado, fazendo com que esse reoriente suas ações com vistas aos interesses da maioria da população, incutindo uma tarefa inconcebível à natureza desse Estado, uma vez que, esse jamais irá dissipar os antagonismos de classe, pois, sua gênese está alicerçada nesse mesmo antagonismo e que esse representa, por via de regra, os interesses da classe economicamente dominante.

A não percepção desses fundamentos desemboca na ilusão de que o acúmulo crescente das conquistas sociais engendradas na sociedade burguesa culminará na superação dessa ordem, como se cidadania fosse sinônimo de emancipação e consequentemente sinônimo de socialismo.

Para Marx, a cidadania moderna não está desvinculada da sociedade capitalista, que por sua vez tem seu fundamento na compra e na venda da força de trabalho que, segundo Tonet,

Dele se originam a propriedade privada, o capital, a concorrência, o valor-de-troca, a mercadoria, a mais-valia, o trabalho assalariado, a divisão social do trabalho, as classes sociais, a exploração, a dominação, o estranhamento e o seu instrumento fundamental de reprodução, que é o Estado. (TONET, 1997, p. 170).

Não podemos esquecer que a atual Declaração Universal dos Direitos Humanos proclamada pela ONU em 1948, teve como principal elemento inspirador a Declaração de 1789. Para Marx, esses direitos não são universais, pois representam os interesses de uma classe em específico, a burguesa.

Crer na universalidade desses direitos é consequentemente acreditar num Estado democrático que representa o interesse geral (interesse universal), é crer que a cidadania tem uma essência igualitária que incide na realidade objetiva da vida em sociedade. É consequentemente naturalizar as desigualdades sociais e econômicas porque afinal o direito “está para todos”, mascarando a luta de classes.

No entanto, em tempos de barbárie a busca pela efetivação da cidadania passou a ser o horizonte último da classe trabalhadora que como membro da sociedade burguesa convive num contexto de desigualdade resultante do processo de exploração do homem pelo homem num cenário que emerge o individualismo e as relações de competição e conflitos entre homens, cuja consequência é o estado de alienação em que esse é submetido.

Desse modo, a esfera da política continua sendo o horizonte para se compreender a totalidade social e daí decorrem todos os equívocos que estão envoltos nos assim chamados direitos humanos, uma vez que na sociedade capitalista os indivíduos não são livres, mas o capital..

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