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As aulas de língua portuguesa deveriam oferecer “leitura de material variado (jornal, revista, literatura – especialmente literatura) em alta escala, e na própria escola”; “escrita constante, várias vezes por dia, todos os dias: narrativas, cartas etc. Muita leitura e muita escrita, simplesmente porque é assim que se aprende” (POSSENTI, 2001 b: 143-144).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Chegar ao final de uma pesquisa desta natureza traz, sem dúvida, sentimentos vários, multifacetados, em que as respostas iluminam dúvidas e questionamentos e abrem espaço para novos posicionamentos e reflexões.

A experiência adquirida em muitos anos de trabalho, em vários setores em que se pode atuar na Educação, despertou inquietações que só poderiam ser satisfeitas com a realização deste trabalho.

Não se quer dizer com isso que os problemas educacionais foram resolvidos a partir da pesquisa, mas que se confirmaram algumas hipóteses que resultaram em concretas sugestões para a tentativa de melhoria do quadro que ora se apresenta.

Ao lado de tantos trabalhos de diferentes naturezas, que circundam a educação, os estudos lingüísticos, a legislação educacional, a formação de professores, entre outros, estão aqueles que objetivam desvendar particularidades do cotidiano escolar, no sentido de entender suas ações, a que vêm, para onde levam.

Este trabalho buscou se aprofundar nesse universo cotidiano, tendo como referencial básico de análise os Parâmetros Curriculares Nacionais – Língua Portuguesa – Ensino

Fundamental – 3° e 4° ciclos.

O que se procurou foi discutir as determinações – sócio-histórica, política, educacional e discursiva – de um momento da educação brasileira, especificamente de 1998, ano em que foram divulgados os PCN, até os dias atuais, enfatizando a realidade vivida na escola pública do Estado de São Paulo.

Partiu-se de uma idéia básica que foi a de percorrer a trajetória histórico-social das reformas educacionais em relação ao ensino de língua portuguesa, analisando-se desde as

denominações que a disciplina sofreu ao longo dos anos, a legislação educacional e o estabelecimento dos currículos. Daí surgiu a constatação de que existe um atraso considerável no entendimento desses documentos; quando se começa a ter uma vaga noção do que realmente deveria ser colocado em prática, surge outro, que desconsidera as discussões acerca do anterior e se inicia todo um processo de explicação e capacitação dos envolvidos, num movimento circular que não tem fim, dificultando a transformação do ensino.

Há também a utilização de termos que vão se ressignificando, conforme a ideologia que permeia cada documento e que não são percebidas, pois estão camufladas em um discurso que os envolvidos têm dificuldades para desvendar.

Assim, pode-se fazer a primeira afirmativa acerca da hipótese levantada inicialmente: as reformas no campo do ensino de língua portuguesa não se concretizam em sala de aula porque os sujeitos responsáveis pela divulgação e pelos programas de formação continuada e de capacitação dos professores não são suficientemente críticos para traduzir contextualmente os discursos. Não estão preparados (ou não desejam estar?) para tirar os professores da ingenuidade política.

Em texto de Yoshie Ussami Ferrari Leite e Cristiano Amaral Garboggini Di Giorgi (2004, p. 8) sobre a função do professor há uma citação a ser refletida:

Giroux (1998, p. 163) afirma que o essencial para o professor é a necessidade de tornar o pedagógico mais político e o político mais pedagógico. Tornar o pedagógico mais político significa considerar a educação escolarizada sob o enfoque político,

possibilitando que a escola torne-se parte do projeto social mais amplo, com o objetivo de ajudar os alunos a se desenvolverem para que as injustiças econômicas, políticas e sociais sejam superadas. Tornar o político mais pedagógico significa

utilizar formas de ensinar que incorporem os interesses políticos de natureza emancipadora. Implica em tratar o aluno como agente crítico, capaz de problematizar o conhecimento e de utilizar o diálogo crítico, argumentando em prol de um mundo qualitativamente melhor para todas as pessoas.

Para a análise dos PCN – Língua Portuguesa utilizaram-se os pressupostos teóricos da Análise do Discurso de linha francesa e as idéias de Bakhtin sobre monofonia e polifonia. Apresentou-se uma trajetória que levou à percepção de que há um contraste evidente entre o

discurso governamental e a realidade do ensino. Aquele age autoritariamente, a partir de um discurso aparentemente monofônico, ocultando as vozes que lhe dão sustentação, dificultando o diálogo entre a teoria e a prática.

Criticaram-se os PCN no que se refere à necessidade de que os professores estejam atualizados para que as propostas lá contidas sejam colocadas em prática, pois estes não apresentam os requisitos necessários para compreender os conceitos teóricos.

É urgente que se introduzam cursos de capacitação, pois os PCN pressupõem um professor-leitor conhecedor do quadro teórico em que a proposta se insere e que também seja capaz de manusear os conceitos lá contidos com seus alunos.

A monofonia aparente do texto não permite que o professor mergulhe em suas idéias. Uma das soluções para ao menos diminuir a defasagem dos professores seria o investimento, por parte dos governos municipal, estadual e federal, em cursos de atualização de longa duração, pois as teses que embasam o discurso dos PCN foram frutos de anos de dedicação e pesquisa e, portanto, para que o conhecimento nelas contido seja realmente assimilado e efetivamente aplicado pelos professores das redes de ensino. Diz-se mais, esses cursos deveriam ficar a cargo das Universidades públicas que ainda mantêm em seu seio os melhores cérebros pensantes.

Outra constatação é que as noções de dialogismo, monofonia e polifonia devem ser introduzidas para toda e qualquer análise que procure caracterizar a trajetória discursiva e, com isso, desvendar a ideologia subjacente a cada discurso.

No capítulo que traçou o perfil dos educadores foi possível a percepção de que muitos desconhecem seu objeto de ensino ou têm dele uma visão equivocada, descontextualizada. Existe uma falta de compromisso social agravado por um improviso generalizado no que concerne aos conceitos desenvolvidos em sala de aula. Crê-se que seja só na Educação que se convive com o fato de que aquele que não sabe ensina. E, ainda, descreveu-se que o processo

de subjetivação desses professores se dá apenas quando querem inculcar um outro tipo de ideologia, ainda mais alienante.

Ainda como objetivos a serem atingidos, a pesquisa se baseou nas seguintes questões, que talvez possam de algum modo ser respondidas:

- O professor de língua portuguesa, que atua nas salas de aula do Ensino Fundamental, na rede pública, tem conhecimento das propostas dos Parâmetros Curriculares

Nacionais – Língua Portuguesa – 3° e 4° ciclos do Ensino Fundamental e está preparado para

aplicá-las?

Pode-se concluir que os professores têm um conhecimento superficial e, portanto, não estão aptos para aplicá-las.

- Até que ponto as concepções que aparecem nos Parâmetros Curriculares Nacionais –

Língua Portuguesa – 3° e 4° ciclos do Ensino Fundamental interferem nas práticas

pedagógicas do ensino público?

Como se viu, não interferem. Os PCN conseguiram, por enquanto, ser referencial para os autores dos livros didáticos, que também abordam as teorias de maneira superficial. Deixa-se uma questão para reflexão: Não seria interessante que as universidades concebessem material didático a ser utilizado nas salas de aula do ensino fundamental?

- Qual o significado da palavra “qualidade” no contexto atual concernente à educação? Qualidade, atualmente, é sinônimo de quantidade. As autoridades educacionais mensuram a “qualidade” pelos índices de evasão e repetência, pelo valor numérico atribuído às escolas pelas avaliações externas. A quantidade determina a qualidade.

- Quais seriam os conceitos pouco compreendidos na leitura dos Parâmetros

Curriculares Nacionais – Língua Portuguesa – 3° e 4° ciclos do Ensino Fundamental?

Quase todos os conceitos lingüísticos que têm o texto como unidade de ensino, capaz de desenvolver a competência lingüística de verdadeiros sujeitos.

Concluindo, tanto as respostas quanto as reflexões aqui expostas movimentam-se no terreno da transitoriedade, são produto do momento histórico que as determinou.

Foi a intenção desta pesquisa ser uma contribuição, ainda que despretensiosa, aos professores e aos dirigentes de ensino para cada vez mais se procurar caminhos efetivos para o ensino da língua portuguesa.

Ao finalizar este trabalho, recorre-se à memória discursiva de quem viveu e vive em grande medida como testemunha e ator e reafirma-se:

os novos tempos anunciam, outra vez, ‘uma nova educação’, no entanto, o que temos assistido é uma re-significação de termos em cujos sentidos encontramos as mesmas formações ideológicas. (ARAÚJO, 2002, p. 137)

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