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Esta tese tratou de dois assuntos, os efeitos de um ato de concentração e a interação estratégica entre firmas, com o objetivo de, em primeiro lugar, estudar as causas e as conseqüências dos efeitos unilateral e coordenado de um ato de concentração e sugerir métodos para a sua mensuração, e, em segundo lugar, fazer alguma contribuição sobre o modo com a interação entre firmas é tratado em Organização Industrial, introduzindo a interdependência estratégica como o resultado de um processo de adaptação entre agentes heterogêneos.

Quanto ao estudo das causas e das conseqüências dos efeitos unilateral e coordenado de um ato de concentração e à sugestão de métodos para a sua mensuração, foi possível, inicialmente para o efeito unilateral, apresentar um método, a simulação de fusão, que conseguiu substituir, na avaliação antitruste de atos de concentração, o uso de medidas de market share e de concentração de mercado (HHI), possibilitando proporcionar resultados quantitativos dos efeitos de uma fusão, o que para a administração pública, na área de defesa da concorrência, facilita os julgamentos e a criação de jurisprudência e, por fim, incrementa a segurança jurídica das decisões.

A simulação de fusão nada mais é do que a estimação dos efeitos nos preços de mercado decorrentes de uma concentração por meio de duas etapas. A primeira consiste na escolha de uma curva de demanda da indústria em particular e sua posterior estimação. A segunda trata da submissão dos parâmetros resultantes da etapa anterior (matriz de elasticidades) ao modelo de oligopólio que irá ser simulado para prever os preços e as quantidades pós-ato de concentração, considerando-se que não houve alteração no custo marginal das firmas envolvidas na operação. O problema é que, embora a simulação de fusão torne a decisão antitruste menos discricionária, ela é passível de crítica.

A crítica interna se refere à sensibilidade dos resultados ao tipo de sistema de demanda e modelo de oligopólio utilizados. Dependendo da demanda e da oferta escolhidas, o aumento de preço será diferente. Então, apesar deste método ser de fácil aplicabilidade, seu uso deve ser feito com a ciência de que seus resultados estão condicionados ao simplismo que torna o método prático, simplismo este que faz com que a simulação de fusão padeça de realismo. A crítica externa é a não consideração da interação estratégica entre as firmas do mercado como

fator propulsor da colusão, isto é, a simulação de fusão incorpora em sua análise apenas os efeitos unilaterais de um ato de concentração, deixando de lado os efeitos coordenados, na medida em que se vale de modelos de oligopólio incapazes de capturar mudanças estratégicas de empresas decorrentes de mudanças estruturais no mercado. Modelos de oligopólio do tipo Cournot e Bertrand, embora comportem interação estratégica, ignoram a possibilidade de comportamento colusivo.

A colusão é o comportamento esperado entre firmas em oligopólios. Como seu tratamento em antitruste, via efeitos coordenados, ainda é incipiente, é preciso aprofundar analiticamente, inclusive em termos quantitativos, a abordagem da cooperação, que também no antitruste tem sido relegada a um segundo plano em função do foco quase exclusivo posto na modelagem dos efeitos unilaterais. O que fizemos nesta tese foi exatamente uma tentativa de aprofundar o estudo da cooperação entre firmas.

Inicialmente, utilizando um algoritmo genético, simulamos o Dilema dos Prisioneiros Iterativo, obtendo como resultado a emergência da cooperação devido ao ganho de confiança da firma em sua rival depois de inúmeras e repetidas interações de mercado que tornaram estas interações recíprocas e cooperativas. Depois, partindo de um modelo básico para tratamento da interação estratégica entre firmas de cunho evolucionário e de uma simulação computacional baseada em agentes construídos bottom-up, mostramos quão importantes são as variáveis estruturais e de conduta de um mercado para a emergência e evolução da cooperação.

Firmas que buscam melhores desempenhos ajustando suas estratégias de precificação em um ambiente de racionalidade limitada quando tomam decisões unilaterais aumentam seus preços e margens quanto maior assimetria de mercado. E mais, sob certas condições de mercado, uma fusão é capaz de alterar a estratégia da firma de não cooperativa para cooperativa. O interessante notar é que a firma opera em ambientes complexos nos quais em certas ocasiões é mais satisfatório adotar estratégias não cooperativas enquanto que em outras é mais satisfatório adotar estratégias cooperativas. Testando as condições de mercado que deflagram uma ou outra ocasião, é possível um melhor entendimento da importância da interação estratégica entre firmas para uma análise de mercado.

Assim, quanto à interação estratégica entre as firmas, o que pudemos perceber é exatamente o seu papel fundamental na análise de mercados com mudanças estruturais. No caso da simulação de fusão, apesar dos modelos de oligopólio utilizados incorporarem a interação estratégica, não o fazem da forma dinâmica e especulativa necessária para a captura da emergência e da evolução da cooperação. Partimos do pressuposto que a interação estratégica entre empresas é um processo dinâmico e adaptativo, que ao mesmo tempo influencia a estrutura e por ela é influenciado. Isto deveria ser considerado para a construção dos modelos que tratam da coordenação entre firmas, embora saiamos que não seja uma tarefa trivial.

Isto é, é sabido que o tratamento da competição em um mercado como um processo dinâmico no qual as empresas interagem em um ambiente complexo não é simples, embora seja o mais realista por permitir, inclusive, o tratamento adequado para a interação estratégica entre firmas. Então o problema neste caso, corroborando com o pensamento de Mário Possas (2009), é que, embora “o enfoque dinâmico em economia seja melhor, pelo maior realismo, implica em mais incerteza, pela adoção de suposições ad hoc, uma anátema para o campo jurídico e, por extensão, para os critérios de julgamento antitruste” (POSSAS, 2009:23). O trade-off entre simplicidade e realismo acompanhará a política antitruste enquanto ela existir.