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O exercício desenvolvido procurou fundamentar a importância da Geometria Sintética em geral e da Geometria Descritiva em particular na formação do indivíduo. É frequente os alunos colocarem questões acerca do seu propósito, da sua importância e aplicação. O reconhecimento do seu percurso permitiu evidenciar, de forma mais presente, a pertinência do seu estudo. Para além do seu valor e das suas aplicações no domínio da representação e comunicação visual, destaca-se a sua preponderância no desenvolvimento de capacidades mentais do indivíduo. A Geometria Descritiva traduz-se numa ferramenta de desenvolvimento da capacidade de abstracção, permitindo a produção de raciocínios acerca de realidades ausentes. Esta habilidade de pensar em contextos mentais tridimensionais abstractos está intimamente relacionada com a possibilidade de percepcionar e visualizar no espaço, exercício cerebral estimulado pelos procedimentos de representação da Geometria Descritiva. Esta área do saber é também um instrumento metódico de análise que permite a compreensão de um todo através da fragmentação da sua complexidade. O seu carácter descritivo reporta-se à tradução gráfica de entidades espaciais mas também permite a representação do pensamento e dos raciocínios e procedimentos envolvidos na resolução dos mais diversos problemas geométricos. Percepção, representação, abstracção e criação são etapas de um processo eminentemente mental onde a Geometria Descritiva exerce um papel fundamental.

As novas tecnologias informáticas permitiram um incremento significativo no rigor e facilidade de execução de representações bi e tridimensionais. Esta evolução reflectiu-se sobretudo na modelação de entidades orgânicas complexas, permitindo a criação de novas formas difíceis de traduzir através da Geometria Descritiva. Estas possibilidades, quase ilimitadas, de representação de todo o tipo de formas através de programas gráficos 3D parecem pôr em causa a validade da Geometria Descritiva enquanto ciência de representação. No entanto, o mesmo não se poderá dizer acerca do seu carácter intelectual e da sua pertinência no desenvolvimento de habilidades aptidões mentais específicas. O estudo da Geometria Descritiva fomenta a compreensão do espaço e dos objectos reais ou concebidos, através do reconhecimento dos conceitos de medida, escala, posição, incidência, rotação, assim como outros que definem o seu campo de estudo e permitem a organização mental do espaço.

Os suportes informatizados de representação do espaço podem contribuir de forma significativa para o ensino e compreensão da Geometria Descritiva. Este contributo é de particular importância se considerarmos as limitações inerentes à comunicação e demonstração de problemas geométricos espaciais manipulando apenas objectos concretos. A utilização das novas tecnologias permite superar algumas limitações associadas ao ensino apoiado por recursos tradicionais, permitindo reproduções espaciais de grande rigor perceptíveis a partir de múltiplas posições de observação. No entanto, com base numa pesquisa acerca de aplicações existentes, verificou-se que os sistemas de visualização tridimensional e de Geometria dinâmica ainda não respondem de forma específica e automatizada às necessidades do ensino da Geometria Descritiva. Nas escassas aplicações específicas para o ensino da disciplina verificaram-se algumas limitações referenciadas anteriormente, circunstância que justificou a utilização de uma aplicação ‘genérica’ para o desenvolvimento dos recursos didácticos. Embora não orientados para o ensino da disciplina, o uso destes ambientes é possível e as vantagens decorrentes da sua aplicação são evidentes, possibilitando uma metodologia envolvente para a compreensão das situações espaciais que se colocam, permitindo vislumbrar o encadeamento e fundamentação dos processos de resolução. A aplicação deste ambientes facilita ainda compreensão de métodos gerais de resolução e a sua transposição para a representação em épura, processo que é precisamente a operação que permite a resolução bidimensional de problemas espaciais.

O apelo das novas tecnologias é constante, no entanto, considera-se que estas devem servir de complemento e não substituir o desenho tradicional. Entende-se que a utilização das novas tecnologias de representação deve cingir-se à actuação do professor, centrando as atenções na demonstração espacial dos problemas geométricos de modo a facilitar a sua compreensão e servindo como estímulo para a sua visualização mental e consequente abstracção. Não se vislumbram, no processo de aquisição dos conhecimentos da Geometria Descritiva, vantagens na utilização dos meios de representação informatizados por parte dos alunos. O desenho tradicional, apoiado por instrumentos de desenho rigoroso, permite uma representação mais imediata do pensamento comparativamente com o desenho informatizado. O computador e

respectivos acessórios de interface com o utilizador representam elementos de mediação que podem restringir o registo atempado de uma ideia, comprometendo uma interacção rápida entre pensamento e representação. Esta reciprocidade ágil entre ambos os momentos será tanto mais efectiva quanto menores forem os elementos mediadores. O questionamento acerca das metodologias utilizadas no processo de ensino-aprendizagem deve orientar a actuação do professor, permitindo um reflexo positivo na aquisição consolidada dos conhecimentos da disciplina.

“Quanto à Geometria Descritiva, a crença de que é uma disciplina científica imutável em qualquer mudança histórica, é difícil de suster à vista dos dados que conhecemos. Parece que na Geometria Descritiva o único que se quis admitir, como na história da ciência em geral, é uma ideia de progresso que a consolida cada vez mais; como consequência de tudo isto é habitual narrar uma história épica da ciência, através de convicções marcadas com as sucessivas conquistas.”

(GELABERT, 1999: 48) A aprendizagem da Geometria Descritiva requer inevitavelmente uma motivação intrínseca do aluno, uma atitude persistente e alguma pré-disposição para o desenho e sua compreensão. Considera-se que a sua aprendizagem deve ser encarada como um jogo onde o processo de resolução é mais importante do que o resultado final isoladamente apreciado. Esta perspectiva de resolução de problemas deve orientar o processo permitindo ao aluno a construção de uma atitude autónoma e o desenvolvimento da capacidade de pensar, aquisição esta que é seguramente uma mais- valia de particular importância. O exercício mental comporta inevitavelmente um esforço por parte dos jovens, exercício que requer sem dúvida uma motivação intrínseca mas também uma motivação extrínseca que decorre em boa medida da actuação docente. Assim, o professor e as metodologias utilizadas desempenham um papel preponderante na aprendizagem e motivação para o estudo da Geometria Descritiva. A apresentação de exemplos concretos de aplicação da disciplina, relacionados com práticas profissionais, é uma forma de contextualizar de modo concreto a pertinência da disciplina. Reconhece-se assim o interesse no enfoco destes momentos de contextualização para evidenciar de forma clara a utilidade e aplicação da disciplina perante os alunos. Esta forma de abordagem e enquadramento do programa da disciplina será seguramente um aspecto a desenvolver em futuras investigações e práticas de ensino.

Os recentes desenvolvimentos no campo da realidade virtual e aumentada evidenciam novas possibilidades de representação e visualização espacial. A sua utilização no ensino permite a abertura de novas perspectivas pedagógicas. A interacção total com entidades espaciais virtuais e a possibilidade de experiências multi-sensoriais constitui sem dúvida o aspecto mais interessante. A YDreams, empresa nacional de referência no desenvolvimento de novas tecnologias, iniciou o desenvolvimento de aplicações baseadas na realidade aumentada para aplicação em serviços interactivos manipuláveis pelo utilizador, prevendo-se a sua efectiva concretização no espaço de uma década. Estes avanços tecnológicos podem levantar a dúvida acerca da necessidade e pertinência dos métodos tradicionais de representação. Para que servirão os métodos tradicionais de representação bidimensional de entidades tridimensionais quando for possível a criação tridimensional directa dessas mesmas entidades? Será sem dúvida uma questão importante, no entanto considera-se que a disciplina se encontra a montante destas novas tecnologias, uma vez que ela permite o desenvolvimento de capacidades mentais que extravasam o seu propósito mais evidente. A criação e compreensão de quaisquer entidades tridimensionais assenta no conhecimento prévio de relações espaciais, numa capacidade de visualização espacial, e num pensamento abstracto consolidado, competências mentais associadas ao indivíduo e implicadas no estudo da Geometria Descritiva.

O conhecimento acerca do funcionamento do cérebro e dos processos internos implicados no processo de aprendizagem e cognição humana constitui um campo de investigação essencial para perceber como se podem potenciar as capacidades mentais necessárias para a abstracção e visualização espacial. A neurociência, área multidisciplinar que estuda o sistema nervoso nas suas várias dimensões, será seguramente aquela que permitirá reconhecer o tipo de operações e processos intelectuais realizados pelo cérebro quando o indivíduo aborda problemáticas espaciais.

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