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Ingressei no programa de Mestrado do LAEL interessado em rever minhas práticas e abrir horizontes profissionais. Como discuti na Introdução deste trabalho, o incômodo com a rigidez curricular e a aparente não implicação dos alunos no contexto de trabalho que tinha à época foram os disparadores de meu ‘carecimento’ (DUARTE, 2006) de voltar a estudar.

Minha inexperiência no fazer de pesquisador, porém, causou percalços importantes. Entrei no programa absolutamente despreparado, tanto teórica como metodologicamente, e por conta disso demorei muito para entender como as teorias estudadas poderiam apoiar uma reflexão sobre a prática. Levei muito tempo também para definir precisamente o foco deste estudo; a discussão sobre o engajamento na atividade, conduzida no Capítulo 1, destaca a importância do conhecimento da causa, da razão de uma atividade, para que seus sujeitos se engajem nela. Com o objetivo da pesquisa definido mais cedo, eu poderia ter organizado a coleta de dados de forma mais orientada.

Os muitos anos em um único contexto profissional também constituíram-se em um complicador importante; meu relacionamento com a escola onde trabalhava pode ser caracterizado como um ‘afeto ativo’, uma ‘causa adequada’, no entendimento spinozano (1677/2003). Eu conhecia e era conhecido, respeitava e era respeitado. Minha visão crítica sobre a organização curricular não afetava o orgulho que tinha (e tenho!) do Saber-

fazer que construí lá ao longo dos anos. O conatus (SPINOZA, 1677/2003)

que trouxe para o projeto de formação relatado nesta pesquisa veio, portanto, primeiramente estruturado neste saber, o que com certeza afetou o desenho do objeto idealizado da atividade social REFOP. Como demonstrei na análise do excerto 2.1, e também através da ilustração 3.1, trouxe para a formação a mesma noção de roteiro a ser seguido que criticava no instituto de línguas, esperando dos alunos-professores as ‘respostas corretas’ e desejando ‘ensiná-los a fazer’. Acredito que, se eu tivesse iniciado as análises em meio ao processo, teria sido possível perceber o tom de discurso de autoridade

(BAKHTIN, 1934/35 – 1975/88) que estava impingindo ao processo de formação, e teria portanto conduzido-o de forma mais argumentativa.

As análises também demonstram, porém, que os questionamentos que propus eram informados pelas teorias que sustentam o trabalho educacional com base em Atividades Sociais. Procurei recorrentemente sustentar o Saber-fazer que cobrava dos professores com o Saber-para-fazer apresentado neste trabalho nos Capítulos 1 e 2, o que permitiu que os alunos-professores produzissem enunciados narrativos e performáticos, ou seja, novos significados compartilhados, a partir das discussões. Os momentos de crise também foram importantes disparadores de transformação, criando a necessidade de reflexão sobre a prática. A argumentação conduzida nas REFOPs, mesmo marcada por vezes por um discurso de autoridade (BAKHTIN, 1934/35 – 1975/88), cumpriu o papel definido por Meaney (2009) de ser o instrumento discursivo que permite o confrontamento e tensionamento dos sentidos dos sujeitos participantes de uma atividade, e a consequente recriação desses sentidos em significados

compartilhados.

Outro aspecto que teria contribuído bastante para dar mais foco ao trabalho de formação seria ter feito um levantamento prévio dos sentidos sobre teoria e prática docente que os alunos-professores traziam para o trabalho de formação. Este levantamento teria me permitido definir melhor o escopo de conhecimentos científicos, tanto de aporte teórico como de recursos de prática didática, a serem construídos a partir dos conhecimentos

cotidianos dos professores.

Mesmo considerando percalços e ajustes, acredito que esta pesquisa cumpre o objetivo de contribuir para a formação de professores para o ensino com base em Atividades Sociais, primeiramente por oferecer uma proposta de organização dos saberes necessários à efetiva participação tanto dos sujeitos professores na atividade social Ensino-Aprendizagem com base em Atividades Sociais como dos sujeitos alunos na Atividade Social que organiza o currículo. O conflito de paradigmas brevemente apontado nas análises, tanto a partir de algumas falas dos alunos-professores como da presença de um discurso mais autoritário por parte do formador, também oferece subsídio para que futuros professores e formadores reflitam sobre seus sentidos,

valores e crenças sobre educação e os confrontem com o quadro teórico- filosófico-prático do ensino com base em Atividades Sociais.

Este trabalho, como tantos outros, investigou um determinado recorte das questões que permeiam a construção curricular com base em Atividades Sociais. Algumas questões surgidas no processo não puderam ser respondidas, e mereceriam um estudo mais aprofundado. Listo-as aqui, deixando sugestões para investigações futuras:

• Apontei acima que houve uma breve investigação de conflitos de paradigmas. Para que esta investigação se aprofundasse, seria necessário um levantamento mais abrangente de teorias de ensino-aprendizagem, que permitisse criar categorias de análise a serem usadas conjuntamente com as categorias do ensino com base em Atividades Sociais;

• Indiquei acima também que não fiz uma investigação prévia dos

sentidos e conhecimentos cotidianos sobre educação e trabalho

didático que os alunos-professores possuíam no início do projeto. Para sustentar esta investigação, seria necessário fazer um levantamento dos conteúdos programáticos dos currículos de formação de professores nas universidades, tanto de forma mais generalizada como especificamente dos currículos cursados pelos alunos-professores. Assim, o trabalho de pesquisa poderia contribuir com sugestões de ajustes nestes currículos;

• Por questões de tempo e logística, não foram analisados trechos de aulas. Uma próxima etapa possível deste trabalho seria verificar os enunciados performáticos dos professores dentro de sala de aula, e verificar neles traços dos significados produzidos coletivamente nas reuniões de formação;

• Ainda sobre a análise de aulas, seria possível também investigar a criação de conatus (SPINOZA, 1677/2003) dentro de sala de aula, e o consequente engajamento dos alunos na Atividade Social proposta para organizar o currículo.

Encerro estas considerações finais reiterando o caráter ‘revolucionário’ (MARX e ENGELS, 1845-46/2006) da atividade social Conduzir uma

pesquisa de mestrado. O Saber-fazer que trouxe a este programa foi

profundamente transformado, através de minha interação com os colegas e professores nas aulas, seminários e congressos, tendo como artefatos mediadores os textos, as teorias, as discussões, as explicações. O resultado concreto que aqui se apresenta, tão diferente do objeto idealizado concebido no início do Mestrado, é na verdade instrumento-e-resultado (NEWMAN e HOLZMAN, 2001) dessas transformações.

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