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Eu quase nada sei, mas desconfio de muita coisa.

Guimarães Rosa

O caminho do conhecimento percorrido nesta pesquisa teve como norte o objetivo de conhecer o trabalho do (a) assistente social nas empresas do município de Cubatão/SP. Nesse percurso, em busca de respostas, nos deparamos com o surgimento de várias outras perguntas, que, certamente nesta pesquisa não foi possível respondê-las, em decorrência da própria delimitação do objeto de estudo deste TCC. Na busca que propomos, a investigação possibilitou o alcance de importantes resultados que decorreram dessa investigação.

O movimento para a construção de respostas é articulado aos movimentos de construção dos referenciais teóricos, e pesquisa de campo, ou seja, vincula pensamento e ação. Nesse sentido, em primeira análise, esse estudo proporcionou conhecimento teórico sobre o tema, e a capacidade de construção da crítica na leitura da realidade pesquisada em campo.

A conjuntura atual é fruto da nova dinâmica capitalista, que, para responder a crise que emerge na década de 70, articula um conjunto de alterações que impactam em mudanças macrossociais. Nessa conjuntura, opera-se a reestruturação produtiva do capital, neoliberalismo, reforma do Estado.

Tais mudanças alteram profundamente o “mundo do trabalho”. Verifica-se que o processo de precarização, flexibilização do trabalho e desregulamentação das leis trabalhistas alteram a forma de contratação, e condições de trabalho. Em outras palavras, nessa conjuntura, verifica-se a exigência por trabalhadores polivalentes, multifuncionais, a emergência do processo de terceirização, contratos temporários, part-time, subcontratação, e a própria exclusão dos trabalhadores do mercado de trabalho, ocasionando o desemprego em massa (exército industrial de reserva).

Nesse contexto, a classe trabalhadora, segundo Antunes (2011, p. 63) torna-se “heterogênea, fragmentada, e complexificada.” Tendo em vista que, as mudanças no “mundo do trabalho” operam tanto na esfera material, objetiva, quanto na dimensão subjetiva, ideológica da classe trabalhadora.

Os impactos das transformações sociais alteram o conjunto de profissões e, inclusive, o Serviço Social. O processo de precarização e flexibilização do trabalho também

está presente no trabalho do assistente social nos diferentes espaços sócio-ocupacionais, e mais nítido na esfera empresarial.

Em decorrência da nova dinâmica do capital, as empresas se reestruturam para responderem ao novo modelo produtivo, e integração ao mercado competitivo e globalizado. As mudanças nas empresas impactam no investimento tecnológico, redução do quadro de trabalhadores, processo de terceirização, dentre outras questões. No âmbito ideológico, as empresas utilizam mecanismos para o controle da classe trabalhadora a fim de minimizar o conflito de classe, e enfraquecer a organização e a identidade, para adesão dos trabalhadores aos objetivos do capital. Nesse sentido, verifica-se, por exemplo, o pagamento de salários indiretos, premiações e incentivos, programas de qualidade de vida, clima organizacional. Com a reforma do Estado, a empresa também passa a demonstrar interesse no investimento social, com a chamada “responsabilidade social das empresas”, criação de fundações empresariais, investimento em projetos, e estímulo ao voluntariado.

Desse modo, o trabalho do assistente social na empresa, também é modificado, incorporando “novas” demandas e mantendo as “tradicionais”, ou seja, o trabalho do assistente social na empresa compreende a combinação entre as demandas atuais, com os programas de qualidade de vida, responsabilidade social e outros, decorrentes das mudanças estruturais, e com a manutenção das demandas antigas, com perfil assistencial e educativo.

Tendo como base os referenciais teóricos e a análise da realidade pesquisada é possível concluir que o conjunto de mudanças estrategicamente desenvolvido pelo capital modifica substantivamente o trabalho do assistente social nas empresas, a partir das novas exigências, demandas, e condições de trabalho.

A partir das entrevistas constatamos que, a inserção de assistentes sociais nas empresas pesquisadas ocorreu em períodos diferentes, correspondentes aos anos 50 e 80, porém, ambas as empresas na década de 90 ao serem privatizadas, reduziram o quadro de trabalhadores, e em uma das empresas o Serviço Social foi extinto pelo período de 05 anos. O que confirma o impacto das mudanças macrossociais no mercado de trabalho profissional.

Na abordagem sobre o trabalho, buscamos apreender sobre a carga horária, nomenclatura, tipo de contrato, atividades, projetos e programas desenvolvidos pelo Serviço Social, as conclusões foram as seguintes: quanto à carga horária, apresentaram-se situações diferenciadas, não houve a redução para 30 horas semanais em um dos casos, quanto à nomenclatura, ambas entrevistadas são contratadas como assistentes sociais, com vínculo empregatício com a própria empresa, e, sobre o trabalho, as entrevistadas relataram as atividades que realizam, demandas, projetos e etc. O que nos permitiu a aproximação

com o cotidiano profissional, a verificação da precarização e intensificação do trabalho, alterações nas exigências e demandas.

Sobre as mudanças no trabalho do assistente social, identificamos a relação com as mudanças ditadas pelo capital, pela reestruturação das empresas e as mudanças no “mundo do trabalho”, reconfigurando a atuação profissional com “novas” demandas, mas também, com a manutenção das “antigas”.

Quanto aos desafios profissionais apresentados pelas assistentes sociais, identificamos a preocupação com a visibilidade do trabalho profissional junto aos gestores, a necessidade de “desmistificar” o papel do assistente social, e o objetivo de participar do processo de criação de programas e projetos e não apenas da fase de execução. Em síntese, os desafios apresentados demonstram a necessidade de legitimação, e afirmação da utilidade do trabalho profissional para a manutenção do campo de trabalho.

Em suma, o assistente social, requisitado para atuar na mediação dos interesses da classe trabalhadora e do capital, com as múltiplas expressões da questão social, atende os impactos da mudança “no mundo do trabalho” ao mesmo tempo em que é atingido por elas. Nas palavras de Guerra (2010, p. 717, grifo nosso) “vivenciam e enfrentam, ao mesmo tempo, as expressões da exploração e dominação do capital sobre o trabalho.”.

Frente a essa realidade, o desafio do assistente social na esfera empresarial é de criar estratégias para o enfrentamento da precarização do trabalho. Visto que, como analisado nas entrevistas, um dos efeitos da precarização e intensificação do trabalho têm repercutido no processo de adoecimento do trabalhador.

Desse modo, é necessário que os profissionais assumam a posição de trabalhador assalariado e identidade de classe, na construção de propostas de trabalho orientadas pelo projeto profissional hegemônico, que por sua vez, se vincula a um projeto societário que propõe a construção de uma nova ordem social.

No entanto, é importante destacar, para não cair no “messianismo”, que esse enfrentamento tem limites na sociedade capitalista, pois, a mudança social não é possível nem viável pela ação de uma única categoria profissional, mas, a revolução é possível sim, através do coletivo, da organização social, da identidade da classe trabalhadora, conforme o vocativo de Marx e Engels (2007, p. 91, grifo nosso) “Proletários de todos os países, uni-

vos!”.

Vocativo muito oportuno nesse momento de profunda crise do capital que envolve toda a sociedade, mas, principalmente, traz consequências desastrosas para a classe subalterna, oprimida, para a “classe-que-vive-do-trabalho”, visto que, é nos tempos atuais que se presencia a exponenciação da questão social.

Tendo em vista a dimensão contraditória da sociedade capitalista, e, por seguinte, do trabalho do assistente social, é possível identificar que o profissional sempre vai atender aos dois polos, burguesia e proletariado, podendo fortalecer um ou outro. Por mais que não tenha aparecido na pesquisa de campo (não de forma nítida), a consciência das profissionais sobre essa dimensão contraditória, consideramos esse entendimento fundamental, para a compreensão do conflito, dos limites e possibilidades do trabalho profissional.

Visto que, nas empresas, a contradição capital/trabalho é ainda mais nítida, porém, o assistente social não está fadado a servir exclusivamente ou prioritariamente aos interesses do capital, embora, atenda, por ser trabalhador assalariado. Contudo, é no caráter contraditório do trabalho do assistente social que se dá (ou pode se dar) possibilidades de enfrentamento e mudança. O profissional, ao apreender a realidade social de forma crítica, orientado pelo projeto ético-político pode criar propostas de trabalho com direção ao fortalecimento, emancipação, e defesa de direitos, a favor da classe trabalhadora, contribuindo para a criação de uma nova ordem social, fundamentalmente distinta da atual.

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