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Esta pesquisa investigou a evolução das habilidades relacionadas ao conteúdo de conhecimento matemático e estruturas de programação, na disciplina de lógica de programação, em um curso Técnico em Informática, ao longo do ano letivo de 2014; assim como identificou os possíveis preditores que possam influenciar esta evolução.

Verificamos que durante o curso é demandada grande capacidade de abstração por parte dos alunos, mas as estratégias, materiais, cronograma de conteúdos e metodologias têm como foco inicial conteúdos que não exigem grandes níveis de abstração (introdução a algoritmos e estruturas de decisão). Do conteúdo de laço em diante, entretanto, o conteúdo se torna muito mais abstrato, o que provoca uma lacuna em relação aos raciocínios previamente estabelecidos gradualmente na disciplina. Isso acaba por resultar em níveis baixos de aprendizagem no que se refere a conteúdos que necessitam de transposição de um conhecimento para outra área, como no caso de laço e principalmente matrizes unidimensionais e matrizes bidimensionais, que demandam aplicação de conhecimentos matemáticos para construção de algoritmos. É nesse ponto que identificamos maior falha no processo de ensino dessa disciplina, pois não identificamos estratégias para facilitar essa transposição, evidenciada em nosso trabalho como ponto chave de obstáculo para aprendizagem.

Os alunos conseguiram aprender melhor o conteúdo de estrutura de decisão que, além de ser ensinado no início do curso, o que proporciona um maior contato durante todo o ano letivo, é bem intuitivo, e no dia-a-dia dos alunos podem ser identificadas várias situações nas quais é necessário o uso desse conteúdo de forma prática. No entanto, a partir do momento em que os alunos começam a estudar o assunto laço, que começa a exigir maior nível de abstração, seguido de matrizes unidimensionais e matrizes bidimensionais, que exigem mais ainda, o desempenho diminui.

179 Como implicação educacional, esse resultado nos chama atenção em especial para as estratégias de ensino da disciplina, bem como para o tipo de condução do conteúdo. Os problemas algorítmicos exigem que os alunos tenham o raciocínio de transposição do problema ou que eles tenham conhecimento suficiente em vários conteúdos matemáticos em que eles têm dificuldade, como foi levantado por Gomes e Mendes (2006), em que relacionaram as dificuldades dos alunos ao background em conhecimentos matemáticos. Outra dificuldade encontrada é a capacidade de resolver os problemas. Dividi-los seria uma solução, mas o processo também é dificultado pela falta de clareza do problema matemático e suas possíveis subdivisões, além da dificuldade da interpretação e divisão do problema propriamente dito. Nossa pesquisa pode contribuir na perspectiva de se ter uma abordagem com o foco inicial na melhor compreensão do problema matemático e suas possibilidades de transposição, visto que nem sempre um problema matemático pode ser resolvido/transposto da mesma forma. A compreensão do problema matemático e sua decomposição é uma etapa prévia e sem ela os alunos não conseguem atingir o nível IV do nosso sistema categórico, a transposição do problema em forma de algoritmo.

Com relação aos preditores que podem influenciar a aprendizagem dos alunos, verificamos que o preditor mais significativo foi o “gosto pela matemática”. Alunos que se auto declararam gostar muito de matemática obtiveram melhores médias. Do ponto de vista educacional isso nos leva a levantar a hipótese de que alunos que gostam de matemática acabam tendo um investimento cognitivo maior na disciplina de lógica e, por consequência acabam tendo melhor desempenho. Para estes alunos, a disciplina acaba se tornando menos difícil pois os conhecimentos prévios em matemática servem como apoio e ajudam na resolução dos problemas, mas é preciso investir em pesquisas com desenhos que capturem este enfoque.

180 O preditor “escola anterior” também influenciou a aprendizagem em um primeiro momento, pois, alunos oriundos de escola particulares tiveram médias maiores nas primeiras ondas. Nas ondas seguintes não houve diferença significativa, o que aponta para o efeito da socialização no processo de ensino e aprendizagem, uma vez que uma hipótese explicativa é a de que a lacuna inicial decorrente de instrução prévia (diferença de escolas) é superada no decorrer do processo, indicando um avanço daqueles com menos conhecimento prévio. Contudo, esse também é um pressuposto que deve ser investigado com maior profundidade em pesquisa futura, pois demanda um desenho de pesquisa com outro enfoque.

O “sexo” se apresentou como um preditor nas primeiras ondas, uma vez que os meninos tiveram maiores médias nas ondas 01, 02 e 03. Assim como o preditor de escola anterior a diferença de médias entre os sexos foi superada no decorrer do processo. Temos como hipótese de que a história egressa do aluno tem importância na disciplina, a exemplo de participação e interesse em atividades e jogos que requerem raciocínio lógico, mas não investigamos este preditor na nossa pesquisa. Também seria necessário investigar com mais profundidade este pressuposto, que poderia ser elemento de pesquisa de investigações posteriores, passando a fazer parte do desenho metodológico para que a captura das informações referentes a este pressuposto pudesse ser realizada.

Esse estudo possui limitações no que se refere à avaliação de alguns fatores, à análise contextual e à generalização para qualquer que seja o curso de lógica de programação. Toda a pesquisa foi realizada baseada no material didático dos professores da escola onde ocorreu a pesquisa. Apesar de ser um material que segue um padrão para cursos em lógica de programação, eventualmente podem haver algumas diferenças de materiais em outras instituições. A pesquisa foi realizada em um curso médio-técnico

181 com alunos entre 13 e 17 anos, em uma cidade localizada na região metropolitana; logo, não podemos fazer qualquer generalização para todos os cursos técnicos e superiores de TI, tendo em vista os diferentes perfis, histórias egressas e localidades do país. Contudo, acreditamos que nossos resultados possam apontar elementos relevantes a serem considerados em contextos semelhantes ao da pesquisa e, a partir deles, provocar reflexões e mudanças de estratégias de ensino.

Através da nossa pesquisa avaliamos que um investimento em estratégias que promovam a abstração, raciocínio lógico/matemático, interpretação e divisão de problemas matemáticos, e, na própria disciplina de matemática, no currículo dos alunos seria grande coadjuvante para a melhora deste quadro. Estas melhorias seriam muito importantes não somente na disciplina de lógica de programação, mas no desenvolvimento do aluno durante todo o curso, visto que a disciplina é pré-requisito para várias outras disciplinas. As dificuldades ou o sucesso do aluno na disciplina de lógica se estendem para todo o curso, ocasionando as desistências e evasões. Um investimento nestas estratégias aumentaria consideravelmente o número de formandos em tecnologia, contribuindo ainda para a geração de mão de obra qualificada e desenvolvimento do país.

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