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CAPÍTULO II METODOLOGIA

CAPITULO 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa estudou a decisão de empreender do ex-executivo demitido de grandes corporações. Objetivamos identificar os fatores influenciadores dessa decisão, bem como os motivadores e critérios, cotejando-os com a literatura, sobre empreendedorismo.

As entrevistas revelaram, como fatores importantes, o conforto financeiro, o tempo máximo em uma empresa e a tecnicidade da função. Quanto mais o entrevistado foi influenciado pela tecnicidade da função e tempo na empresa, mais seu perfil se aproximou daquele descrito por Mills, o do funcionário capaz de construir seu espaço na organização; quanto mais o entrevistado foi influenciado pelo conforto financeiro e fatores de atração ao empreendedorismo, mais seu perfil se aproximou daquele descrito por Schumpeter, o empresário capaz de correr e risco e inovar.

Ainda que não convencional, optamos por apresentar uma síntese do empreendedorismo, na forma de figura. Ilustramos que uma maneira de organizar as definições de empreendedorismo é compreendê-las, dinamicamente, entre dois tipos “puros”, o funcionário moldado pela corporação e o herói mítico, schumpeteriano. Utilizamos a escala abaixo, para avaliar as decisões de empreender dos entrevistados.

Figura 20– Fatores preponderantes na escolha do tipo de negócio

Fonte:Elaborado pelo autor, com base nos dados da pesquisa.

Os entrevistados revelaram uma carga de rejeição significativa às corporações. A demissão e a dificuldade de recolocação em empresas do mesmo porte provocaram reações e

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atitudes que explicam, em parte, o fato que todos os entrevistados tiveram motivações que os “empurraram” ao empreendedorismo, caracterizadas nos fatores rejeição e insegurança, acerca das corporações e, principalmente, na fuga do desemprego. O componente “necessidade” esteve presente em todos os casos avaliados e veio antes da identificação de uma oportunidade de negócio; alguns, por necessidade de renda, mas, todos pela necessidade de ocupação, o “ter o quê fazer”.

Uma afirmação frequente foi que, logo após a demissão, montar o próprio negócio seria o “Plano B” e que, preferencialmente, optariam pela recolocação em cargos, e em empresas da mesma dimensão que antes. Mesmo para o entrevistado que está a mais tempo empreendendo e com conforto financeiro, a possibilidade de recolocação na forma de um convite “irrecusável”, ainda o seduz. Recuperando Mills (1979), verifica-se a conduta do executivo veterano apegado ao cargo e status conferidos pelas corporações.

Ainda assim, os fatores de atração e oportunidades estiveram presentes nos discursos, e a intuição à análise da existência de oportunidade também os moveu.

A ênfase na busca pelo sonho antigo de ter o próprio negócio e a busca pela independência e autonomia, está associada ao significado do trabalho. A superação de obstáculos também justificou a decisão de empreender, confirmando a literatura, segundo a qual, os empreendedores se sentem motivados para criar e realizar coisas, fazer as coisas acontecerem, têm orientação para a ação e transformar projetos em novos processos, produtos ou serviços. As contribuições de MCCLELLAND (1961) e LEITE (2000), são exemplos dessa linha teórica. No entanto, mágoas e desilusões com a vida na organização, também motivaram os entrevistados; vale reproduzir um trecho da fala do entrevistado Nº 4: “Às

vezes, o meu maior motivacional é raiva; se eu te disser isso você não vai acreditar, mas, é raiva.”

Discurso recorrente a respeito da carga de trabalho, agendas congestionadas, volume de viagens de negócios e reuniões intermináveis foram unânimes e carregadas de alívio por terem sido deixadas para trás. Os donos de negócios trabalham até mais, mas não se importam, porque estão trabalhando para si. O fato gerador da exaustão pode não ter sido a

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agenda ou carga de trabalho, mas, sim,o desgaste e o tédio de muitos anos atuando na mesma organização, atividade ou mercado. A oportunidade de aumentar rendimentos moveu os entrevistados, todavia, ao lado da preocupação em fazer o negócio “dar certo”. A redução de ganhos pode, inclusive, ser tolerada, pois já acumularam patrimônio considerável, os filhos cresceram e as responsabilidades financeiras são menores. Como síntese, vimos que, se de um lado a necessidade criou empresários, de outro, as decisões sobre o tipo de negócio variou conforme história, carreira e circunstâncias apresentadas na época da transição.

A relação entre inovação como elemento vital, sucesso e a perenidade do negócio, é demonstrada nos vários autores estudados; entretanto, não é regra no grupo analisado. A situação é compatível com os dados da realidade brasileira, na qual 83,2% dos empreendedores oferecem produtos ou serviços já conhecidos dos seus consumidores, de acordo com GEM (2010). A inovação surge na fala de dois entrevistados, mas não é vista como garantia de trajetória fácil; se por um lado os que estão atuando em mercados já desenvolvidos sofrem para encontrar seu espaço, o inovador tem dificuldade na divulgação do produto, sujeito ao ataque de concorrentes que copiam o de negócio.

A disposição ao risco empresarial é um ponto importante na literatura sobre empreendedorismo. No grupo entrevistado, a aposta do capital próprio, no negócio, não é atitude definidora. A pesquisa alinha-se à teoria, pessoas que passaram mais de duas décadas sem arriscar a propriedade e remuneradas por salários e bônus (Mills, 1975) e subordinadas à estrutura operacional da organização (PINCHOT, 1989) prosseguem inseguras quanto ao uso do próprio dinheiro no negócio.

Na análise que se propôs, a respeito do grau de mobilidade e conformidade do grupo importa, principalmente, o período total como executivo e o tempo de permanência na mesma corporação. A partir das entrevistas, é possível dizer que executivos com longos períodos na mesma organização, mesmo que em posições diferentes, desenvolvem habilidades de adequação e conformidade às regras, processos, condutas e à cultura organizacional. Juntas, as experiências organizacionais podem dificultar a atuação autônoma e independente. Na visão crítica de Mills (1979), “Seguem fielmente as instruções, sentem-se inseguros fora dos

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limites das ordens explicitas, fogem dos primeiros-planos e passam adiante as responsabilidades. Geralmente sentem haver uma desproporção entre suas capacidades e experiências, (...) (MILLS,1979).

A função exercida nas corporações trouxe consequências para a decisão quanto ao negócio próprio. A experiência com a gestão geral ou a área comercial facilitou comportamentos proativos, comparativamente aos entrevistados egressos de áreas técnicas. Conhecimento do mercado e habilidade com clientes fornecem elementos importantes para montar e dirigir um novo negócio. Os entrevistados com perfil construído em vendas e gerência geral, relataram mais facilidade com os processos.

O conforto financeiro influencia a escolha do tipo de negócio, aproximando ou distanciando da inovação e do risco. Ex-executivos com “pacotes” generosos de demissão, podem ser mais propensos ao empreendedor schumpeteriano. Quanto maior o conforto financeiro, maior o destaque dado pelos entrevistados para “perseguir um sonho” na decisão pelo negócio; quanto menor o primeiro, maior a propensão a negócios vistos como estáveis ou seguros (como a compra de franquia, por exemplo). As verbas indenizatórias garantem certo conforto, durante certo tempo, não obstante, é imperioso voltar a obter renda. Mesmo os perseguidores de seus sonhos mantiveram-se em ramos conhecidos.

A “saturação” com o setor em que se trabalhou a vida toda foi eloquente, e é, também, paradoxal, pois o conhecimento adquirido com a experiência profissional é importante para a escolha do tipo do novo negócio, contudo, ao mesmo tempo, é motivo de tédio e repulsa.

De acordo com a literatura, é possível afirmar que, caso o negócio próprio seja no mesmo setor em que o executivo esteve, na maioria do tempo de sua carreira, as chances de ele identificar uma oportunidade e de conhecer profi

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Todos os entrevistados da pesquisa foram demitidos em uma fase madura de vida profissional e manifestaram fatores que remetiam ao que se chama fatores “push” ou aqueles relacionados à necessidade, de renda ou de ocupação e atividade laboral.

A pesquisa de enfoque qualitativo não tem por finalidade estender os resultados para populações mais amplas. Mesmo assim, conhecer em profundidade as questões de impacto sobre a decisão de empreender, com análise de significados e sentimentos, fornece contribuição relevante ao estudo do tema.(SAMPIERI et al, 2006).

Os dados foram obtidos com vistas nos relatos das pessoas entrevistadas. Ao falar sobre suas trajetórias, as pessoas tendem a revelar somente os aspectos positivos para construir uma boa imagem. Nesses

decide o que vai narrar, ocorrendo a seletividade do conteúdo. Logo, os aspectos e acontecimentos negativos que revelam as fragilidades do entrevistado podem ter sido omitidos.

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APÊNDICE 1 - ROTEIRO PRÉ-TESTE DA ENTREVISTA

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