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8.1 Manejo sustentável das populações de samambaia-preta

“No mistério do Sem Fim, equilibra-se um planeta.

E no planeta, um jardim, e no jardim, um canteiro, No canteiro, uma violeta,

e sobre ela o dia inteiro,

entre o planeta e o Sem Fim, a asa de uma borboleta.”

Cecília Meireles

A samambaia Rumohra adiantiformis é um recurso florestal cuja extração apresenta condições de sustentabilidade no que se refere aos aspectos ecológicos da atividade, conforme já destacado por vários autores (Conte et al., 2000; Anama, 2002; Kageyama & Reis, 2002; Conte & Reis, em preparação) e reforçado pelos resultados do presente estudo. A espécie contempla grande parte dos critérios elencados por Cunningham (2001) para a escolha de espécies prioritárias para manejo sustentável (Tabela 1).

Entre estes critérios, destaca-se no âmbito deste trabalho, a utilização das partes vegetativas (frondes) e o ritmo de crescimento acelerado de reposição das frondes após a coleta. De acordo com o mesmo autor, o fato de a espécie apresentar propagação clonal e dispersão de esporos pelo vento, sem depender de polinizadores e dispersores a torna menos vulnerável e assim, com maior potencial para o manejo sustentável. Os

resultados encontrados corroboram esta visão, uma vez que a dispersão de esporos vem favorecendo o fluxo gênico e, portanto, permitindo a manutenção da diversidade genética, assim como evitando uma maior estruturação das populações de samambaia- preta.

Tabela 1: Alguns critérios para escolha de espécies para manejo sustentável

Oportunidade para manejo sustentável

Critérios Alta Média Baixa Indicadores e fontes de

informação Distribuição

geográfica

Extensa Limitada Restrita Registros de herbários e

de distribuição Especificidade

de habitat

Ampla Restrita Muito específica Registro na literatura,

informação dos coletores Tamanho da

população local

Grande Mediano Pequeno Registros de herbários e

de distribuição, inventários florestais Ritmos de

crescimento

Rápido Médio Lento Dados sobre

produtividade, ritmos de crescimento e produção de biomassa Grupo geral de recursos Folhas, flores, frutos Exudados (látex, resinas, óleos, gomas...) Toda a planta, cascas, raízes, meristema apical Estudos de casos de exploração e recuperação

(ou não) do recurso

Polinização Eólica ou outra

forma abiótica. Polinizadores bióticos comuns Mutualismos muito específicos Ecologia da polinização e estudos de mutualismo entre plantas

Dispersão Vento, água.

Muitas sementes viáveis ou propagação clonal Dispersores comuns Dispersão por grandes mamíferos Estudos ecológicos de dispersão, conhecimento local do comportamento alimentar de aves e outros

animais Peculiaridade filogenética Espécies pertencentes a gêneros grandes Espécies pertencentes a gêneros medianos Espécies pertencentes a gêneros monotípicos Revisões taxonômicas

Para avaliar alguns dos critérios elencados na tabela anterior são necessários conhecimentos acerca da autoecologia da espécie em questão. De acordo com Reis (1996a), a implementação do manejo sustentável para qualquer espécie em seu ecossistema exige o conhecimento relativo à sua demografia e biologia reprodutiva.

Além disso, grande parte dos aspectos que concernem ao manejo sustentável de populações de samambaia-preta no Litoral Norte do Rio Grande do Sul já foi enfocada por estudos anteriores. Anama (2002) realizou um estudo fitossociológico das áreas de coleta e avaliou o efeito de diferentes intensidades e freqüências de corte sobre uma população de samambaia. Foram também obtidos dados acerca dos aspectos etnobiológicos da atividade. Anama/PGDR (2003) estudaram as questões econômicas do extrativismo da espécie, especialmente em relação à cadeia produtiva das frondes.

Conforme discutido na introdução desta dissertação, deve ser levado em consideração que a samambaia-preta é uma espécie que já vem sendo manejada pelas comunidades locais. Neste caso, é fundamental o conhecimento e a avaliação dos sistemas de manejo utilizados por tais comunidades. A fim de completar as lacunas existentes nos saberes necessários à implementação do manejo sustentável da espécie. Neste trabalho foi procedida uma avaliação dos sistemas de manejo existentes, bem como se buscou um maior esclarecimento da biologia reprodutiva da espécie. A integração destas informações serviu de base para uma proposta inicial de monitoramento da atividade extrativista, apresentada a seguir.

8.2 Monitoramento do extrativismo da samambaia-preta

“Todas as teorias são legítimas e nenhuma tem importância. O que importa é o que se faz com elas”.

Jorge Luiz Borges

O monitoramento é um dos maiores desafios no uso e conservação de produtos florestais não-madeireiros e tem por objetivo verificar se determinado recurso está sendo explorado de maneira sustentável. Neste contexto, conforme destacam Jong & Utama (1998), o princípio da sustentabilidade sugere que as características de uma dada população não mudam em função da sua exploração. No âmbito deste trabalho, a sustentabilidade pode ser entendida como a capacidade de um sistema de manter a produção através do tempo na presença de repetidas restrições ecológicas e pressões socioeconômicas (Altieri, 1983).

Os indicadores de sustentabilidade constituem-se, sem dúvida, em fortes aliados às atividades de monitoramento de processos que regem a dinâmica de sistemas ambientais (Pessoa et al., 2003). O desafio consiste em identificar indicadores suficientemente representativos da sustentabilidade da relação estudada. Diz-se suficientemente representativos, pois desde já se reconhece que não se poderia pretender superar todas as implicações da subjetividade do que seja socialmente justo, economicamente atrativo ou ecologicamente equilibrado (D´Agostini & Schlindwein, 1998).

O estabelecimento de indicadores requer, a priori, a delimitação da área de abrangência e a definição clara dos propósitos a que se destina. A bacia hidrográfica tem sido considerada a unidade ideal para estudos de impactos ambientais por permitir um maior entendimento das atividades humanas e suas relações com o ambiente (Ferraz, 2003). Desta forma, os indicadores aqui propostos foram baseados no estudo do extrativismo praticado na bacia hidrográfica do Rio Maquiné e, portanto, sua aplicabilidade abrange uma escala regional.

O conjunto de indicadores escolhidos para uma determinada região pode não se adequar às necessidades de outras regiões. No entanto, conforme destacam Pessoa et al.(2003), é possível extrapolar experiências metodológicas adquiridas para outras

regiões, anexando fatores específicos desses novos locais à aplicação dos indicadores. Os indicadores de sustentabilidade de um agroecossistema devem refletir as alterações nos atributos de produtividade, resiliência, estabilidade e eqüidade (Ferraz, 2003). A produtividade se refere à produção primária por unidade de insumo utilizado em um período de tempo. Já a estabilidade reflete o grau no qual a produtividade se mantém constante frente a pequenas distorções causadas por flutuações climáticas ou outras variáveis ecológicas e econômicas. A elasticidade, também conhecida como resiliência, é a capacidade de recuperação do sistema frente a perturbações externas (capacidade de resposta ou robustez) e por fim, a eqüidade diz respeito à distribuição eqüitativa do recurso econômico e dos benefícios, dos custos e dos riscos gerados pelo

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