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A partir da recorrência de dêiticos em textos publicitários, foi possível fazer análises quantitativas e qualitativas a fim de revelar a existência de uma aproximação discursiva entre locutor e alocutário. Para tanto, o estudo fundamentou-se na Linguística Textual. Por ser uma corrente com diferentes propostas, a teoria dos atos de fala foi utilizada como base para as análises das peças publicitárias coletadas, levando em conta a intenção do locutor de persuadir seu público, por meio da linguagem verbal e não verbal, a comprar o produto anunciado.

O objetivo do produtor do slogan publicitário é que, por meio da peça publicitária, o alocutário, que até então não conhecia o produto, passe a conhecê-lo, compreendendo a mensagem e ficando convicto de que deve agir em favor da compra. E para tornar essa persuasão menos agressiva, o locutor pode não se marcar explicitamente no texto publicitário ou pode se fazer presente por meio de uma declaração positiva. Além disso, pode fazer uso de outros recursos, como ambiguidade e intertextualidade, para atrair a atenção do público por meio do afeto. E essa tentativa de aproximação se dá, sobretudo, por meio do uso de expressões dêiticas, analisadas qualitativa e quantitativamente em 144 peças publicitárias.

A dêixis permite uma referência volátil, que varia de acordo com as instâncias do discurso, e engloba muitos tipos de palavras, como advérbios, verbos e pronomes. Em nossa análise, calculamos a quantidade e a porcentagem de cada tipo de dêixis em todos os textos publicitários dos nossos

corpora, identificando um total de 355 casos de expressões indiciais. Além

disso, analisamos de forma detalhada como as diferentes expressões dêiticas, somadas a outras estratégias (como o uso de imagens, de intertextualidade etc.), favorecem a aproximação entre o locutor e o alocutário.

Identificamos que mais de 74% dos casos totais de dêixis se enquadram dentro da dêixis de pessoa ou da dêixis social, revelando a forte referenciação feita às pessoas do discurso, em especial à 1ª e a 2ª, apontando muitas vezes para o alocutário, como acontece em 87,43% dos casos totais de dêixis de pessoa. De igual forma, constatamos que a dêixis social aponta

majoritariamente para a 2ª pessoa do discurso, sendo utilizado frequentemente o pronome “você”, que, juntamente com outros recursos (como gírias e intertextualidade), sugere maior informalidade, o que certamente favorece a aproximação entre os interlocutores das peças publicitárias.

Além disso, verificamos que os dêiticos de lugar mais frequentes são os que se dirigem à 1ª pessoa. É possível, então, concluirmos, que, em muitos casos o produtor do slogan publicitário se coloca como o centro dêitico, representando um lugar que, de alguma forma, deve ser acessado pelo possível comprador. Por fim, demonstramos que todas as ocorrências de dêixis de tempo apontam para a 1ª pessoa, de tal forma que a novidade e a urgência da mensagem são destacadas para gerar a fetichização do produto e o interesse por parte do consumidor; sendo, portanto, mais uma estratégia de aproximação entre os interlocutores.

Com isso, comprovamos nas amostras analisadas que o uso de expressões indiciais é uma importante estratégia para incitar uma relação de intimidade entre os interlocutores, tanto por meio das dêixis de pessoa e social (simulando um diálogo com tom mais informal), como através da dêixis de lugar (simbolicamente encurtando a distância entre os interlocutores) e de tempo (destacando a questão da novidade e da urgência da mensagem, simulando o aqui e o agora). Todos esses tipos de dêixis, portanto, somados a outros recursos, são uma relevante estratégia para aproximar locutor e alocutário em peças publicitárias.

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