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Esta pesquisa teve como foco investigativo saber como ocorreu a transposição didática dos modelos atômicos na formação inicial dos professores de Química, na Universidade Federal de Sergipe, e na sua atuação em escolas do Ensino Médio de Aracaju- SE.

A partir desta questão, foi do nosso interesse saber: (1) como a formação inicial do professor de Química, na UFS, contribuiu para a transposição didática dos modelos atômicos, (2) como o professor de Química, egresso dessa instituição, ensinou os modelos atômicos no Ensino Médio e, (3) assinalar e co-relacionar os saberes aprendidos pelos alunos sobre modelos atômicos com os saberes que as professoras disseram ter ensinado.

A análise dessas questões configurou a forma de ensinar de cada professora investigada, considerando as expressões de concepção de ensino e de aprendizagem que orientaram as suas práticas em sala de aula.

Ao longo do estudo, buscamos expor uma discussão entre teóricos no que se refere à formação e atuação de professores, transposição didática e modelos atômicos, visando demonstrar as diferentes percepções acerca dessa temática, que tem sido estudada e discutida por vários pesquisadores.

No que se refere à formação de professores, protagonizada pela UFS, verificamos que esta ocorreu de forma insuficiente, com indicativos de certo distanciamento entre o que foi ensinado/aprendido e o saber científico, apesar dos professores da UFS terem utilizado em suas aulas, livros-texto, que mesmo tendo passado por ressignificação, encontram-se o mais próximo do saber de referência.

Os resultados demonstraram indicativos de que a transposição didática dos modelos atômicos, na UFS, ocorreu por meio do método tradicional, com predominância de aulas expositivas, com o uso de quadro, giz e livro, sem fazer uso de tecnologias de informação e comunicação, o que poderia proporcionar novas investigações científicas, permitindo a compreensão do mundo em que vivemos, enriquecendo o conhecimento.

Os resultados demonstraram que o saber modelos atômicos foi transposto didaticamente, na UFS, nas disciplinas: Química Geral, Química Inorgânica, Instrumentação Para o Ensino de Química e Prática de Ensino de Química.

Os dados ainda nos possibilitaram identificar, a partir do discurso de uma egressa, que na disciplina Prática de Ensino de Química, a formação foi voltada para atividades como o “jogo de cintura” e “válvula de escape” para uma boa atuação em sala de aula, no Ensino Médio. Além disso, a disciplina Química Inorgânica, considerada basilar para o curso de Química, contribuiu para uma formação inicial, no que se refere à transposição dos modelos atômicos, voltada para o treinamento de como aplicar o referido saber no Ensino Médio.

Nesta perspectiva, verificamos ainda que as docentes, das duas escolas pesquisadas, afirmaram ter avançado em suas práticas quando fizeram comparações à abordagem dada aos modelos atômicos quando estudaram pela primeira vez, no Ensino Médio, como também no curso de formação inicial na UFS. Entretanto, os dados apresentados pelos alunos, por meio das provas, apontaram para uma aprendizagem deficiente, em que há indicativos de que a aprendizagem do referido saber, por meio da transposição didática realizada por suas respectivas professoras, distanciou-se consideravelmente do saber de referência.

Identificamos que as professoras ensinaram as teorias, a evolução dos modelos e apenas uma disse “falar” do modelo atômico atual. Os dados apontaram para uma transposição didática dos modelos atômicos, nas duas escolas, por meio do método tradicional de ensino (recepção/transmissão), de forma deficiente, em que os saberes foram apresentados de forma fragmentada e seguindo uma simples cronologia de ideias, o que pode criar uma concepção de ciência equivocada. O aluno, desta forma, pode acreditar que a ciência desenvolve-se de forma neutra, objetiva e sem conflitos, graças à descoberta de cientistas e isolada do contexto social.

Nas duas escolas pesquisadas, as professoras de Química disseram utilizar, para o ensino dos modelos atômicos: apostilas, livro didático, desenhos, modelos de isopor, havendo maior predominância no uso dos dois primeiros.

Muitas vezes, o livro didático, que deveria ser usado como recurso auxiliar no processo de ensino e aprendizagem, é usado como única ferramenta de trabalho, e ainda é reduzido em apostilas, onde os conhecimentos propostos passam a ser mais fragmentados ainda, e, desta forma, a aprendizagem passa a ser vista como capacidade de resolver repetidamente os inúmeros exercícios propostos, para os mesmos itens de conteúdo, levando a deformações no processo de transformação do saber, podendo ocasionar distorções e distanciamento entre a nova formatação textual e o saber de referência.

Verificamos, por meio de pesquisas, que os livros didáticos de Química, inclusive os utilizados pelas professoras, nas duas escolas do Ensino Médio, além de apresentarem uma linguagem fragmentada, envolvem muitos conceitos que são inadequadamente conectados. Além disso, o conceito de modelo, fundamental no ensino de Química, praticamente não é abordado, sendo apresentados através de um desenvolvimento histórico inadequado, dando a impressão de que os mesmos são descobertos e não são criações científicas.

As professoras indicaram as mudanças curriculares por que passou o curso de Química Licenciatura da UFS, após a formação inicial que tiveram, como elementos necessários para a formação dos futuros professores, já que foram incluídas, disciplinas importantes que poderão contribuir na ampliação de debates dentro do contexto da ciência e da atual sociedade.

Desta forma, consideramos de grande importância estar (re) pensando constantemente sobre a formação que está sendo oferecida para o professor, em particular o de Química, e entendemos que a formação continuada é lócus propulsor para (re) criar formas reflexivas de ensinar e aprender, superando o modelo de transmissão e recepção, no qual a não problematização de saberes leva a uma formação baseada em treinamento, jogo de cintura e válvula de escape, termos presentes no discurso de duas professoras.

Entendemos que um currículo precisa ser bem trabalho para que tenhamos resultados significativos. Desta forma, as mudanças ocorridas na matriz curricular do curso de Licenciatura em Química da UFS, em 2009, mesmo contemplando disciplinas de formação de professor dentro do que preconizam a LDB, PCNEM e PCN+ (documentos reguladores do currículo, com origem na noosfera, portanto inseridos na TDE), desde o primeiro semestre de curso, precisam, na prática, ser mobilizadas, de forma que tenhamos mudanças nas concepções de ciências e do que é ensinar.

Os discursos das professoras e dos alunos divergiram quanto ao que é ensinado e aos recursos utilizados por elas para ensinar os modelos atômicos. Outro aspecto relevante foi que mesmo com a proposição de questões elementares sobre os modelos atômicos, identificamos entre os respondentes um número preocupante de erros, o que nos leva a acreditar que, dificilmente, os alunos investigados saibam a importância dos modelos atômicos. Contudo, duas docentes afirmaram não perceberem dificuldades na aprendizagem desse saber em seus alunos, vez que o entendimento, segundo uma delas, é muito facilitado.

No que se refere ao modelo atômico proposto por Rutherford, constatamos que houve 80% de erros em relação à questão abordada em ambas as escolas, dado preocupante, já que o saber ensinado não foi aprendido pela maioria,o que se agravou na identificação do modelo proposto por Dalton, com percentual de erros chegando a 90% da escola A, da P1 e da escola B, da P2.

Em relação ao modelo atômico proposto por Thomson, verificamos que 70% dos alunos da escola A, da P1 responderam com acerto, em relação ao modelo, seguido de 20% da P2, na mesma escola. Na escola B, evidenciou-se o quase completo distanciamento entre o saber ensinado e o saber aprendido, com apenas 10% de acertos dos alunos da P4. Quanto ao modelo proposto por Bohr, observamos que os índices de acertos dos alunos oscilaram entre 40% e 50% na escola A, e 10% e 30% na escola B, estes últimos considerados baixo demais

Desta forma, a transposição didática dos modelos atômicos, realizada pelas referidas professoras, apresentou-se abaixo das expectativas de aprendizagem dos alunos. Embora os dados da escola A tenham sido mais altos, o que era esperado, dada as condições da escola e de estudo dos alunos (tempo integral), não foram tão distantes da escola B.

Ao analisarmos a cadeia do saber, levando-se em consideração o saber ensinado na formação e na atuação do professor de Química, devemos (re) pensar nas situações de aprendizagem capazes de dar mobilidade às interações no interior do sistema didático, constituído por (professor, aluno e saber) e buscar compreender o que ocorre em seu exterior.

Esperamos que a realização desta investigação, que envolveu tanto a formação inicial de egressos da UFS quanto a sua atuação na Rede Pública do Ensino Médio de Aracaju-SE, tomando como foco a transposição didática dos modelos atômicos, e demonstrando a insuficiência dessa formação e atuação, possa subsidiar outros estudos e reflexões sobre o saber ensinado e o saber aprendido, com aproximações, cada vez maiores, com o saber sábio.

Assim, consideramos que o trabalho que envolve a formação permanente de professores de Química, contribui para o surgimento de propostas decisivas para que nossas salas de aulas deixem de ser ambientes de reprodução e transmissão de saberes e passem a ser um espaço de interações dialógicas, em que os saberes ensinados possam contribuir para a tomada de decisões conscientes e atuantes de cada cidadão.

Por fim, gostaríamos de destacar que este trabalho procurou trazer reflexões capazes de ampliar o debate sobre formação e atuação de professores, num cenário em que a

teoria da transposição didática, em emergência no campo das didáticas das ciências, articulasse as diferenças ou semelhanças na formação e na atuação de professores de Química, através de um dos pilares que sustentam esta ciência: os primeiros modelos explicativos de constituição da matéria.

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