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Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano Vive uma louca chamada Esperança E ela pensa que quando todas as sirenas Todas as buzinas Todos os reco-recos tocarem Atira-se E — ó delicioso vôo! Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada, Outra vez criança... E em torno dela indagará o povo: — Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes? E ela lhes dirá (É preciso dizer-lhes tudo de novo!) Ela lhes dirá bem devagarinho , para que não esqueçam: — O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA... Esperança (Mário Quintana)

Esse trabalho teve o intento de realizar uma aproximação teórica entre o garantismo jurídico de Luigi Ferrajoli e a teoria da argumentação jurídica de Robert Alexy, a fim de perceber de que forma os mecanismos teóricos daquele e práticos deste podem ser integrados para, conjugados, viabilizar a aplicação dos princípios constitucionais e a garantia dos direitos fundamentais.

Como visto, a teoria geral do garantismo jurídico faz a leitura de um modelo de Estado de Direito no qual, não apenas as formas de produção do Direito contemporâneo são programadas, mas também seus conteúdos substanciais, os quais são, mediante garantias, vinculados normativamente aos princípios previstos pelas constituições.

Como modelo normativo de Direito, o garantismo é o principal traço funcional do Estado de Direito constitucional, de Constituição rígida, a qual traz limites formais e substanciais ao exercício dos poderes. Como uma teoria crítica do Direito, o garantismo redefine o conceito de validade jurídica, conferindo-lhe substancialidade, ou seja, a lei será válida se puder ser submetida ao parâmetro de materialidade das normas superiores,

especialmente das normas constitucionais e, aceito isto, cabe ao juiz aplicar e ao jurista interpretar a norma conforme os critérios garantistas de validade, pois é assim que se faz possível a manipulação de um Direito legítimo, com a superação da limitação do intérprete à letra da lei. Nesta senda, Ferrajoli defende, também, a possibilidade de desobediência civil às leis materialmente inválidas. Por fim, como filosofia política, o garantismo permite a crítica e a deslegitimação externa das instituições jurídicas positivas, referindo-se a doutrinas políticas heteropoiéticas, uma vez que a teoria garantista tem como pressuposto geral ser pessimista em relação ao poder, considerando-o um mal, pois, por se tratar de uma atribuição carente de limitações, expõe qualquer um que o detenha a acabar por exercer o despotismo.

Desta forma, um Estado garantista ideal nada mais é do que um Estado de Direito constitucional substancialmente democrático, ou seja, dotado de garantias efetivas e baseado no princípio da maioria como fonte de legitimidade. Tal modelo de Estado tem como características a constitucionalização de direitos naturais, presentes nas diversas declarações de direitos e garantias, cujo exercício e posse por parte do cidadão devem ser assegurados a fim de se evitar o abuso de poder por parte dos governantes. Trata-se dos direitos fundamentais, que passam a constituir a base das democracias modernas.

Para Ferrajoli, são os direitos fundamentais que proporcionam a mensuração da concretização da Constituição, na medida em que são atendido ou não, e estabelecem quais matérias são afeitas ao poder legislativo e o que o poder judiciário deve garantir, mediante o controle de constitucionalidade material das normas.

Buscando uma teoria da argumentação que fortaleça os preceitos do garantismo jurídico e favoreça sua aplicação prática, estudou-se a teoria desenvolvida por Alexy, justamente por se tratar de uma teoria racional, com base na argumentação prática geral, também racional, uma vez que conta com regras e formas de discurso racionalmente formuladas e aplicadas a questões práticas ou jurídicas, tornando viável encontrar respostas

possíveis e que atendam a pretensão de correção em cada caso concreto.

Apresentando sua teoria do discurso prático racional, Alexy chega às regras de transição, as quais auxiliam quando aparecem problemas que não são solucionáveis com a argumentação prática, devido aos seus limites, sendo necessário que se recorra a outro tipo de discurso, é quando se dá a passagem do discurso prático para o discurso jurídico. O respeito às regras do discurso conduz a um resultado racional, principalmente quando se trata de um enunciado jurídico, que deve ser racionalmente fundamentado dentro do próprio ordenamento jurídico, o que lhe atribuí maior certeza e correção, já que está vinculado ao direito vigente.

O procedimento argumentativo de Alexy recorre a dois expedientes, a justificação interna e a justificação externa. À primeira forma de justificação cabe realizar a conecção entre a descrição do fato e a norma, expondo detalhadamente quais premissas terão que ser fundamentadas no processo de justificação externa, sendo que neste último ocorrem os juízos de racionalidade das decisões. Todavia, mesmo o discurso jurídico apresenta limitações, uma vez que tem como base a argumentação prática geral, e por isso mantém uma margem de incerteza irredutível, o que não impede que, em cada situação jurídica, empreenda-se procura por uma solução correta, lembrando-se que, para Alexy, não há sempre apenas uma única resposta correta, ou discursivamente possível, o que não desqualifica sua teoria.

Alexy entende, ainda, que uma teoria da argumentação jurídica somente tem valor prático inserida em uma teoria geral do Estado e do Direito, a qual tenha capacidade para reunir dois modelos de sistema jurídico. O primeiro, sistema de procedimentos, representa o lado ativo e é composto pelo discurso prático geral, pela criação estatal do Direito, pelo discurso jurídico e pelo processo judicial. O segundo, sistema de normas, é o lado passivo e deve mostrar que o Direito não é composto apenas por normas, mas também por princípios. Diante disso, o autor desenvolve sua teoria dos princípios, conforme a qual tanto as regras como os princípios são normas, e sua diferenciação é essencial para determinar a forma

diferenciada de aplicação dos princípios, os quais devem ser aplicados seguindo a forma da ponderação, já que são mandados de otimização, ou seja, sua aplicação precisa se dar na maior medida possível.

Enfim, observando-se as duas teorias que foram objeto desta dissertação, é possível visualizar algumas semelhanças fundamentais. A primeira delas é o caráter que ambas assumem de teorias do constitucionalismo, voltadas para o Estado em que parece decisiva a substancialização ou rematerialização das constituições, as quais refletem uma unidade material e já não têm por objeto somente a distribuição formal dos poderes, mas estão dotadas de conteúdo material condicionante da validade das leis.

Outra semelhança que merece ser destacada, diretamente ligada à anterior, é a valorização dos direitos fundamentais, que em Alexy se dá por meio da teoria dos princípios. Ferrajoli, por sua vez, desenvolve uma teoria ocupada com a tutela dos direitos fundamentais dos cidadãos através do cumprimento das garantias constitucionalmente previstas em benefício destes direitos, sendo que os mesmos formam o centro do Direito com um sistema de garantias. Além disso, os autores em questão acreditam no emprego da racionalidade no sistema jurídico e na valorização da figura do juiz como aplicador da norma. É a relação entre Direito e moral que causa algum distanciamento entre as duas teorias, uma vez que Alexy aceita a existência desta relação, já que os princípios sempre estarão representando alguma moral, já Alexy não pensa da mesma forma, mantendo-se fiel ao positivismo jurídico no que diz respeito à rígida separação entre Direito e moral.

Por fim, ao garantismo jurídico é cabível o procedimento de argumentação dogmática desenvolvido por Alexy. No que se refere aos enunciados dogmáticos, como é o caso dos princípios, Alexy desenvolveu um procedimento de aplicação fundamentada em uma comprovação sistemática, a qual atende aos ditames de validade substancial essenciais para a teoria do garantismo jurídico.

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