• Nenhum resultado encontrado

Neste estudo, parte-se do pressuposto de que os direitos sociais são direitos fundamentais. O direito à saúde está presente no rol de direitos socais previstos na Constituição Federal de 1988, como direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas públicas.

Desta forma, sendo o fornecimento de medicamentos uma prestação que está no âmbito do direito fundamental social à saúde, pairam sobre ele as mesmas questões suscitadas em relação à concretização dos demais direitos sociais: a possibilidade de Poder Judiciário condenar o poder público ao custeio de prestações que demandam a alocação de recursos públicos, que, como é sabido, não são abundantes e estão condicionados a prévia dotação orçamentária. A princípio, existindo um direito subjetivo individual à saúde, posto que a Constituição a define como direito fundamental, nada impede que ele seja pleiteado através da via judicial.

De fato, o desenvolvimento de políticas para a materialização de direitos sociais está condicionado à disponibilidade de recursos financeiros, estando a cargo do Poder Legislativo dispor sobre a destinação dos recursos públicos e ao Poder Executivo implementar esses recursos nas políticas públicas. Sendo assim, deve haver razoabilidade da prestação exigida ao Estado, tendo em vista que os recursos disponíveis devem ser empregados para atender a todos, e não apenas a quem pleiteia determinada prestação.

Entretanto, a reserva do financeiramente possível não possui caráter absoluto, e por si só não deve afastar a responsabilidade do Estado. Sua aplicabilidade deve observar o mínimo existencial e a razoabilidade da prestação requerida.

Nas demandas por medicamentos que integram a lista do SUS e deixaram de ser concedidos, não deve ser acolhido o argumento da reserva do possível, sob pena de violação ao princípio que veda retrocesso social. Também não é cabível levantar o princípio da separação dos poderes, posto que o Poder Judiciário, ao condenar o poder público a fornecer medicamento constante em política já existente, não está adentrando em suas competências funcionais, mas apenas garantindo uma prestação social já conquistada. Nesses casos, deve ser condenado a custear o medicamento pleiteado o ente federativo responsável pela lista em que ele é previsto.

Quantos aos medicamentos não constantes em lista, não é razoável que o Poder Judiciário proferia decisões compelindo o poder público a conceder medicamentos

48 experimentais ou associados a terapias alternativas, de eficácia não comprovada, sendo pertinente, nesses casos, a aplicação da reserva do possível.

Sendo o medicamento postulado não constante na lista do SUS, mas de eficácia comprovada e devidamente registro na ANVISA, deve ao Poder Judiciário identificar quais os fundamentos que levaram o poder público a negar tal prestação. A melhor solução é a ponderação de interesses, a depender do caso concreto e do medicamento pleiteado, devendo ficar a cargo do Estado a comprovação da insuficiência de recursos. Apenas o fato do medicamento não ser disponibilizado não significa que o Estado não possa ser condenado a concedê-lo, se o seu custo não inviabilizar o atendimento de outras políticas, tampouco que não possa ser discutido o motivo da sua não inclusão nas listas.

Em razão do art. 23, II da Constituição conferir à União, aos Estados e Municípios competência comum para elaborar e executar políticas públicas, nas demandas por medicamentos não constantes nas políticas existentes cabe a condenação solidária dos entes federativos.

O Supremo Tribunal Federal, tendo em vista as decisões proferidas entre janeiro de 2005 a setembro de 2013, tende a afastar a reserva do possível e atender as demandas por medicamentos, sendo pacífica a questão da legitimidade de intervenção do Poder Judiciário na concretização dessa prestação e a possibilidade de condenação solidária dos entes federativos. Em relação aos medicamentos experimentais, no período temporal mencionado existem decisões que acolheram a reserva do possível, mas, em momento posterior, ficou assentado que essas decisões não devem, por si só, servirem de precedentes, devendo haver uma análise caso a caso.

A realização de Audiência Pública sobre a saúde conferiu subsídios ao Supremo tribunal Federal para a solução dos impasses que surgem nas demandas por prestações relacionadas a esse direito. Através das discussões travadas, concluiu-se que é necessária a revisão periódica das políticas de saúde do SUS, bem como a elaboração de novas políticas.

Por fim, utilizando as informações colhidas na Audiência, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da STA 175 AgR, vislumbrou alguns parâmetros a serem usados para solucionar as demandas por medicamentos, que poderão servir para nortear entendimentos futuros sobre a concretização das demais prestações inseridas no âmbito do direito à saúde, o que parece ser a melhor solução para as controvérsias surgidas nessas demandas.

49

BIBLIOGRAFIA

BARCELLOS, Ana Paula de. O direito a prestações de saúde: complexidades, mínimo existencial e os valores da abordagem coletiva e abstrata. Revista da Defensoria Pública. Edição Especial Temática sobre Direito à Saúde, São Paulo, Vol.1, p. 143 – 160, jul./dez de

2008. Disponível em <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/20/documentos/outros/Revista%20n%C2

%BA%201%20Volume%201.pdf>. Acessado em 15/07/2013.

BARCELLOS, Ana Paula de. Neoconstitucionalismo, direitos fundamentais e controle das políticas públicas. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, Nº 15, janeiro/fevereiro/março de

2007. Disponível em: <http://www.direitopublico.com.br/pdf_seguro/artigo_controle_pol_ticas_p_blicas_.pdf>.

Acessado em 15/07/2013.

BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade da pessoa humana. 2ª. edição. Rio de Janeiro: Renovar, 2008.

BARROSO, Luís Roberto. Da falta de efetividade à judicialização excessiva: direito à saúde, fornecimento gratuito de medicamentos e parâmetros para a atuação judicial. Disponível em: <http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/publicacoes/saude/Saude_-

_judicializacao_-_Luis_Roberto_Barroso.pdf>. Acessado em 10/07/2013.

BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática.

Disponível em: <http://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1235066670174218181901.pdf>>.

Acessado em: 13/11/2013.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estudo sobre direitos fundamentais. 1ª edição brasileira. 2ª edição portuguesa. 3ª tiragem. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

FRANCO, Luis Felipe Galeazzi; ALVES, Alessandra Vanessa. Parecer nº 811/2012 – AGU/CONJUR-MS/LFGF-AVA. Advocacia-Geral da União, julho de 2012. Disponível em:

50 <http://portalsaude.saude.gov.br/portalsaude/arquivos/pdf/2012/Jul/09/Parecer811_Solidaried adePassivanasAcoesJudiciaisdeSaude.pdf>. Acessado em 28/10/2013.

FOHRMANN, Ana Paula Costa Barbosa; MOURA, Aline da Cruz de. Understandings of the Rule of Law in Various Legal Orders of the World. Rule of Law Working Paper Series, Berlim. Disponível em: http://wikis.fu- berlin.de/download/attachments/22347905/Fohrmann+Moura+Brazil.pdf?version=1&modific ationDate=1315906552000 . Acessado em 15/10/2013.

GOUVÊA, Marcos Maselli. O Direito ao Fornecimento Estatal de Medicamentos. Revista Forense, Rio de Janeiro, vol. 370, p. 103-134, 2003. Disponível em: <http://www.mprs.mp.br/dirhum/doutrina/id507.htm>. Acessado em 25/10/2013.

MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 7ª edição revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2012.

NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 5ª ed. São Paulo: Método, 2011.

PEREIRA. Delvechio de Souza. O Orçamento Público e o Processo de Judicialização do Direito à Saúde. Artigo apresentado ao Instituto Serzedello Corrêa – ISC/TCU, como requisito parcial à obtenção do grau de Especialista em Orçamento Público. 2010. Brasília. Disponível em: http://portal2.tcu.gov.br/portal/pls/portal/docs/2055752.PDF. Acessado em 23/10/2013.

PESSOA, Higor Rezende. Parecer nº 1.200/2011-AGU/CONJUR-MS/HRP. Advocacia-Geral

da União, setembro, 2011. Disponível em: <http://portalsaude.saude.gov.br/portalsaude/arquivos/PARECER%20Medicamentos_sem_re

gistro_na_anvisa.pdf>. Acessado em 23/10/2013.

SOUZA NETO, Cláudio Pereira de (Org.); SARMENTO, Daniel (Org.). Direitos sociais: fundamentos, judicialização e direitos sociais em espécie. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. SARLET, Ingo Wolfgang. Algumas considerações em torno do conteúdo, eficácia e efetividade do direito à saúde na Constituição de 1988. Revista Eletrônica sobre a reforma do

51 Estado (RERE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, nº 11,

setembro/outubro/novembro, 2007. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com.br/rere.asp>. Acessado em 25/07/2013.

___________; FIGUEIREDO, Mariana Filchtiner. Reserva do possível, mínimo existencial e direito à saúde: algumas aproximações. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n. 24,

jul. 2008. Disponível em: <http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao024/ingo_mariana.html>. Acessado

em 24/072013.

____________. O estado social de direito, a proibição de retrocesso e a garantia fundamental da propriedade. Revista Eletrônica de Reforma do Estado, salvador, n. 9, p. 1-23, 2007. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com.br/rere/edicao/09/>. Acessado em 24/07/2013.

____________. Os Direitos Sociais como Direitos Fundamentais: contributo para um balanço aos vinte anos da Constituição Federal de 1988. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=processoAudienciaPublicaSaude &pagina=Artigos>. Acessado em 24/07/2013.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 36ª edição revista e atualizada (até a EC n. 71, de 29/11/2012). São Paulo: Malheiros, 2013.

TAVARES, Lúcia Léa Guimãres. O fornecimento de medicamentos pelo Estado, Revista de Direito da Procuradoria Geral do Estado, Rio de Janeiro, volume 55, p. 101-111, 2012. Disponível em: <http://www.rj.gov.br/web/pge/exibeConteudo?article-id=779835>. Acessado em 13/10/2013.

TORRES, Ricardo Lobo. O Mínimo Existencial e os Direito Fundamentais. Revista de Direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, volume 42, 1990. Disponível em: <http://www.rj.gov.br/web/pge/exibeConteudo?article-id=865789>. Acessado em 29/10/2013.

52 TORRES, Ricardo Lobo. O direito ao mínimo existencial. Rio de Janeiro: Renovar, 2009.

WANG, Daniel Wei Liang. Escassez de Recursos, custos dos direitos e reserva do possível na jurisprudência do STF. Revista Direito GV. 8ª Edição. São Paulo, 2007. Disponível em: http://direitogv.fgv.br/publicacoes/revista/edicao/revista-direito-gv-8. Acessado em 22/11/2013.

Documentos relacionados