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O striptease masculino representa uma das formas de trabalho sexual, tendo, portanto, associado a si, por definição, uma componente sexual. Apesar disto, uma das principais conclusões desta investigação remete para a não valorização desta componente por parte das clientes mulheres. Concluiu-se que a ida ao striptease masculino representa para as participantes uma oportunidade de socializar com as amigas e de apreciar um espetáculo que percecionam como distinto e divertido, sendo a componente homossocial associada a esta experiência um aspeto bastante realçado. Em consonância com esta conclusão, verificámos que os principais motivos associados à ida a um clube de striptease masculino se relacionam com eventos de socialização entre amigas, como, por exemplo, despedidas de solteira ou festas de anos.

Com esta investigação constatámos também que nos contextos de striptease masculino se assiste a alguma transgressão dos papéis de género dominantes, uma vez que, nestes espaços, a mulher assume um papel mais ativo, que normalmente não é atribuído ao seu género. De salientar que consideramos que esta transgressão não se aplique a outros contextos de vida das mulheres, estando limitada apenas ao contexto do clube de striptease. Apesar disto, não deixamos de perspetivar esta transgressão como positiva e relevante na medida em que pensamos poder representar um ponto de partida para a transgressão generalizada dos papéis de género vigentes na sociedade atual.

Além disso, verificámos a existência de uma tendência geral para as participantes se distanciarem da conotação sexual da experiência do striptease masculino, que foi notória em diversos aspetos. Mais concretamente, as participantes não atribuíram um significado sexual ao striptease masculino, não indicaram o elemento sexual como uma das motivações para a ida ao clube, não consideraram o striptease masculino um tipo de trabalho sexual (ainda que o tenham classificado como uma profissão), não se identificaram como clientes de sexo comercial e rejeitaram a perspetiva de serem clientes de sexo pago. Consideramos que todos estes dados contribuíram para que tivéssemos obtido algum insight acerca das conceções das participantes no que diz respeito à sexualidade feminina, uma vez que parecem ter subjacente uma interiorização dos papéis de género dominantes. Segundo estes papéis, a mulher é perspetivada como a “presa”, a figura passiva que espera pela iniciativa do homem e a compra de sexo por parte da mulher é alvo de estigmatização por ser vista como um comportamento não adequado ao seu género. Assim, consideramos ser possível que ao terem esta perceção, as participantes,

46 com o intuito de fugir ao estigma, procurem desassociar a componente sexual e o striptease masculino.

Embora reconheçamos que devido ao carácter qualitativo do presente estudo não seja possível realizar extrapolações e generalizar as conclusões obtidas, consideramos que esta investigação teve algumas implicações práticas.

Em primeiro lugar, defendemos que o que constatámos acerca da conceção das participantes sobre o papel da mulher é um indicador da importância da desconstrução dos papéis de género, ou seja, da necessidade de mudanças societais, que poderão conduzir a conceções mais igualitárias a nível dos papéis de género.

Além disso, consideramos também que o presente estudo parece ter uma boa base exploratória que permite dar continuidade ao estudo de questões relacionadas com o comportamento e a sexualidade feminina, nomeadamente com a mulher como cliente de comércio sexual. Neste seguimento, salientamos dois dos temas que surgiram como pertinentes para investigar: explorar as contradições nos discursos sobre os aspetos ligados com a conotação sexual versus não sexual e perceber as diferenças ao nível das motivações e significados entre as clientes habituais e não habituais de striptease masculino.

A nosso ver, as principais limitações da presente investigação assentam na falta de condições em que foram efetuadas algumas entrevistas, bem como na falta de tempo para aprofundar algumas questões. Perspetivamos também o facto de termos observado apenas dois contextos de striptease masculino como uma limitação, reconhecendo que o acesso a outros contextos teria permitido uma visão mais abrangente deste fenómeno. Esta última limitação está relacionada com obstáculos geográficos e dificuldades a nível da escassa existência e divulgação de espaços dedicados a striptease masculino direcionado a clientes mulheres.

Concluindo, pensamos que com esta investigação conseguimos dar alguma luz ao papel das mulheres enquanto clientes de sexo comercial, o que poderá contribuir para que em Portugal se comece a encarar a presença feminina em contextos sexuais comercializados, enquanto cliente, como algo de “natural”, caminhando assim no sentido de reconhecer e compreender a mulher como uma atora social com agência e um papel ativo na sua sexualidade e nas diferentes formas como a experiencia.

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Guião de Entrevista Semiestruturada

1. Caracterização sociodemográfica

 Sexo, idade, orientação sexual, estado civil

2. Representação sobre a atividade do striptease, o contexto e os atores  Ambiente/atividades do clube de strip

 Quem frequenta?

 Considera striptease profissão?

 Ida a um clube de striptease é algo “desviante”/moralmente reprovável?

3. Caracterização comportamental, significados atribuídos e aspetos relacionais,

no que se refere aos strippers e às outras clientes

 Motivações da ida ao clube de striptease  Quantas vezes foi e com que frequência?  Apreciação da performance

 Stripper representa o ideal de beleza?

 Interações no clube: entre as clientes e entre os strippers e as clientes

 Significados da experiência / como perceciona o contexto de striptease masculino  Considera-se cliente de sexo comercial?

 Considera a ida ao clube de striptease masculino uma traição? (se comprometida: companheiro sabe que vai?)

 Só assistiu a striptease masculino ou também feminino / misto?  Interessar-se-ia romanticamente por um stripper?

 Já propôs/consideraria a hipótese de propor a algum stripper ter relações sexuais com ele (oferecendo dinheiro ou não)?

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54 Tabela 1: Representação sobre o striptease e os seus atores

Temas Categorias Subcategorias Exemplos de discurso

Representação sobre o striptease e os

seus atores

Strippers

Apreciação estética “Primeiro que tudo, ele vinha demasiado brilhante e tinha um perfume horrível, pronto, quando ele entrava eu já ficava enjoada mesmo e tinha o corpo todo

brilhante, se calhar já faz parte, demasiado musculado” – S., 32 anos

Atos/comportamentos “O homem achei muito mais respeitoso, tenho ideia de ter sido mais contraído, mais respeitoso… Ele não ele nunca tirou os boxers.” – I., 21 anos

Performance

“O que ele fez no varão nem sabia que era possível. É preciso tanta força, vê-se os músculos todos do corpo, que se vê que ele está a utilizar todos para se segurar daquela maneira. E acaba por ser mesmo muito sensual, no meu ponto de vista. Obviamente também gosto das laps e da interação com o público.” – H., 22 anos

As clientes “Nessa tal despedida de solteiro que eu assisti as mulheres estavam tolas!” – M., 31

anos.

Striptease

Moralidade

“É assim, eu não acho, eu não gosto de considerar isso [a ida ao striptease] desviante, até porque o que é que é normal e o que não é, essa é a questão da desviância e da normatividade. Mas acho que implica muitas questões morais, mas aí já estamos a falar de uma questão cultural ou sociológica, de valores e isso.” – I., 21 anos

Trabalho “Se calhar não [pode ser considerado trabalho sexual] porque, eu tinha a ideia que aquilo era um espetáculo, uma arte, e continuo a ter essa ideia que aquilo é, pronto,

é uma arte.” – S., 32 anos

Striptease Feminino “Se voltasse a assistir [a striptease] preferia ver um strip feminino, acho que é mais interessante, mais sensual, mais bonito”. – A., 30 anos

Contexto

Espaço

Descrição “Primeiro de tudo fiquei impressionada pela negativa, porque o primeiro impacto que tive foi que as instalações não eram o que eu idealizava.” S., 32 anos Tipo de Espaço “Aquele dia foi para aquele propósito [striptease masculino], a discoteca reservada para a despedida de solteiro, as outras duas era um bar, jantou-se lá depois arrumou-

se tudo e fazia de discoteca e era só para mulheres, das três vezes.” H., 22 anos.

Ambiente No âmbito da questão das relações entre o staff do restaurante, N. (23 anos) refere que o ambiente é sensual.

55 Tabela 2: Expetativas e motivações da ida ao striptease masculino

Temas Categorias Subcategorias Exemplos de discurso

Expetativas e Motivações da ida ao striptease

masculino

Motivações - “[quis ir assistir a striptease masculino] Para ficar momento de uma coisa que nunca tínhamos feito e

para relembrar mais tarde”. – D., 25 anos

Motivos - “ Fui numa despedida de solteiro, de uma amiga.” – I., 21 anos Expetativas

em relação às clientes

- B., 24 anos, referiu que contava encontrar [no clube de striptease masculino onde esteve] pessoas histéricas, em despedidas de solteira, e quarentonas, referindo também que não estava à espera que

estivessem lá a festejar aniversários.

Expetativas em relação aos

strippers

- “A ideia que tenho de um stripper, é o gajo que apareceu aqui à frente.” N., 23 anos

Envolvimento

afetivo-sexual -

Relativamente à hipótese de manter um relacionamento amoroso com um stripper, J. (30 anos) afirma “não sei bem, se calhar fazia-me confusão, este tipo de intimidade… Apesar de ser profissional, tem intimidade com outra mulher sem ser eu.”

56 Tabela 3: Vivências associadas à experiência da ida ao striptease masculino

Temas Categorias Subcategorias Exemplos de discurso

Vivências associadas à experiência da ida ao striptease masculino Significados atribuídos à experiência enquanto cliente -

“O mais importante [na experiência em que assistiu a striptease masculino] foi o convívio, sem dúvida, com as minhas amigas e familiares, foi o mais importante, foi o que eu valorizei mais, não foi o striptease em si nem o local nem nada (…) foi bonito o convívio, tornou- se agradável sem dúvida.” – E., 32 anos

Interações

Com outras clientes J. (30 anos) referiu que o facto de não ter havido um contacto muito próximo com o stripper, deixou espaço, para o grupo fazer piadas entre

si.

Com strippers

Durante a performance

“[o stripper] besuntou-se de óleo, veio para o meu colo e esfregava-se (…) fê-lo sempre com respeito.” – L., 48 anos

Fora da performance A. (30 anos) mencionou que após o show, o stripper, a convite das suas

colegas, ficou a “beber um copo” com elas e a conversar um pouco.

Entre outras clientes e strippers

“Na despedida de solteiro, ele [stripper] vem, pega na noiva levantou-a e colocou-a nos ombros, mesmo com a barriga encostada à cara dele, eu olhei para ela e via-se mesmo que ela estava a gostar, ele encostou-a ao poste e ao mesmo tempo ela só se ria de vergonha” – H., 22 anos

Striptease e

fidelidade -

“[se fosse comprometida] ia na mesma isso não tem nada a ver; tem que haver uma abertura na relação.” – I, 21 anos

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